Nuno Garcia tinha 18 anos quando foi desafiado a participar numa Jornada Mundial da Juventude (JMJ). Na altura, o evento era-lhe “completamente desconhecido”, mas, com o apoio dos pais, aceitou embarcar numa jornada que o levaria até uma cidade e um país desconhecido: Paris, França.
Na década de 90, quando não se sabia o que viria a ser o Google e as viagens low cost ainda não tinham aproximado as capitais europeias, a JMJ tornava-se uma oportunidade única para Nuno sair da “zona de conforto” e aventurar-se numa “missão em busca de um sentido”.
“Falar em JMJ era algo que tinha tanto de misterioso como de entusiasmante”, afirma.
Passadas mais de duas décadas, Nuno, atualmente com 45 anos, conta como foi a preparação para a JMJ de Paris: desde as rifas que vendeu à porta da igreja para angariar dinheiro, até ao momento em que o Papa João Paulo II passou a “escasso metros”.
Aventura começa “no momento do convite” e era preciso dinheiro
Três jovens da paróquia de Buarcos, na Figueira da Foz, aceitaram o convite de participar na JMJ de Paris, em 1997. Contudo, a preparação da viagem começou um ano antes, tanto espiritual como logisticamente. Uma das questões que os jovens precisavam de “resolver” era a angariação de dinheiro para pagar a viagem. Nuno lembra que cada um dos participantes teve de juntar perto de 100.000 escudos (o que agora seriam atualmente 500 euros)
“Foi preciso trabalhar para angariar 300.000 escudos. Para se ter uma noção, 100.000 escudos correspondiam a cerca de dois salários mínimos nacionais na altura. Não desvalorizando o que significam atualmente 500 euros, à época era uma verdadeira fortuna.”
A tarefa era “complicada”, mas não desmotivou os pequeno grupo. Fizeram “rifas e t-shirts para vender à porta da igreja e do mercado municipal” e apelaram aos empresários locais por patrocinarem esta peregrinação até à capital de França.
“É certo que, com ajuda e sacrifícios de muitos, lá se conseguiu reunir a quantia necessária para participar neste evento”, conta Nuno. “Sem ajuda de toda a comunidade, que se desmultiplicou em esforços, não teria sido possível embarcar nesta peregrinação.”
Começavam assim os preparativos para uma das primeiras aventuras além-fronteiras que Nuno viria a ter. Nos anos 90, as viagens pela Europa não eram tão comuns e o jovem conhecia apenas “uma ou duas cidades de Espanha” – “o suficiente para me gabar a alguns amigos e colegas”. A participação na JMJ de Paris, a mais de 1.600 quilómetros de casa, era “um evento histórico e um motivo suficiente para andar ansioso”.
A viagem, o “nervosismo” e a chegada à “indescritível” cidade de Paris
De mochila feita e com muito “nervosismo”, chegou o tão esperado dia da partida. Na mochila, Nuno levava a sua maquina fotográfica analógica, com um rolo de 24 fotografias, um walkman e algumas baguetes com chouriço, além do saco de cama, do colchão e da roupa que iria precisar.
O pequeno grupo de Buarcos juntou-se a perto de 50 jovens de outras paróquias e comunidades. Na longa viagem de autocarro, a barreira do desconhecimento rapidamente foi ultrapassada e na memória ficaram as “conversas com as raparigas, as guitarradas e cantigas – com muitas notas fora do sítio –, as jogatanas de cartas e as partidas que se faziam a quem estava a dormir profundamente”.
“Lembro-me de ter chegado a Paris e, não sei explicar porquê, parámos no aeroporto. Colocamos todos numa roda, montou-se um altar improvisado e assim se celebrou a eucaristia por um membro da equipa que era padre. Para mim, foi uma verdadeira surpresa.”
A “indescritível” capital francesa estava cada vez mais perto e, para um jovem “que nunca tinha saído da terrinha” a cidade parecia um novo mundo. Os 1,2 milhões de jovens que participaram na edição desse ano da JMJ também contribuíram para o deslumbre.
“Nós andávamos em grupo pelas ruas de Paris e, de vez em quando, reuníamo-nos para cantar e dançar no meio da rua. Foi agradável e revigorante sentir a alegria e a paz que nitidamente transmitíamos a quem ali passavam na sua azafama diária”, conta Nuno Garcia.
O “frio na espinha” ao ver o Papa “a escassos metros”
Um dos momentos mais marcantes para os jovens que participam nas várias JMJ é o encontro com o Papa. Em Paris, a vigília e a missa do envio aconteceram no hipódromo de Longchamp. Nuno recorda a caminhada que percorreram para chegar ao local onde iam decorrer as celebrações, principalmente a alegria partilhada pelos jovens que vinham de todos os cantos do mundo – um sentimento que contagiava a população de Paris.
“Era uma festa, apesar de falarmos línguas diferentes, todos nos entendíamos.”
A multidão que aguardava pelo Papa João Paulo II foi também um momento que impressionou o jovem Nuno. E a chegada do Sumo Pontífice foi um “momento épico”.
“O passar do Papa em procissão causou aquele frio na espinha que só acontece em momentos épicos. O Papa João Paulo II estava ali a uns escassos metros.”
O que Nuno guardou da experiência na JMJ foi a “comunhão e partilha”: “A JMJ permitiu-me conhecer uma realidade completamente diferente, sentir que somos um pequeno grão na areia, mas que a nossa participação foi sinal de alegria para quem falava connosco.”
Passados 26 anos, o evento decorre em Lisboa, de 1 a 6 de agosto. Nuno Garcia vê-se agora na condição de pai, com uma filha de 17 anos - “quase a idade que eu tinha quando fui a Paris”. No entanto, apesar da experiência que o pai viveu em tempos, a jovem optou por não participar na JMJ.