O buraco na camada de ozono deste ano sobre a Antártida é um dos maiores alguma vez registados, revelam as medições do programa europeu de monitorização da atmosfera Copernicus (CAMS). A má notícia surge poucos meses depois do anúncio da ONU de que a camada de ozono estava a regenerar-se.
As medições do satélite Copernicus Sentinel-5P mostram que o buraco, que é o que os cientistas chamam à “área de destruição da camada de ozono”, atingiu um tamanho de 26 milhões de quilómetros quadrados em 16 de setembro de 2023. Aproximadamente, três vezes o tamanho do Brasil.
Lançado em outubro de 2017, o satélite Copernicus Sentinel-5P é o primeiro satélite Copernicus dedicado à monitorização da atmosfera. Com o seu instrumento de última geração, Tropomi, é capaz de detetar gases atmosféricos para obter imagens de poluentes atmosféricos com precisão e com uma elevada resolução a partir do espaço, explica a Agência Espacial Europeia (ESA).
“Isto não devia estar a acontecer”
Já em abril deste ano, num estudo na revista Nature, os cientistas alertavam para o aumento de cinco CFC na atmosfera
Quando pensávamos que os clorofluorcarbonetos (CFC) que destroem a camada de ozono eram uma coisa do passado, os cientistas encontraram um sinal preocupante em dados recentes: os níveis de cinco CFC aumentaram rapidamente de 2010 a 2020.
O efeito de aquecimento do planeta que têm estes gases em conjunto é equivalente às emissões produzidas por um país pequeno como a Suíça durante um ano.
“Isto não deveria estar a acontecer”, afirmou o químico atmosférico Martin Vollmer, que ajudou a analisar dados de uma rede internacional que faz a monitorização de CFC.
As hipóteses colocadas para justificar o aumento do buraco na camada de ozono
O tamanho do buraco na camada de ozono é variável, consoante a força dos ventos fortes que sopram ao redor da Antártida. Esta forte corrente de vento é uma consequência direta da rotação da Terra e das fortes diferenças de temperatura entre as latitudes polares e temperadas.
Se a corrente de vento for forte, funciona como uma barreira: as massas de ar entre as latitudes polares e as temperadas não podem cruzar-se. As massas de ar permanecem isoladas nas latitudes polares e arrefecem durante o inverno.
Ainda é cedo para determinar as razões por detrás das atuais concentrações de ozono. De acordo com a ESA, os investigadores avançam com três hipóteses:
1. Uma simples variação natural.
2. Alguns investigadores especulam que os padrões invulgares de ozono deste ano poderão estar associados à erupção do vulcão Hunga Tonga-Hunga Ha'apai em janeiro de 2022.
3. O impacto persistente das substâncias que destroem a camada de ozono.
1. Uma simples variação natural
Embora o buraco na camada de ozono tenha vindo a fechar-se gradualmente desde a proibição dos gases que favorecem o seu alargamento, a sua dimensão oscila sempre ao longo do ano e é normal que seja mais maior entre agosto e outubro de cada ano. O seu máximo é geralmente atingido em meados de setembro, o que explica em parte as medições de satélite neste período.
No entanto, este ano o buraco na camada de ozono abriu mais cedo e cresceu muito mais rapidamente do que o esperado.
2. Consequência da erupção do vulcão Hunga Tonga-Hunga Ha'apai
É provável que a erupção do vulcão Hunga Tonga tenha desempenhado um papel importante na dimensão do buraco na camada de ozono este ano.
Em janeiro de 2022, este vulcão “ejetou grandes quantidades de vapor de água para a estratosfera, vapor de água que se espalhou pelo resto do planeta até chegar à Antártida no final do ano de 2022”, explica o cientista do CAMS Antje Inness.
“O vapor de água pode ter levado ao aumento da formação de nuvens estratosféricas polares, onde os clorofluorcarbonos (CFC) podem reagir e acelerar a destruição da camada de ozono. A presença de vapor de água também pode contribuir para o arrefecimento da estratosfera antártica, aumentando ainda mais a formação destas nuvens estratosféricas polares e resultando num vórtice polar mais forte”.
(Atualização: a 20 de novembro, um outro estudo trouxe mais dados sobre o impacto da erupção do vulcão, que reduziu os níveis de ozono na estratosfera).
3. O impacto persistente das substâncias que destroem a camada de ozono
Nas décadas de 1970 e 1980, o uso generalizado de clorofluorcarbonetos em produtos como frigoríficos e latas de aerossol danificou o ozono nas camadas mais elevadas da nossa atmosfera – o que deu origem ao buraco na camada de ozono acima da Antártida.
Em 1989, entrou em vigor o Protocolo de Montreal sobre Substâncias que Destroem a Camada de Ozono, com as nações signatárias - entre a quais Portugal - a prometerem eliminar gradualmente a produção, uso e importação de CFC.
O acordo conseguiu acabar com a maioria dos processos industriais responsáveis pelas emissões de CFC e, desde então, houve uma diminuição constante nos declínios sazonais de ozono sobre a Antártida.
Em 2019, a dimensão do buraco foi a menor registada desde o início dos anos 1980. ,
Mas em 2021, os cientistas detetaram poluentes a destruir de novo a camada de ozono em algumas partes do mundo, estando em setembro desse ano com um tamanho superior ao da Antártida.
Em janeiro deste ano voltaram as boas notícias: a ONU declarou que o buraco na camada de ozono poderá mesmo estar totalmente fechado daqui a 43 anos, em 2066.
Com as medidas atualmente em vigor para reduzir a produção e o consumo de químicos que destroem a camada de ozono, os cientistas tinham esperança que recuperasse para os níveis de 1980 até 2066.
UE quer acabar com HFC até 2050
O Conselho da União Europeia e o Parlamento Europeu concluíram um acordo a 5 de outubro de 2023 para a eliminação progressiva até 2050 dos gases fluorados, utilizados em frigoríficos, aparelhos de ar condicionado, bombas de calor ou equipamentos de proteção contra incêndio.
Estas normas, uma vez ratificadas oficialmente por ambas as instituições, irão "reduzir ainda mais as emissões para a atmosfera e contribuir para limitar o aumento da temperatura global", afirmou a presidência espanhola.
Especificamente, os negociadores concordaram em reforçar as proibições de comercialização no mercado europeu de produtos que contenham hidrofluorocarbonetos (HFC) ou gases fluorados, acelerar a adoção de soluções mais respeitadoras do clima e oferecer garantias aos fabricantes e investidores.
O acordo prevê uma meta de zero hidrofluorocarbonetos até 2050, com uma redução progressiva do consumo entre 2024 e 2049, destacou um comunicado do Parlamento Europeu.