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Seca no sul do país: "Nós sistematicamente andamos a correr atrás do prejuízo"

Adriano Bordalo e Sá, Hidrobiólogo, considera que não há uma gestão integrada da água em Portugal e lembra que os agricultores foram incentivados a criar perímetros de rega "e as laranjas e os abacates vão ver as suas produções reduzidas".

SIC Notícias

O Governo cedeu ao setor agrícola no Algarve e reduziu o corte no consumo de água de 70 para 25%. No consumo urbano a redução fica pelos 15%. As decisões foram anunciadas depois de uma reunião que decorreu em Faro.

Para o hidrobiólogo Adriano Bordalo e Sá não é a medida que melhor defende o território.

“É apenas mais uma de muitas, muitas medidas ao longo dos anos porque nós, infelizmente, não queremos de maneira nenhuma fazer uma gestão integrada da água. Nós temos todos os mecanismos legais para o fazer e obrigações europeias para o fazer, mas fruto da guerra de capelinhas entre o Ministério A, o Ministério B, o Ministério C, nós não temos conseguido fazer isso. Nós sistematicamente andamos a correr atrás do prejuízo”.

Concorda que é preciso apelar a que as pessoas poupem a água em casa “mas isso não tem grande importância em termos do consumo geral da água, porque a agricultura, o regadio melhor dizendo, consomem cerca de 80% da água utilizada um pouco por todo o país, incluindo na região algarvia”.

Dois grandes problemas e medidas que deviam ser implementadas

Adriano Bordalo e Sá identifica dois grandes problemas: “durante anos anos, a fio, os agricultores foram quase que instigados a criar novos perímetros de rega, porque havia subsídios europeus, por um lado. Por outro lado, um desentendimento entre dois ministérios cruciais, o da Agricultura e o do Ambiente, e prevaleceram sempre os interesses setoriais do Ministério da Agricultura”.

Com as maiores dificuldades de acesso a água que se preveem com as alterações climáticas, já devia ter sido implementadas uma estrutura de gestão e planeamento, defende o hidrobiólogo, com regiões hidrográficas com autonomia para a tomada de decisões.

"As alterações climáticas não são de agora. Nós, pelo menos há 20 anos que estamos a cientes disso, mas nós fizemos muito, muito, muito pouco".

Há quatro anos tínhamos os planos de eficiência hídrica para o Alentejo e o Algarve. "Seria muito importante fazer-se hoje um balanço e verificar o que é que se conseguiu com isso, eventualmente uma mão cheia de nada".

“Estes planos servem, pelo menos, para tentar tapar alguns buracos, mas a sua eficiência final é muito reduzida porque efetivamente, quando os agricultores foram instigados a investir no regadio ao longo destes anos, nós já sabíamos que estávamos numa situação de grande déficit de água. investiram o que tinham e o que não tinham para criar os perímetros de rega e as laranjas que estamos a ver agora, a até os abacates, que é outra história estranha, mas que agora vão ver as suas produções reduzidas, mas vão ter que continuar a pagar os juros à banca”.

“A alternativa é gerir bem a água, mas nós para gerirmos bem água, nós temos de ter toda uma estrutura de gestão e planeamento que não temos”.

O hidrobiólogo sublinha que o modelo está centralizado em Lisboa, com as as regiões hidrográficas de facto, “sem grande poder, sem autonomia para a tomada de decisões”.

"Por isso, nós vemos hoje que a tivemos dois ministros de diferentes pastas e que foram tratar disso no Algarve e não a entidade que, de acordo com a diretiva quadro da água que nós somos obrigados a cumprir, uma diretiva europeia, o papel preponderante, nomeadamente a planificação, deveria ser das autoridades regionais".

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