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Da tentação monástica ao cargo de primeiro-ministro: o percurso invulgar de Sébastien Lecornu

Sébastien Lecornu, de 39 anos, foi nomeado esta terça-feira primeiro-ministro de França pelo Presidente Emmanuel Macron, sucedendo a François Bayrou. Com um percurso invulgar, Lecornu passou da tentação pela vida monástica ao apoio incondicional a Macron. Ocupou vários cargos ministeriais, incluindo o de ministro da Defesa nos últimos quatro governos. A sua nomeação deve-se à proximidade com Macron e à sua habilidade política, sendo conhecido por ser discreto e prudente.

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SIC Notícias

O ministro da Defesa francês cessante, Sébastien Lecornu, manteve um perfil discreto até ser nomeado esta terça-feira primeiro-ministro, num percurso invulgar que o levou da tentação pela vida monástica ao apoio incondicional ao Presidente Emmanuel Macron.

Macron nomeou esta terça-feira Lecornu como primeiro-ministro, sucedendo a François Bayrou, que se demitiu após a queda do Governo no parlamento, anunciou a presidência francesa, que assim afasta a realização de novas eleições, como pretendiam os dois extremos do parlamento - União Nacional (extrema-direita) e França Insubmissa (esquerda radical).

Em comunicado, o Palácio do Eliseu indicou que o chefe de Estado encarregou Lecornu de "consultar as forças políticas representadas no Parlamento com vista à adoção de um orçamento para a nação e à construção dos acordos essenciais para as decisões a tomar nos próximos meses". 

De 39 anos, e portanto com quase metade da idade do seu veterano antecessor, Lecornu assume-se como um defensor da estabilidade, num contexto de sucessivas mudanças de governo, e é conhecido por ser discreto, prudente, mas também hábil nos bastidores políticos.

Foi ministro da Defesa nos últimos quatro governos

Ocupou a pasta da Defesa nos últimos quatro governos: de Elisabeth Borne (2022-2024), de Gabriel Attal (2024), de Michel Barnier (2024) e de François Bayrou (2024-2025).

Um dos fatores-chave para a promoção de Lecornu foi a sua proximidade com Macron, que já em dezembro passado pretendia nomeá-lo para Matignon (sede do primeiro-ministro), em detrimento de Bayrou, que se demitiu depois de perder de forma contundente a votação da moção de confiança que ele próprio apresentou para endossar o seu plano de cortes orçamentais em 2026.

Lecornu tem conquistado a confiança de Macron como ministro da Defesa, e antes como ministro dos Negócios Estrangeiros (2020-2022), ministro responsável pelas Autoridades Territoriais (2018-2020) e secretário de Estado para a Transição Ecológica e Solidária (2017-2018).

Mas o atual primeiro-ministro não fazia parte do círculo dos "primeiros macronistas", tendo-se juntado aos centristas em 2017, quando decidiu abandonar o partido conservador Republicanos (LR) devido ao caso de corrupção que envolveu François Fillon, então candidato à presidência.

Um dos episódios marcantes na relação entre Macron e Lecornu remonta à crise dos "coletes amarelos", a revolta popular que, entre 2018 e 2019, evidenciou as desigualdades sociais e económicas entre as grandes cidades francesas e as zonas rurais.

Segundo o Le Monde, nas reuniões públicas que Macron organizou em várias pequenas cidades do país para abordar a crise, Lecornu sugeriu-lhe que incluísse presidentes de câmara e disponibilizasse ao público um livro onde os cidadãos pudessem expressar simbolicamente o seu descontentamento.

O novo primeiro-ministro, que antes de completar 30 anos já tinha desempenhado as funções de presidente da Câmara de Vernon (cidade do norte de França com 25 mil habitantes), ascendeu a partir de então na hierarquia ministerial, onde se manteve política e pessoalmente muito próximo de Gérald Darmanin, ministro da Justiça interino, que descreve como "um irmão".

No último cargo de Lecornu, o de ministro da Defesa durante a guerra na Ucrânia, conseguiu apoio de Macron para a ambiciosa lei que concederá às Forças Armadas um aumento de 6% no orçamento de 2024 a 2030, atribuída à sua determinação e capacidade de negociação. 

Esteve muito perto de se tornar monge

Filho único de uma mãe secretária num consultório médico e de um pai técnico numa fábrica aeronáutica e aeroespacial, Lecornu nasceu a 11 de junho de 1986, em Eaubonne, uma pequena cidade nos arredores de Paris.

Educado numa escola católica, Lecornu esteve muito perto de se tornar monge na Abadia Beneditina de Saint Wandrille, como confessou numa entrevista à televisão pública francesa.

"A certa altura da minha vida, ainda adolescente, durante um período de discernimento, um período muito íntimo, (...) pensei em tornar-me monge", disse, num dos raros excertos em que se permitiu falar sobre a sua vida privada.

Influenciado por um dos seus avôs, antigo combatente da resistência aos nazis e seguidor do general Charles de Gaulle, Lecornu aderiu ao partido conservador UPM (antecessor do LR) e, aos 19 anos, tornou-se colaborador parlamentar do deputado Franck Gilard, um recorde de precocidade na época.

Aos 22 anos, ingressou no gabinete de François Fillon. 

Ao mesmo tempo, enquanto evoluía na UMP, formou-se em Direito e tornou-se oficial da reserva operacional da polícia militar ('Gendarmerie'), com o posto de tenente. A par da vida monástica, a vida militar foi outra das suas grandes paixões.

Com Lusa

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