Da vasta filmografia de Jean-Luc Godard (n. 1930), estamos habituados a destacar títulos como “O Acossado” (1959) ou “Pedro, o Louco” (1965), afinal momentos marcantes na definição e no impacto, quer comercial, quer artístico, da Nova Vaga francesa. Vale a pena, por isso mesmo, conhecermos “Fim de Semana” (original: “Weekend”), produção de 1967, disponível em streaming, muitas vezes apontada como um fim simbólico da própria Nova Vaga.
Porquê? Sobretudo porque “Fim de Semana” é um filme construído a partir de duas componentes radicais: primeiro, uma lógica experimental que, de facto, abriu as linguagens do cinema a novas e fascinantes possibilidades de comunicação; depois, um enorme desencanto moral face aos problemas internos da sociedade francesa da época ou, genericamente, aos valores da chamada “sociedade de consumo” — por alguma razão, o filme passou a ser apontado como um retrato premonitório das convulsões sociais e filosóficas de Maio 68.
No centro dos acontecimentos está um casal interpretado por Jean Yanne e Mireille Darc, na altura muito populares junto dos espectadores franceses. A sua deambulação de “fim de semana” — primeiro familiar, depois através das estradas de França — vai-se transfigurar numa colagem de situações tensas, por vezes violentas, reflectindo um estado das coisas em que os mais básicos valores humanos parecem drasticamente ameaçados. Exemplo célebre dessa visão é a sequência de um dantesco engarrafamento de trânsito…
Historicamente, para Godard, este foi também um filme de “fim de ciclo”, já que, durante alguns anos, o seu trabalho prosseguiria através de alguns títulos de reflexão explicitamente política, a começar por “Le Gai Savoir” (1969), quase sempre produzidos por canais televisivos de vários países europeus. Assim, se “Fim de Semana” encerra a Nova Vaga, é também uma proposta de acção e reflexão à procura de novos modelos de pensar, produzir e difundir o cinema.