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Galamba usou motoristas para transportar as filhas, a empregada e garrafas de vinho

Na indiciação do Ministério Público, a que a SIC teve acesso, vem descrito que o ministro das Infraestruturas usou os motoristas oficiais em benefício pessoal. Mas não só.

MIGUEL A. LOPES/Lusa

Ana Lemos

Diogo Teixeira Pereira

Depois de um dia fechado em casa, onde recebeu apenas a visita do advogado, o ainda ministro, agora arguido, saiu esta quarta-feira à rua mas aos jornalistas que o aguardavam nem uma palavra disse. João Galamba é várias vezes citado na indiciação do Ministério Público (MP), cujo teor a SIC teve acesso, sobretudo quando se fala dos polémicos negócios do lítio e do hidrogénio verde.

Mas no mesmo inquérito investigam-se também suspeitas de menor dimensão. Refere o procurador João Paulo Centeno que enquanto secretário de Estado da Energia e Ambiente, João Galamba, terá usado dois motoristas que prestavam serviço no ministério para benefício pessoal.

O documento relata que o ex-secretário de Estado e atual ministro das Infraestruturas pedia com frequência aos motoristas que transportassem as filhas e a empregada em deslocações pessoais, e também lhes pedia que fossem buscar garrafas de vinho.

A investigação, que assenta em grande medida em escutas telefónicas entre os arguidos e vários documentos, alguns entretanto apreendidos no decorrer das buscas realizadas esta terça-feira, sublinha a elevada gravidade das condutas criminosas em investigação e que levaram à demissão do primeiro-ministro por estar a ser investigado num processo autónomo.

Ainda segundo a indiciação do MP, há indícios de que esse contactos foram mantidos em circunstâncias informais como almoços e jantares, oferecidos pelos suspeitos Afonso Salema e Rui Oliveira Neves e pagas pela Start Campus quer a João Galamba, quer a Nuno Lacasta (da Agência Portuguesa do Ambiente - APA).

Galamba foi constituído arguido

A investigação, que arrancou em 2019, focava-se na construção em Sines de um mega centro de dados desenvolvido pela Start Campus e cuja primeira fase está já em conclusão. Em abril de 2021, aquando da assinatura do contrato para a instalação do data center, António Costa referiu que em causa estava o maior investimento estrangeiro das últimas décadas em Portugal e que ascenderia a 3,5 mil milhões de euros.

Esta terça-feira, o Ministério Público, com o apoio da Autoridade Tributária (AT) e da PSP, realizou pelo menos 42 buscas em diversos locais e levou às detenções de Lacerda Machado, Vítor Escária, Nuno Mascarenhas, Afonso Salema e Rui Oliveira Neves, tendo sido constituídos arguidos João Galamba e Nuno Lacasta. Os cinco detidos serão presentes a juiz hoje de tarde para primeiro interrogatório judicial.

O MP considerou haver fortes indícios de crimes de corrupção ativa e passiva de titular de cargo político, tráfico de influência e prevaricação.

O caso acabou por implicar António Costa, pois, de acordo com o comunicado da Procuradoria-Geral da República (PGR), "no decurso das investigações surgiu (...) o conhecimento da invocação por suspeitos do nome e da autoridade do primeiro-ministro e da sua intervenção para desbloquear procedimentos", pelo que essas referências "serão autonomamente analisadas no âmbito de inquérito instaurado no Supremo Tribunal de Justiça".

Na sequência do caso, António Costa anunciou na terça-feira a sua demissão do cargo de primeiro-ministro, mas recusou a prática "de qualquer ato ilícito ou censurável" e manifestou total disponibilidade para colaborar com a justiça "em tudo o que entenda necessário".

O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, aceitou a demissão e convocou para hoje os partidos para uma ronda de audiências no Palácio de Belém, em Lisboa, e vai reunir o Conselho de Estado na quinta-feira.

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