Abusos na Igreja Católica

Abusos na Igreja: houve indemnizações às vítimas noutros países?

A Igreja Católica portuguesa descarta, para já, essa solução. Como reagiram igrejas de outros países?

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Maria Madalena Freire

As denúncias dos abusos sexuais na Igreja em Portugal foram tornadas públicas em fevereiro, após o trabalho da Comissão Independente. Casos abusos sexuais no âmbito religioso que já foram expostos em diversos países, com algumas ações a serem tomadas, como, por exemplo, indemnizações às vítimas.

Em Portugal, o cardeal-patriarca D. Manuel Clemente esclareceu este domingo que as indemnizações seriam "insultuosas para as vítimas".

Neste contexto, esperavam-se algumas medidas por parte da Igreja portuguesa. Porém, na conferência de imprensa da passada sexta-feira, após uma reunião em Fátima para averiguar a resposta às denúncias, as sugestões apresentadas ficaram aquém e, por agora, deixaram apenas o perdão e um futuro memorial na Jornada Mundial da Juventude.

Os casos de abusos sexuais no âmbito religioso não são novidade internacionalmente e, por isso, muitos países já tiveram oportunidade de apresentar diversas soluções para colmatar os danos causados às vítimas. No entanto, as que tiveram mais praticabilidade, até hoje, foram as indemnizações.

Quem, onde, como e porquê?

Apesar da criação de uma comissão do Vaticano para a investigação dos abusos sexuais na Igreja em 2013 , as soluções acabam por ficar muito aquém e não se verifica, de forma transparente, que ações é que a Santa Sé aconselha ou tem tomado perante as milhares de acusações ao longo destes anos. Mas há exceções.

A comissão independente francesa levou dois anos e meio para identificar 300.000 testemunhas menores abusadas e agredidas em instituições da Igreja Católica francesa, entre 1950 e 2020. Havia apenas 22 crimes que ainda não tinham prescrito e que foram alocados às autoridades judiciais.

No entanto, a Igreja francesa também tomou medidas próprias e anunciou um apoio financeiro às vítimas de abusos sexuais contra menores, com bispos a predispor-se a vender os bens das suas dioceses ou a pedir empréstimos para indemnizar as vítimas.

Na sequência das conclusões daquela comissão, foi criada uma Comissão de Reconhecimento e Reparação, que estabeleceu como limite máximo previsto para a indemnização 60 mil euros, valor contestado por algumas das vítimas.

No entanto, até hoje, menos de 1% dos sobreviventes iniciaram um processo de reparação.

Já nos Estados Unidos da América, a Igreja católica norte-americana pagou mais de três mil milhões de dólares (2,8 mil milhões de euros) às vítimas de abusos sexuais.

Uma investigação feita pelo Boston Globe em 2002, que deu início a 500 processos contra dezenas de padres, culminou no pagamento de quase 85 milhões de dólares às vítimas.


Igreja portuguesa não deverá ser francesa

Em fevereiro ficou conhecido o relatório da Comissão Independente, no qual foram identificadas 4.815 vítimas. Desde aí, várias figuras da Igreja e da esfera política têm-se pronunciado em relação aos relatos "chocantes" das vítimas, como descreveu o primeiro-ministro, António Costa.

O cardeal-patriarca de Lisboa refere que as listas entregues pela Comissão com nomes de alegados abusadores não é suficiente para agir e os expulsar da Igreja.

Já Daniel Sampaio, psicólogo que integrava a investigação da Comissão, esclareceu que não era apenas uma lista de nomes, mas testemunhos das vítimas.

D. Manuel Clemente insiste que podem existir nomes, mas não existem factos e que, por isso, há pouco que a Igreja possa fazer.

As sugestões dos partidos

Tanto o PCP, como o Chega já afirmaram que a Igreja Católica pode, e devia, afastar os membros do clérigo suspeitos de abusos sexuais através de uma suspensão preventiva.

"O que se esperava era um bocadinho mais do que simplesmente uma assunção de responsabilidades e um pedido de desculpas e aí, não usaria o termo desrespeitoso, mas acho que ficou-se aquém de onde se deveria ter ido, e poder-se-ia ter ido muito mais longe", defendeu.

Nesse sentido, André Ventura apelou a que a Igreja estude a "aplicação de alguma suspensão preventiva a clérigos ou leigos ou dirigentes de estruturas eclesiais ou religiosos que estejam (...) com indícios fortes" de terem abusado de menores.

Apesar de ressalvar que não é "especialista em direito canónico", Ventura considerou que essa suspensão "seria recomendável" para que os "católicos não sentissem que os padres, os bispos ou os leigos abusadores continuam no ativo, eventualmente até perto de crianças ou outras vítimas".

Ventura instou também a Igreja a "criar alguma fórmula de compensação" das vítimas, argumentando que, em muitos casos, os abusos tiveram repercussões "na sua situação pessoal, material, financeira e social".

"Isso parecer-nos-ia muito, muito importante e parece-nos que foram as duas maiores falhas da conferência de imprensa", defendeu.

O PCP assinalou que "tal como muitos católicos e mesmo padres têm dito, (…), é possível a Igreja Católica, no seu funcionamento, tomar medidas preventivas e administrativas que, até conclusões judiciais e canónicas, permitam retirar os presumíveis abusadores da vida pública e do inevitável alarme social que isso motivaria".

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