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"No râguebi não dá para protestar com o árbitro. Levamos amarelo, vamos para a rua 10 minutos, e perdemos metros”

É um dos capitães da seleção portuguesa de râguebi e atualmente está no Benfica depois de mais de uma década passada em equipas francesas numa realidade altamente mediática e exigente. José Lima jogou no último Mundial, em 2023, e estava com a braçadeira no dia em que Portugal venceu as Fidji na página mais importante do râguebi nacional.

Luís Aguilar

Começou a jogar ainda em criança e não tem problemas em admitir que o râguebi ajudou-o muito: “Era um miúdo um bocado irreverente, um bocado parvo até, com muita agressividade, e o râguebi ajudou-me a perceber o que o que é o respeito pela autoridade, pelas pessoas que decidem, até mesmo na relação com os meus pais foi importante.”

José Lima lembra que foi castigado várias vezes por protestar com os árbitros e que a determinada altura foi colocado do outro lado: “Um treinador meu, fez-me ser árbitro em jogos de miúdos para eu perceber a dificuldade. Tinha os pais a reclamar comigo, por causa das decisões, e percebi que, realmente, aquele papel não era fácil. Depois disso prometi a mim mesmo que iria mudar o meu comportamento, interessei-me mais pelas regras, para fazer menos faltas e tornei-me num jogador melhor. Toda essa parte ajudou-me a canalizar a minha energia de forma mais positiva.”

“Ao contrário do futebol, no râguebi não dá para protestar com o árbitro. Levamos logo amarelo, vamos para a rua 10 minutos, e perdemos metros”

O respeito pela arbitragem e pelas decisões do árbitro é uma das marcas do râguebi. Os jogadores acatam as decisões sem grandes protestos.

Ao contrário do futebol, “no râguebi é o árbitro que chama o VAR e não o contrário”, explica José Lima.

“A ideia no râguebi é que o VAR não interfira a menos que o árbitro fique com a dúvida. O que acontece muitas vezes é o lance passar no ecrã gigante, os adeptos começarem a protestar, o árbitro ver e aí pedir então o parecer do VAR”.

José Lima lembra ainda que as punições do râguebi para protestos têm sanções pesadas para a equipa o que serve de dissuasão para as reclamações dos jogadores.

“No râguebi vamos protestar com o árbitro e ele nem espera, é logo cartão amarelo, vamos para a rua 10 minutos e prejudicamos logo a nossa equipa durante esse tempo. Se continuarmos a falar podemos perder 10 ou 20 metros e isso no râguebi é uma distância muito importante. Pode ser a diferença entre estar no meio-campo do adversário e acabar no nosso.”

José Lima diz que nessas situações, além da punição do árbitro, há o aviso dos próprios colegas de equipa: “Já fizeste a falta, ainda estás a protestar e levamos mais 10 metros? Isso também ajuda, podia ser aplicado no futebol e perdia-se menos tempo com toda aquela conversa entre jogadores e o árbitro.”

“Um jogador que me deixou inanimado sem querer, foi ver-me ao hospital. Isto mostra muito o que é o râguebi. Não sei se aconteceria noutros desportos”

José Lima garante que o râguebi não é um desporto violento. “É duro, sim, há muito contacto, muita velocidade, mas muitas regras que nos protegem. Um jogador que promova um choque na cabeça do outro é logo expulso. E, além disso, há um grande respeito e lealdade entre os jogadores. É muito raro um jogador magoar outro de forma intencional”.

O capitão da seleção lembra uma situação em que caiu inanimado num jogo frente a África do Sul e o comportamento exemplar do jogador que o lesionou: “Veio com muita velocidade e chocou com a minha cabeça, mas sem querer. Foi logo expulso, apanhou oito jogos, porque já tinha outras situações de pouco cuidado, mas foi ver-me ao hospital, pediu-me desculpa e isto mostra muito o que é o râguebi. Não sei se aconteceria com essa naturalidade no futebol ou noutros desportos.”

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