Cultura

Sessão de Cinema: “Perto Demais”

Nas relações do cinema com o teatro, Mike Nichols é um nome fulcral na paisagem do moderno cinema americano — neste caso, ele filma uma peça de Patrick Marber, adaptada pelo próprio autor.

Julia Roberts em "Closer / Perto Demais": as palavras do teatro reinventadas pelo cinema

João Lopes

É bem verdade que, neste século XXI, Hollywood privilegiou modelos de aventuras visando, sobretudo, o público juvenil, criando rotinas de produção e de marketing nem sempre exemplares no plano criativo. Mas não é menos verdade que não desapareceram os filmes adultos — à procura de espectadores adultos, precisamente — dirigidos por cineastas que nunca abandonaram os valores clássicos da narrativa. Um bom exemplo, disponível em streaming, poderá ser “Perto Demais” (2004), penúltima realização de Mike Nichols (1931-2014).

Também um notável encenador teatral, Nichols nunca menosprezou a relação do cinema com o teatro — a começar, claro, por “Quem Tem Medo de Virginia Woolf?” (1966), a sua longa-metragem de estreia. “Perto Demais” adapta a peça homónima de Patrick Marber (“Closer”, no original), aliás com argumento escrito pelo próprio dramaturgo. Em cena estão quatro personagens, dois homens e duas mulheres, enredados numa teia de paixões cruzadas e desejos enigmáticos.

O facto de Julia Roberts interpretar uma personagem profissional de fotografia está longe de ser um pormenor secundário. De facto, o ritual de fotografar e ser fotografado envolve um trabalho de observação e revelação que, no labirinto de “Perto Demais”, pode transfigurar a maneira como cada um vê, decifra ou deseja o outro.

Com um rigor aprendido no teatro, ainda que valorizando os recursos específicos do cinema (observe-se a proliferação de intensos grandes planos dos rostos das personagens), Mike Nichols faz um filme genuinamente introspectivo, raro na actual produção “made in USA”. E conta com um elenco que, além de Julia Roberts, inclui Jude Law, Natalie Portman e Clive Owen — são todos magníficos, a provar, afinal, que a presença humana é mais forte do que todas as invenções digitais.

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