O buraco na camada de ozono por cima da Antártida aumenta todas as primaveras há cerca de 20 anos, com algumas oscilações. Mas ao longo dos últimos quatro anos tem sido particularmente grande e profundo, revelam cientistas da Universidade de Otago, Nova Zelândia, que deixam o aviso: os clorofluorcarbonetos (CFC) não são os únicos culpados.
O buraco na camada de ozono na Antártida tem sido notavelmente grande e duradouro nos últimos quatro anos. A piorar a situação, há menos ozono no centro do buraco do que há 19 anos, revelam cientistas neozelandeses que analisaram as mudanças mensais e diárias do ozono em diferentes altitudes e latitudes de 2004 a 2022
“Isto significa que o buraco não é apenas maior em área, mas é também mais profundo durante a primavera", refere Hannah Kessenich, autora principal do estudo publicado esta terça-feira na Nature Communications.
Em que ponto está o buraco na camada de ozono?
Em meados da década de 1970, os clorofluorocarbonetos (CFC), amplamente utilizados em aerossóis e frigoríficos, foram identificados como os principais culpados pela diminuição da camada de ozono, criando 'buracos' todos os anos, incluindo um particularmente amplo acima da Antártida.
Em 1987, entrou em vigor o Protocolo de Montreal sobre Substâncias que Destroem a Camada de Ozono, com as nações signatárias - entre a quais Portugal - a prometerem eliminar gradualmente a produção, uso e importação de CFC.
O acordo conseguiu acabar com a maioria dos processos industriais responsáveis pelas emissões de CFC e, desde então, houve uma diminuição constante nos declínios sazonais de ozono sobre a Antártida.
Em 2019, a dimensão do buraco foi a menor registada desde o início dos anos 1980.
O Protocolo de Montreal é saudado como um sucesso histórico.
Mas em 2021, os cientistas detetaram poluentes a destruir de novo a camada de ozono em algumas partes do mundo, estando em setembro desse ano com um tamanho superior ao da Antártida.
Em janeiro deste ano, voltaram as boas notícias, com os cientistas a afirmarem que o buraco estava a fechar e a ONU declarou que o buraco na camada de ozono poderá mesmo estar totalmente fechado daqui a 43 anos, em 2066.
Com as medidas atualmente em vigor para reduzir a produção e o consumo de químicos que destroem a camada de ozono, os cientistas tinham esperança que recuperasse para os níveis de 1980 até 2066.
Mas em abril deste ano, num estudo na revista Nature, os cientistas alertavam para o aumento de cinco CFC na atmosfera.
Quando pensávamos que os clorofluorcarbonetos (CFC) que destroem a camada de ozono eram uma coisa do passado, os cientistas encontraram um sinal preocupante em dados recentes: os níveis de cinco CFC aumentaram rapidamente de 2010 a 2020.
Em outubro de 2023 foram revelados novos dados da monitorização do satélite europeu Copernicus que revelaram que o buraco na camada de ozono sobre a Antártida estava maior do que nunca.
E de acordo com um estudo publicado esta terça-feira, 21 de novembro, na Nature Communications, o buraco não só está maior como está mais profundo.
Para Susan Solomon, uma especialista em ozono que não esteve envolvida nesta investigação, os resultados deste estudo devem ser lidos à luz do facto de que "os últimos anos foram bastante invulgares", destacou à AFP.
A especialista já tinha demonstrado que, em 2020, o buraco na camada de ozono aumentou 10% devido aos imensos incêndios florestais na Austrália.
A gigantesca erupção do vulcão subaquático Hunga-Tonga-Hunga-Ha'apai, no Pacífico, em janeiro de 2022, também reduziu os níveis de ozono na estratosfera, revela um estudo recente publicado na revista PNAS.
Não são só os CFC os culpados
Mas, apesar do declínio dos CFC, o buraco sobre a Antártida ainda não foi significativamente reduzido, segundo os autores do estudo publicado na Nature Communications.
"Em seis dos últimos nove anos registaram-se níveis de ozono muito baixos e buracos extremamente grandes. Pode ser que algo mais esteja a acontecer na atmosfera - talvez devido às alterações climáticas - e a mascarar parte da recuperação", disse Annika Seppala, do departamento de física da Universidade de Otago, na Nova Zelândia, coautora do estudo, à agência France-Presse (AFP).
O tamanho do buraco na camada de ozono é variável, consoante a força dos ventos fortes que sopram em volta da Antártida. Esta forte corrente de vento é uma consequência direta da rotação da Terra e das fortes diferenças de temperatura entre as latitudes polares e temperadas.
Se a corrente de vento for forte, funciona como uma barreira: as massas de ar entre as latitudes polares e as temperadas não podem cruzar-se. As massas de ar permanecem isoladas nas latitudes polares e arrefecem durante o inverno.
“Fizemos uma associação entre esta quebra no ozono e as mudanças no ar que chega ao vórtice polar acima da Antártida. Isto revela que os recentes e grandes buracos na camada de ozono podem não ser causados apenas pelos CFC”, explica Hannah Kessenich.
Redução de CFC está “no bom caminho”
O buraco na camada de ozono sobre a Antártida geralmente abre em setembro e dura até novembro, durante a primavera austral. Segundo os investigadores, o buraco abriu no final de setembro, um sinal de recuperação, sem dúvida atribuível à redução dos CFC.
Mas em outubro, período em que o buraco atinge o seu tamanho máximo, o nível de ozono na camada estratosférica média caiu 26% entre 2004 e 2022, de acordo com este trabalho baseado em dados de satélite.
A redução de CFC na atmosfera decidida pelo Protocolo de Montreal continua, no entanto, "no bom caminho", sublinha Hannah Kessenich, Mas "as nossas conclusões revelam que estes grandes buracos, formados recentemente, não serão causados apenas por estas substâncias"
“A nossa análise terminou com dados de 2022, mas até hoje o buraco na camada de ozono de 2023 já ultrapassou o tamanho dos três anos anteriores – no final do mês passado era superior a 26 milhões de km2, quase o dobro da área da Antártida”
Outras contribuições para o aumento do buraco na camada de ozono
Compreender as variações no ozono é importante porque desempenha um papel importante no clima do Hemisfério Sul.
“Os recentes incêndios florestais e ciclones na Austrália e na Nova Zelândia e o buraco na camada de ozono na Antártida estão interligados", refere Hannah Kessenich.
O buraco na camada de ozono interage com o delicado equilíbrio da atmosfera. Como o ozono geralmente absorve luz UV, um buraco na camada de ozono pode não apenas causar níveis extremos de UV na superfície da Antártida, mas também pode ter um impacto drástico onde o calor é armazenado na atmosfera.
UE quer acabar com HFC até 2050
O Conselho da União Europeia e o Parlamento Europeu concluíram um acordo a 5 de outubro de 2023 para a eliminação progressiva até 2050 dos gases fluorados, utilizados em frigoríficos, aparelhos de ar condicionado, bombas de calor ou equipamentos de proteção contra incêndio.
Estas normas, uma vez ratificadas oficialmente por ambas as instituições, irão "reduzir ainda mais as emissões para a atmosfera e contribuir para limitar o aumento da temperatura global", afirmou a presidência espanhola.
Especificamente, os negociadores concordaram em reforçar as proibições de comercialização no mercado europeu de produtos que contenham hidrofluorocarbonetos (HFC) ou gases fluorados, acelerar a adoção de soluções mais respeitadoras do clima e oferecer garantias aos fabricantes e investidores.
O acordo prevê uma meta de zero hidrofluorocarbonetos até 2050, com uma redução progressiva do consumo entre 2024 e 2049, destacou um comunicado do Parlamento Europeu.