Eis um lugar-comum de todos os dias: falamos do cinema como um universo de imagens (raras vezes falamos dos sons…) e quase sempre ignoramos quem tem um papel decisivo na criação dessas mesmas imagens. Ou seja: os directores de fotografia. Lembremos, por isso, o talentoso, nem sempre devidamente reconhecido, Bill Butler.
No dia 5 de abril surgiu a notícia do seu falecimento, em Los Angeles — contava 101 anos. A sua carreira profissional, iniciada na década de 60, é indissociável de um contexto de muitas transformações, pontuado pela emergência da geração dos chamados “movie brats” (à letra: “miúdos do cinema”) que, com o seu misto de admiração pelos clássicos e ousadia experimental, reconfiguraram o panorama artístico e industrial de Hollywood.
O seu trabalho mais famoso é, seguramente, a direcção fotográfica (partilhada com Haskell Wexler) de “Voando sobre um Ninho de Cucos” (1975), de Milos Forman — Butler foi um dos nomeados para os Óscares, mas não ganhou. Em qualquer caso, o filme foi o grande vencedor desse ano, tendo obtido cinco estatuetas douradas.
Antes, já tinha sido responsável pelas imagens de dois títulos de Francis Ford Coppola, “Chove no Meu Coração” (1969) e “O Vigilante” (1974), tendo também assumido as funções de director da segunda equipa no espectacular “Deliverance/Fim de Semana Alucinante” (1972), de John Boorman. Também em 1975, fotografou “Tubarão”, de Steven Spielberg, por certo um dos maiores desafios que enfrentou, devido à complexidade prática e logística de uma rodagem no alto mar [veja-se o trailer referente à mais recente reposição do filme].
Encontramos a assinatura de Butler em filmes tão diversos como o musical “Grease/Brilhantina” (1978), com John Travolta e Olivia Newton-John, “Os Rapazes de Biloxi” (1988), drama de guerra escrito por Neil Simon, ou “Graffiti Bridge” (1990), musical escrito, interpretado e dirigido por Prince. Nos momentos mais significativos da sua filmografia, ele foi, afinal, um dos directores de fotografia que revalorizaram um estilo que nunca dispensou o uso da luz natural, mesmo quando sujeita a múltiplas manipulações — sem dúvida por isso, a American Society of Cinematographers distinguiu-o, em 2003, com um prémio de carreira.