Opinião

Gyokeres é de direita

Opinião de João Rosado. Com dois anos em Portugal, o internacional sueco não esconde a sua predileção
CARLOS BARROSO/Lusa

João Rosado

É um dos melhores noves do panorama mundial mas, para já, está metido num grande oito.

Viktor Gyokeres, depois de bisar frente ao Casa Pia, chegou aos 48 golos na temporada, contabilizando-se os 39 com a camisola do Sporting e os 9 apontados ao serviço da Suécia na Liga das Nações.

Em seis encontros cumpridos pela seleção em 2024/25, o avançado celebrou tantas vezes como o fez na pele de leão... que assina o último passe. Além dos 39 carimbos verdes e brancos, Viktor colecionou 9 assistências, o que significa que esteve envolvido em 48 golos sob a orientação dos três treinadores que até ao momento habitaram em Alvalade.

Sem surpresa, o atual técnico foi incapaz de conter o regozijo após o duelo em Rio Maior e não resistiu a qualificar o artilheiro dos artilheiros como um “fenómeno”. Utilizado por Rui Borges em 15 jogos e respondendo com 13 tentos, o escandinavo indicia estar de volta à melhor forma e repleto de munições, ao ponto de no último domingo ter batido os números impressionantes de 2023/24.

Fechada a época que valeu o segundo título de campeão a Ruben Amorim, foi de férias com 46 golos e 15 assistências na bagagem, currículo que nos dias que correm até parece curto face ao que se pode projetar.

Após a pausa correspondente aos compromissos que diversas seleções vão ter pela frente (Portugal defrontará a Dinamarca nos quartos de final da Liga das Nações), a Liga Betclic regressará para uma etapa final de dois meses que se prevê disputada em photo-finish e à medida do apetite insaciável de um atleta que no contexto português pode ainda sonhar com mais três desafios na Taça de Portugal.

Claro que para chegar ao Jamor e perspetivar outro dérbi com o Benfica, além da permissão do Tirsense, o homem da máscara tem sobretudo de contar com a licença passada pelo mesmo Rio Ave a quem marcou logo na ronda inaugural do campeonato e também em Vila do Conde, numa dupla façanha que ajuda a ilustrar o facto de não existir nenhuma equipa no primeiro escalão imune à pontaria do sueco.

Até há bem pouco tempo, o sensacional Estoril podia orgulhar-se de ser o único emblema com a baliza a zero diante de Gyokeres, uma curiosidade que caiu há duas semanas e bem ao estilo do que sentiu o casapiano Patrick Sequeira. O guarda-redes com mais defesas (97) efetuadas na Liga não resistiu, como não resistira Joel Robles, a um bis de Viktor, que aproveitou para se cimentar no topo dos marcadores graças a um total de 27 golos. Os dois perseguidores diretos, juntos, não chegam para o sportinguista, uma vez que o portista Samu se mantém nos 14 e o rio-avista Clayton apresenta 12, o que não deixa, no caso do brasileiro, de constituir uma marca notável.

PRESO A UM LIVRE

Alheio aos altos e baixos da concorrência, o goleador leonino volta a agitar o mercado, que aparentemente não dá sinais de se incomodar com os aspetos menos fortes que se vislumbram no modo devorador do craque que chegou a Lisboa no verão de 2023. Desde que foi transferido pelo Coventry, patenteou qualquer coisa como 82 golos de leão ao peito, sendo que 64 deles, de acordo com a informação disponibilizada pelo portal “Transfermarkt”, foram obtidos de pé direito, com 13 a resultarem de remates com o esquerdo e apenas cinco com origem em golpes de cabeça.

A arma mais letal de Gyokeres traduz uma percentagem de utilização que atinge os 78%, algo de esmagador em comparação com os 15,8% de golos obtidos com o pé esquerdo e os míseros 6% associados à eficácia (ou falta dela...) no futebol aéreo. Sendo verdade que tem uma boa taxa de cobrança de grandes penalidades (22 disparos certeiros), acaba por ser curioso verificar que no que diz respeito a outros lances de bola parada a estatística está longe de ser esplendorosa, sobrevivendo o livre direto apontado ao Nacional da Madeira como o episódio de exemplar conversão.


Tudo isto, como sempre acontece numa modalidade em que prevalece a força coletiva, deve ser enquadrado no mapa metodológico e/ou estratégico que foi proposto pelos diversos treinadores que o “matador” de olhos azuis conheceu em Portugal, talvez com um parêntesis de exceção sugerido por João Pereira quando foi promovido do Sporting B.

O substituto de Ruben Amorim, nas poucas semanas de trabalho, ainda deu a entender que estava na disposição de elaborar uma movimentação e um comportamento da restante equipa no sentido de potenciar e aperfeiçoar o jogo de cabeça da unidade de referência no ataque. Frederico Varandas depressa voltou com a palavra atrás e João Pereira não permaneceu o suficiente no banco para se poder perceber com clareza até que ponto a estrela nórdica seria capaz de limar uma das maiores carências.

É possível que Rui Borges, depois de ter dado o braço a torcer e voltado ao 3-4-3, também recupere um pouco das ideias de João Pereira e acredite na robotização de Gyokeres, livrando-o de estar tão vinculado e tão dependente do poder demolidor da bota direita. Será um assunto que ficará esclarecido uma vez conhecidos os semifinalistas da Liga das Nações e numa altura em que ficarão a faltar oito jogos para entregar as faixas de campeão.

Viktor vai querer sair desses oito como o melhor nove mundial.

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