Cultura

Película vs. digital: para onde vai o cinema?

Alguns dos mais notáveis trabalhos de direção fotográfica em filmes recentes foram executados através do material clássico, quer dizer, foram rodados em película.

Margot Robbie em "Babylon", um dos filmes de 2022 rodados em película

João Lopes

Eis uma curiosa lista de filmes atualmente em cartaz, disponíveis em sala ou em alguma plataforma de streaming: "Os Fabelmans", o melodrama autobiográfico de Steven Spielberg; "Babylon", evocação de Hollywood no período de advento do som, assinada por Damien Chazelle; "Ruído Branco", a adaptação do romance de Don DeLillo por Noah Baumbach; "Ossos e Tudo", uma fábula sobre canibalismo realizada por Luca Guadagnino; "Nope", o ensaio filosófico de Jordan Peele em registo de filme de terror…

Podemos envolvê-los numa pergunta de algibeira: que há de comum entre estes cinco títulos? Dir-se-ia que a lista é tanto mais interessante quanto nela encontramos, precisamente, propostas profundamente individuais, bem distintas umas das outras… O certo é que os filmes citados partilham uma opção técnica de que pouco se fala. A saber: foram todos rodados em película — e com resultados francamente excecionais.

Quem recorda tal coincidência no seu site oficial é o próprio fabricante das películas utilizadas, ou seja, a Kodak. Aliás, a lista inclui também alguns títulos ainda não estreados ou que, pelo menos, não chegaram às salas portuguesas: é o caso de "Oppenheimer", a nova superprodução de Christopher Nolan, com lançamento mundial agendado para o mês de julho, ou "To Leslie" (cujo trailer se pode ver aqui em baixo), o filme de Michael Morris que valeu uma nomeação a Andrea Riseborough, na categoria de melhor atriz, nos Óscares a atribuir a 12 de março.

Quer isto dizer que, depois do boom dos formatos digitais ter "decretado" o fim da película, a própria indústria e os seus criadores voltaram atrás, fazendo renascer a película? Não exatamente, quando mais não seja porque, na prática, a utilização da película nunca desapareceu. Acima de tudo, podemos deduzir que alguma resistência ao digital formulada por autores de grande peso simbólico e financeiro (penso nos casos de Spielberg ou Martin Scorsese) gerou, finalmente, um novo equilíbrio.

Dito de outro modo: não se trata de escolher entre "película" e "digital", virando uma opção contra a outra. Trata-se, isso sim, de reconhecer o valor da diversidade de alternativas para as imagens cinematográficas — até porque, convém não esquecer, a utilização conjugada de uma coisa e outra passou a ser frequente em muitos filmes, nomeadamente no período de pós-produção.

Ironicamente ou não, registe-se também um dado curioso, porventura intrigante, relativo aos cinco filmes citados no parágrafo inicial: nenhum deles está nomeado na categoria de melhor fotografia. Aliás, em boa verdade, os três últimos nem sequer obtiveram qualquer nomeação da Academia de Hollywood.

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