Geração 70

Fernando Medina: “É tempo de regressar aos passeios de bicicleta. Engordei nos últimos tempos”

A mãe vivia no Porto, era funcionária do PCP. O pai vivia no Alentejo, na clandestinidade. Soube do nascimento do filho através de um anúncio no jornal. Fernando Medina viveu sempre no meio da política. Sobre os últimos anos, diz que “foram muitas horas fechado no gabinete". Agora, “a vida anda para a frente”.

Nuno Fox

Bernardo Ferrão

Mariana Óca Ferreira

Nasceu em março de 1973, no Porto. Foi um bebé clandestino. O pai soube do seu nascimento através de um anúncio no jornal “O Século” que dizia: “Perdeu-se um álbum de fotografias no comboio Lisboa-Porto”. Foi uma coisa combinada entre os pais e o sentido da viagem determinava se tinha nascido um menino ou uma menina.

A mãe, Helena, vivia no Porto, era funcionária do PCP. O pai, Edgar, vivia no Alentejo, na clandestinidade. Sempre que regressa ao Alentejo é conhecido como o “filho do António”, o nome falso que o pai usava naqueles tempos.

Cresceu numa família “abastada” e com posses. Os avós sempre lutaram contra o regime e ajudaram muitos portugueses a fugir. O avô participou internamente na campanha de Humberto Delgado e chegou a ter reuniões secretas com Álvaro Cunhal.

“A política é um meio agressivo, ingrato e não dá boa saúde”

O pai, fundador dos renovadores do PCP, acabou expulso do partido mas “foi comunista para sempre”. Morreu em 2005. A mãe é viva e “sofre” com o filho. “A política é um meio agressivo, ingrato e não dá boa saúde”, desabafa

Em criança andou na escola primária perto de casa e estudou nos liceus Leonardo Coimbra e Clara de Resende. Licenciou-se em Economia na Universidade do Porto e, na altura, “já sabia que ia entrar na política”. Era o tempo do cavaquismo, muito marcado pela luta estudantil.

Na faculdade, enquanto dirigente estudantil, travou a luta contra as propinas e chegou a organizar greves contra Teixeira dos Santos, futuro colega de Governo e ministro das Finanças, então presidente do Conselho Científico da Faculdade de Economia.

Aos 22 anos entrou “mais ativamente” na política. Como presidente da Federação Académica do Porto reunia-se com Manuela Ferreira Leite, na altura ministra da Educação. “Estava a cumprir o último pedido do seu amigo Cavaco Silva e dizia-nos que já não tinha mais margem para negociar”, conta.

Depois da faculdade mudou-se para Lisboa. Começou a trabalhar no Ministério do Trabalho, depois do Ensino Superior. Pelo meio tirou um mestrado em Sociologia Económica.

Sem “grandes amargos” do passado, mas estava lá e lembra-se dos “tempos duros”

A porta grande abriu-se quando recebeu um convite para trabalhar com António Guterres. Em 2001 ligou-se ao partido e fez-se militante do PS.

Foi deputado em 2005, mas acabou secretário de Estado do Emprego e Formação Profissional do primeiro governo Sócrates. Confessa que não tem “grandes amargos” do passado, mas estava lá e lembra-se dos “tempos duros” em que percebeu que o país tinha de ser intervencionado pela Troika.

Em 2013 foi incluído, como número dois, na lista da autarquia de Lisboa. O convite foi interpretado como um sinal de que António Costa não concluiria o mandato como presidente. E assim foi, em 2015, com 42 anos, foi chamado para o substituir na Câmara.

Seis anos depois, perdeu as eleições para Carlos Moedas. Mas prefere não falar sobre este tempo. Para fechar o podcast escolheu a música “Nova Lisboa” de Dino d’ Santiago, mas garante que a escolha não tem nenhuma mensagem política para o atual presidente.

“Daqui a 50 anos posso contar todos os segredos”

Fernando Medina nasceu e cresceu no meio da política e hoje é ministro das Finanças. Os casos que abalaram este governo não o desconcentraram do trabalho, mas assume que foi difícil “manter o foco”.

Durante a conversa não abre a porta aos bastidores do núcleo duro do primeiro-ministro António Costa, mas deixa uma garantia: “Daqui a 50 anos, num novo podcast, posso contar todos os segredos”.

E o futuro? Para já vai participar na campanha eleitoral e ocupar

“lugares cimeiros” das listas por Lisboa a convite de Pedro Nuno Santos, o candidato que não apoiou. "Não mais do que isso, não mais do que isso”, sublinha.

Afasta a entrada num novo governo do PS e fecha a porta a outra candidatura à Câmara de Lisboa.

“A vida tem de andar para a frente” e agora é tempo de voltar aos passeios de bicicleta na Almirante Reis. “Já tenho saudades. Engordei nos últimos tempos. Foram muitas horas a trabalhar no gabinete do Ministério”.


“Geração 70“ é uma conversa solta com os protagonistas de hoje que nasceram na década de 70. A geração que está aos comandos do país ou a caminho. Aqui falamos de expectativas e frustrações. De sonhos concretizados e dos que se perderam.

Um retrato na primeira pessoa sobre a indelével passagem do tempo, uma viagem dos anos 70 até aos nossos dias conduzida por Bernardo Ferrão.

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