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Operação Maestro: "UE vai querer dinheiro devolvido e pode vir a sobrar para os contribuintes”

Em entrevista na SIC Notícias, João Paulo Batalha, vice-presidente da Frente Cívica, analisa os contornos da operação Maestro, um caso que envolve o valor mais elevado dos últimos anos em fraudes com fundos europeus.

SIC Notícias

As fraudes a fundos europeus já ultrapassaram os 70 milhões de euros nos últimos três anos. As contas são feitas na edição de hoje do Diário de Notícias e incluem já os cerca de 40 milhões de euros que as autoridades suspeitam que tenham sido desviados no esquema que envolve o empresário Manuel Serrão. João Paulo Batalha, vice-presidente da Frente Cívica, analisa a operação Maestro, um caso que envolve o valor mais elevado dos últimos anos em fraudes com fundos europeus.

"Há um problema de raiz que é um problema político, antes até de ser um problema de fraude, é um problema criminal, que é o facto de os fundos europeus em Portugal serem discutidos na praça pública e, sobretudo, na discussão política, quase única e exclusivamente pelo critério da execução. É a grande obsessão nacional, como temos visto com a discussão do PRR - Se Portugal está a executar os fundos, se Portugal vai executar os fundos, se o governo X conseguiu executar 100%, 80% dos fundos, se o governo y tem taxas de execução maiores ou menores e portanto, isto cria desde logo um incentivo perverso de gastar o máximo de dinheiro, independentemente de garantirmos se ele está a ser bem gasto ou não ou está a ir para os beneficiários certos", começa por referir.

Neste contexto, João Paulo Batalha considera que se criou “uma espécie de consenso político e económico e, no início, ainda nos anos 80, também judicial, houve processos que não avançaram, em parte porque ninguém queria reconhecer culpas que implicavam ter que devolver dinheiro à Europa”.

Para o vice-presidente da Frente Cívica, o sistema judicial evoluiu, o que já não acontece com a promiscuidade entre sistema político e o sistema económico.

“Temos incentivos para que grandes beneficiários, grandes empresas ou empreendedores com ligações políticas recebam muitos fundos, porque a garantia de que os gastam têm provas dadas na capacidade de lá estar, executar os fundos, mas depois pouco disto se traduz em ganhos concretos em termos económicos e sociais”, destaca.

João Paulo Batalha explica que a Comissão Europeia vai fazendo o seu trabalho de proteger os interesses financeiros da União Europeia (UE), o que tem significado que, “em muitos destes casos, independentemente de haver ou não responsabilidades criminais em Portugal, a Comissão Europeia faz as suas auditorias e exige devolução do dinheiro”.

Bruxelas vai investigar operação Maestro: “UE vai querer dinheiro devolvido”

No caso da operação Maestro, o Ministério Público suspeita que Manuel Serrão terá vivido durante oito anos num hotel de luxo no Porto e que as despesas terão sido pagas com dinheiro de fundos europeus, destinados a promover os têxteis portugueses. Segundo o jornal Expresso, o alojamento que Manuel Serrão ocupou, entre 2015 e 2023, terá custado mais de 370 mil euros.

Manuel Serrão é o principal suspeito da operação Maestro e terá lesado o Estado português em cerca de 40 milhões de euros, valor que muito provavelmente terá de ser devolvido a Bruxelas, explica João Paulo Batalha.

“Se a Comissão Europeia não estava atenta a este caso estará hoje, seguramente, e vai fazer o seu próprio trabalho, a sua própria auditoria e, portanto, mesmo que em Portugal, no limite, nem se chegue a apurar nenhuma responsabilidade criminal, é muito provável, sobretudo se se confirmar que andámos oito anos a pagar estadias em hotel de luxo a um empreendedor português, seguramente a UE vai querer esse dinheiro devolvido, independentemente de nós chegarmos ou não a conclusões aqui em Portugal".

O vice-presidente da Frente Cívica sublinha que “o prejuízo pode ainda vir a ser arcado não pelos beneficiários que tenham recebido dinheiro indevidamente, mas pelos contribuintes, porque se não houver responsabilidade criminal em Portugal que obrigue os beneficiários a devolver o dinheiro e a União Europeia, independentemente disso, face à sua própria auditoria, queira o dinheiro de volta, o que é muito provável, vai sobrar para os contribuintes”.

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