O julgamento do homicídio de Jéssica, a criança de 3 anos que morreu em Setúbal, vítima de maus-tratos e agressões, começou esta segunda-feira. No processo, há cinco arguidos: a mãe e quatro elementos da família que sequestrou a menina.
A primeira sessão do julgamento, que decorreu durante a manhã, ficou marcada pelo silêncio da mãe e pelo testemunho do companheiro da ama, Justo Montes, segundo relata a repórter da SIC, Ana Paula Félix.
Questionado sobre os ferimentos na cara da criança, o arguido disse que "não ouviu nada, não se lembra de nada" e que a única coisa que terá acontecido foi que a criança caiu de uma cadeira.
Em relação às acusações de que ele e a família suspeita de sequestrar a menina são alvo afirmou sempre que era "tudo, tudo mentira".
Justo Montes confirmou que Jéssica esteve na casa dele e da companheira durante os cinco dias, mas garantiu que "nunca viu nada" e que "nunca viu a criança ser agredida".
Sobre os objetos encontrados dentro do bolso do casaco que costumava vestir afirmou que não sabia como é que a tesoura, o alicate e os ovos - não comestíveis, seriam usados para transporte de droga – tinham ido lá parar.
O coletivo de juízes questionou ainda o arguido sobre os vestígios da menina encontrados num isqueiro. Confirmou que era o único naquela casa que fumava, mas que não sabia como é que os vestígios tinham aparecido no objeto.
Quem são os cinco arguidos no processo?
Ao todo, cinco pessoas estão a ser julgadas pelo envolvimento na morte de Jéssica, de 3 anos.
A mãe da criança, Inês Sanches, responde por homicídio qualificado e ofensas à integridade física por omissão. O Ministério Público acredita que a mulher teve a possibilidade de salvar a filha e não o fez. Muito pelo contrário, o MP acusa-a de expor a criança a uma situação que sabia que corria risco de vida.
Três outros arguidos são a ama com quem a criança ficou durante cinco dias, Ana Cristina Pinto, conhecida como Tita, o companheiro Justo Montes e a filha do casal, Esmeralda. Os três estão presos preventivamente, acusados de homicídio, rapto, ofensas à integridade física, coação e violação.
Além de ter sido espancada, as autoridades acreditam que Jéssica foi usada como correio de droga, com o consentimento da mãe. Droga que seria traficada por Eduardo Montes, de 29 anos, o quinto arguido e o único que não ficou detido. O segundo filho do casal deverá ser ouvido ainda esta segunda-feira.
O que aconteceu a Jéssica?
Segundo o despacho de acusação do MP, a menina terá sido agredida várias vezes por Ana Pinto, Justo Ribeiro Montes e Esmeralda Pinto Montes, que a retiveram em sua casa para garantir o pagamento de uma dívida da mãe, que nunca denunciou a situação às autoridades.
A menina só terá sido entregue de volta à mãe cinco dias depois, por volta das 10:00 do dia 20 de junho, com sinais evidentes de maus-tratos e quando já não reagia a qualquer estímulo.
O MP refere ainda que só cinco horas mais tarde, por volta das 15:00, é que a mãe terá contado ao seu companheiro o que se passava, tendo este alertado o INEM. A menina ainda foi assistida no local e transportada ao Hospital de São Bernardo, mas não resistiu aos ferimentos.
Sessão da tarde adiada
A sessão da manhã atrasou-se duas horas, também devido à greve dos funcionários judiciais, mas decorreu a partir das 11:00. A sessão da tarde estava agendada para as 14:30, mas não houve condições para se darem início aos trabalhos.
O juiz presidente do coletivo que está a julgar o caso no Tribunal de Setúbal, Pedro Godinho, justificou aos advogados e aos jornalistas a não realização da sessão com a greve, afirmando que "sem funcionários, não há julgamento".
O juiz disse ainda que este é um problema que continua sem solução e que está a ter "um impacto que já é superior ao da [pandemia de] covid". A próxima sessão de trabalhos foi agendada para terça-feira às 09:15, tal como estava já marcado.
[Artigo atualizado às 20:50]