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Falta de professores: "Um aluno sem aulas não é aceitável", mas o "problema não fica resolvido hoje"

Na semana em que os alunos voltam às aulas, o ministro da Educação reconhece que o problema existe, mas afirma que é preciso tempo para "arrumar a casa".

Filipa Traqueia

O ano letivo volta a começar com falta de professores: cerca de 1.300 horários estão por preencher e, segundo a Fenprof, mais de 100 mil alunos estão sem professor. Os docentes continuam em luta e já anunciaram várias formas de protesto. O ministro da Educação, João Costa, lembra que existe ainda uma fase de colocação de docentes, mas reconhece que "problema não fica resolvido" na primeira semana de aulas.

Em entrevista à SIC Notícias, o ministro da Educação avança que, desde 23 de agosto, foram colocados “mais de 39.400 professores e que, até terça-feira desta semana, o Ministério resolveu “cerca de 1.000 horários”. João Costa sublinha que a necessidade de preencher horários é algo que acontece durante todo o ano letivo, devido às aposentações e baixas médicas dos docentes.

“Um horário por preencher é um horário a mais, um aluno sem aulas não é aceitável”, afirma, acrescentando que não se consegue “fazer uma estimativa precisa de quantos alunos estão impactados pela falta de professores”.

O ministro lembra que no início do ano letivo “as escolas dão sempre prioridade às aulas na distribuição de serviço”, havendo depois “muitos horários para apoios educativos, projetos, clubes, uma série de dimensões que são também muito importantes”.

Para compensar a falta de professores, o Governo decidiu abrir os concursos a professores com habilitação própria - ou seja, profissionais com especialização científica mas que não realizaram a formação pedagógica. Segundo o ministro da Educação, foram colocados ao abrigo desta modalidade cerca de 800 profissionais.

“O que queremos é que estes professores, ao longo do próximo ano, sejam cativados para a profissão e que eles possam fazer a sua profissionalização”, afirma, garantido que estes profissionais são acompanhados nas escolas por professores mais experientes.

Arrumar a casa: “Um problema com 50 anos não se resolve em meses”

O último ano letivo ficou marcado por dezenas de protestos dos professores e pelas negociações entre o Governo e os sindicatos. Para este ano, há já greves agendadas. Os docentes exigem a recuperação dos seis anos, seis meses e 23 dias do tempo de serviço que foi congelado durante o período da troika e lutam contra as quotas na progressão de carreira e a colocação a centenas de quilómetros de casa.

O ministro tem vindo a reconhecer que o problema na gestão dos professores é antigo, mas garante que estão a ser dados passos para o resolver. Pede aos sindicatos que não assumam posições de “intransigência”.

“Um problema com 50 anos não se resolve em meses. Estamos a dar passos para redução de distâncias, vinculação, etc., mas isto resolve-se com tempo”, afirma João Costa.

Entre os passos dados, o ministro destaca a aceleração das substituições, com “recurso à contratação de escola”, e a possibilidade dos docentes partilharem horários em escolas de proximidade (uma medida que João Costa admite não ter agradado "aos professores na negociação”). Sublinha que algumas destas medidas são um “penso rápido”.

“O nosso trabalho ao longo deste ano foi um trabalho constante com as organizações sindicais. Foram muitas as matérias em que avançamos, até em reivindicações muito antigas do sindicato”, acrescenta. “É muito claro que, em sede negocial, nós precisamos de ter posições que não sejam de intransigência, mas de cedência de parte a parte e de compreensão.”

Sobre a recuperação do tempo de serviço – uma das reivindicações de bandeira dos professores –, João Costa afirma que o Governo deu “a resposta possível” ao aprovar o chamado “acelerador da carreira”. Explica que esta medida “permite que muitos professores recuperem algum tempo [de serviço] que foi perdido” e “o tempo que ficaram a aguardar vagas para progressão de escalão”, ficando também "isentos de vagas e quotas” para avançarem na carreira.

No que toca à colocação de professores a centenas de quilómetros de casa, o ministro da Educação reconhece que existe “um problema sério no país”:

"Tivemos mais formação de professores a norte do que a sul e temos mais necessidade de professores a sul do que a norte. Isto configura um problema de solução muito difícil que é os professores querem, legitimamente, ficar perto de casa, mas fazem falta na outra ponta do país", afirma.

Para tentar resolver esta situação, os grandes concursos de colocação, que eram realizados de quatro em quatro ano, voltam a ser anuais. Esta medida, que foi “pedida pelos sindicatos”, permite, segundo João Costa, que “todos os anos, quando um professor se aposenta, a vaga abra e possa haver uma aproximação progressiva” dos docentes à zona de residência.

Os alunos, os protestos e os cartazes que incitam “ao ódio e à violência”

No ultimo ano, os cartazes usados pelos professores durante os protestos e manifestações causaram polémica. O primeiro-ministro afirmou que as caricaturas eram racistas, João Costa vem agora dizer que são “de mau gosto” e representam “uma incitação ao ódio e à violência”.

“A maior parte dos professores que eu conheço não se revê naquilo. É um grupo pequeno, que anda de terra em terra com aqueles cartazes atrás. São de mau gosto, são de incitação ao ódio à violência e acho que são, sobretudo, um mau exemplo para os alunos”, afirma.

João Costa pede aos professores que tragam “mais serenidade” às escolas e que, apesar das divergências, se continue o trabalho negocial “sem prejudicar os alunos”.

“Se pensarmos nos alunos, no que foram os últimos anos, em particular o impacto da pandemia, devemos todos esforçarmo-nos e devemos todos conseguir, mesmo quando não estamos de acordo, continuar a trabalhar”, afirma, lembrando que, durante o último ano letivo, se realizaram “quase duas dezenas de reuniões com os sindicatos” de onde “saíram avanços”.

Este ano letivo, as nove organizações sindicais que integram a Fenprof e a Federação Nacional da Educação (FNE) anunciaram uma greve ao sobretrabalho, às horas extra e às componentes não letivas. Também o Sindicato de Todos os Profissionais da Educação (S.TO.P) avança com uma greve de cinco dias.

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