Eleições Legislativas

Explosão da direita cria nuvem em cima da democracia: eis o filme da noite eleitoral

Ao mesmo tempo que arrancava a cerimónia dos Óscares, em Los Angeles, em Portugal assistia-se a um filme, em nada ficcionado, cujo final irá ditar o rumo do país para, no mínimo, os próximos meses. Quem foi o herói da noite e quem foi o derrotado? Há ainda personagens que saltaram do segundo plano para serem principais e outras que estão quase esquecidas. Eis o filme da noite eleitoral, que em termos de duração está ao nível do Oppenheimer.

Ana Luísa Monteiro

Este é o filme de uma noite eleitoral imprópria para cardíacos, que começou com uma nota positiva: os eleitores mobilizaram-se na ida às urnas, prevendo-se uma abstenção entre os 35,5% e os 40,5%. Acabou por se confirmar que 66,23% dos portugueses votaram, fixando a taxa de abstenção, já no final da noite, nos 33,8%, a mais baixa desde 1995.

Às 20:00 horas em ponto, chegaram as projeções à boca das urnas que davam a Aliança Democrática à frente, seguida do Partido Socialista e do Chega. O resultado acabou por se confirmar às 01:38 horas, quando a contagem dos votos terminou, dando 29,52% à Aliança Democrática, 28,63% ao Partido Socialista e 18,06% ao Chega, que conseguiu arrecadar pela primeira vez mais de 1,1 milhões de votos e que conseguiu passar de 12 para 48 deputados.

A margem entre a AD e o PS foi tangencial, mas ambos já deram por fechados os resultados, mesmo faltando contar os votos dos círculos do estrangeiro.

Veja aqui os resultados dos partidos com assento parlamentar:

O Partido Socialista saiu derrotado das eleições e, por isso, tal como manda a tradição, reagiu aos resultados antes da Aliança Democrática consagrar a vitória com o discurso de Luís Montenegro.

Sem surpresas, Pedro Nuno Santos falou para uma sala cheia no hotel Atlis, quartel-general socialista, que o recebeu a entoar em uníssono “25 de Abril sempre, fascismo nunca mais”. Isto porque, André Ventura tinha acabado de reagir aos resultados, na sede do Chega, anunciando um resultado histórico que, segundo diz, significa o fim do bipartidarismo.

O secretário-geral do PS não demorou a assumir a derrota, depois de ter felicitado Luís Montenegro por ter vencido as eleições, e recusando-se a deixar o país em suspenso por 15 dias, até serem contados os votos dos círculos estrangeiros.

Em poucos minutos, Pedro Nuno Santos garantiu que vai viabilizar o Governo da Aliança Democrática, mas não irá suportar um Governo de direita, deixando fechada a porta para a aprovação de um Orçamento do Estado da AD. Disse ainda que os socialistas não cederão a pressões no que diz respeito a esta matéria, uma vez que considera “incompatíveis” os programas do PSD e PS.

O último discurso da noite ficou a cargo do vencedor, Luís Montenegro, que surgiu ao lado dos companheiros de coligação, Nuno Melo, do CDS, que volta ao Parlamento, e Gonçalo da Câmara Pereira, do PPM.

O líder da Aliança Democrática disse que os portugueses votaram pela “mudança” e que, por isso, não falhará a Portugal. No entanto, num discurso alegre mas comedido, Montenegro confessou que o “desafio é grande e que vai exigir um grande sentido de responsabilidade", com “grande capacidade de diálogo e de tolerância democrática”.

O “não é não" ao Chega mantém-se e, por isso, a vida da chamada direita democrática não fica fácil. Os deputados eleitos da Aliança Democrática somados aos deputados da Iniciativa Liberal não são suficientes para fazer aprovar um Orçamento do Estado.

No discurso, Luís Montenegro prometeu implementar "um programa de emergência" na área da saúde nos primeiros 60 dias de Governo.

Chega com resultado histórico

Vamos a números. O Chega conseguiu esta noite passar de 12 para 48 deputados na Assembleia da República, deixando para trás os 7,15% dos votos conquistados nas eleições de 2022 e fixando-se agora nos 18,06%. Já nas eleições presidenciais, o partido de André Ventura tinha ultrapassado o meio milhão de votos e, apesar dos avisos, esta noite foi ultrapassada uma meta surpreendente: o Chega arrecadou mais de 1,1 milhões de votos. Estes números fizeram de Ventura o líder mais feliz desta noite.

No discurso, o líder do Chega criticou os jornalistas, deixou um recado a Marcelo Rebelo de Sousa, ironizou com Cavaco Silva e prometeu libertar “já amanhã” Portugal da extrema-esquerda.

Livre quadruplica resultado

Assim como Chega, o Livre também quadruplicou o número de deputados no Parlamento. Mais um líder feliz nesta noite. Rui Tavares vai deixar de estar sozinho na Assembleia da República e vai passar a contar com a companhia de mais três deputados, conseguindo formar o tão desejado grupo parlamentar.

No Teatro Thalia, em Lisboa, quartel-general do Livre nestas eleições, ouviram-se gritos e cânticos quando se percebeu que o deputado pelo Porto tinha sido eleito. O Livre conseguiu, assim, conquistar mais 130.915 votos do que nas últimas eleições e igualar o número de deputados do PCP.

Iniciativa Liberal: crescimento mais moderado

A Iniciativa Liberal cresceu timidamente nestas eleições, conseguindo apenas mais 40.000 votos do que em 2022, e mantendo o número de deputados eleitos (são 8). No discurso de reação, Rui Rocha prometeu que o partido será responsável e que não será pela Iniciativa Liberal que não haverá uma solução estável de governação.

Bloco de Esquerda manteve-se “firme”

Quem também manteve o número de deputados foi o Bloco de Esquerda. O grupo parlamentar vai continuar a ser constituído por cinco deputados, apesar de Mariana Mortágua ter conquistado mais votos do que Catarina Martins nas últimas eleições. A coordenadora bloquista reconheceu a “inegável viragem à direita”, mas mostrou-se disponível para fazer parte de uma alternativa de esquerda que, entretanto, Pedro Nuno Santos já veio descartar.

CDU vergou, mas não partiu

Os resultados desta noite confirmam a tendência de queda da CDU, que esta noite voltou a sofrer duras perdas: foram menos 34.080 votos do que em 2022, que resultaram na perda de dois deputados. Paulo Raimundo admitiu que o resultado foi negativo, mas disse que foi “importante expressão de resistência”.

PAN: Inês Sousa Real continua sozinha no Parlamento

O PAN falou o grande objetivo que trazia para estas eleições. Não conseguiu eleger um grupo parlamentar, mantendo-se Inês Sousa Real sozinha por mais um mandato no Parlamento, apesar de ter arrecadado mais 36.322 votos do que em 2022. Na reação, a deputada única do PAN criticou Marcelo Rebelo de Sousa e mostrou-se receosa com os resultados das eleições.

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