O comodismo que cresce juntamente com a evolução da espécie humana, acarreta a suas consequências. Uma delas é a convivência, agora mais que nunca, inevitável, com microplásticos. Estão presentes no ar, na água, na comida e até mesmo dentro de nós, nos nossos pulmões, fígado, intestinos e tecido cerebral. Mas há formas de conseguir evitar o contacto com estas substâncias tóxicas.
Antigamente, a comida do dia anterior era guardada em tabuleiros de barro, em pires de vidro, ou naqueles bonitos conjuntos de cerâmica, para, depois, serem postos numa panela e aquecidos no fogão. Hoje em dia, guardamos geralmente as sobras em caixas de plástico, para depois as reaquecermos nessas mesmas caixas num microondas, que deixam a comida carregada de microplásticos.
No entanto, segundo um novo estudo da Universidade de Ottawa, no Canadá, há maneiras de combater a presença dos microplásticos no dia a dia. Nicholas Fabiano, o principal autor do artigo, disse, de acordo com o The Washington Post, que tendo em conta os estudos recentes, "não sabemos muitas das consequências a longo prazo destes microplásticos, mas temos provas emergentes de que não são certamente benéficos".
O estudo de Fabiano e da sua equipa analisa um outro estudo que concluiu que se pode encontrar cerca de uma colher de sopa de microplásticos somente no cérebro humano e que o tecido cerebral tem tendência a acumular entre sete a 30 vezes mais microplásticos que outros órgãos. Esse estudo, no entanto, foi alvo de duras críticas na comunidade científica, que muitos consideram "alarmista").
Enquanto se espera por mais estudos que esclareçam a influência dos microplásticos no corpo humano, é preocupante a sua crescente prevalência no ambiente nos últimos 50 anos.
De acordo com El País, estima-se que entre 10 e 40 milhões de toneladas de microplásticos sejam libertadas anualmente no ambiente, prevendo-se que este número duplique até 2040.
Assim, evitar a ingestão ou a exposição aos microplásticos parece ser uma tarefa quase impossível. Para ficar contaminado, basta comer quase todos os alimentos comprados no supermercado ou respirar o ar da cidade, onde o desgaste dos pneus dos automóveis liberta partículas para o ambiente que são depois inaladas.
E como podemos evitar os microplásticos? O estudo de Fabiano dá-nos algumas instruções para conseguirmos diminuir ou mesmo evitar o contacto com microplásticos, a nível doméstico.
Beber água da torneira em detrimento da engarrafada
Beber água engarrafada introduz milhares de microplásticos no nosso organismo e, segundo o The Washington Post, Sherri Mason, investigadora da Universidade de Gannon, na Pensilvânia, e especialista em poluição por plásticos, afirma que a água engarrafada é a maior via de exposição aos microplásticos.
Investigadores descobriram que em média, uma garrafa de água de plástico tem 240.000 partículas de plástico, medindo uma fração da largura de um cabelo humano.
"A água engarrafada contém plástico na origem, como tudo o que existe atualmente nos sistemas naturais. Mas colocá-la numa garrafa descartável significa que parte da embalagem se degrada e o plástico que sai passa para o líquido. (...) Com uma alternativa como a água da torneira, que em muitos países passa por mais controlos de qualidade do que a água engarrafada, é uma fonte totalmente evitável de ingestão de plástico. Além disso, as garrafas de utilização única criam um problema de pós-consumo, agravando a poluição ambiental e introduzindo mais partículas de plástico nos alimentos e no ar", explica, ao El País, Eva Jiménez Guri, bióloga da Universidade de Exeter (Reino Unido).
Trocar para água da torneira diminui o risco de ingestão de microplásticos (a água da torneira também contém microplásticos, mas numa quantidade significativamente menor que a água engarrafada em plástico).
No entanto, ferver e filtrar a água pode remover até 90% das partículas de plástico, mas os especialistas alertam para o facto de poder também aumentar a libertação de substâncias químicas tóxicas para a água.
Evitar comida altamente processada
"No geral, se os alimentos forem cozinhados em casa, haverá menos possibilidades para a incorporação de plásticos, porque quanto mais etapas ou cadeias um alimento tiver percorrido, maior é a probabilidade de estar contaminado", diz, ao El País, Eva Jiménez Guri.
Reduzir o consumo de alimentos ultraprocessados, álcool, alimentos enlatados e frutos do mar - especialmente organismos que se alimentam filtrando a água do mar, como ostras, camarões, mexilhões ou amêijoas - também pode ajudar a reduzir a ingestão de microplásticos.
Outro grande alerta do estudo é deixado em relação aos saquinhos de chá. Um estudo demonstrou que os fabricantes de chá estão a incorporar fibras de plástico na produção de saquetas de chá e que a infusão de uma saqueta de chá a 95°C liberta 11,6 mil milhões de microplásticos e 3,1 mil milhões de nanoplásticos numa única chávena.
Segundo o The Washington Post, também devemos estar atentos às especiarias. Um estudo de 2023 descobriu grandes quantidades de microplásticos no sal.
Trocar sempre o plástico pelo vidro
Um outro estudo descobriu que aquecer comida no microondas em recipientes de plástico pode libertar mais de quatro milhões de microplásticos e dois mil milhões de partículas de nanoplásticos apenas em três minutos.
O calor faz com que os microplásticos migrem e sejam transferidos para os alimentos, por isso evite colocar alimentos quentes em embalagens de plástico e certifique-se de que não são armazenados à luz do sol ou noutros ambientes quentes.
Isto pode estender-se ao consumo de café ou de outras bebidas quentes: não beba em copos de plástico ou de papel revestido, como os que são servidos para takeaway em todas as cafetarias.
No resto da cozinha, devem evitar-se utensílios de plástico para a preparação ou manuseamento dos alimentos. O vidro e o alumínio são as melhores alternativas.
No supermercado, também se deve trocar tudo o que vem embalado em plástico por embalagens de vidro, até mesmo as embalagens de alimentos enlatados e de bebidas que também são uma via de contaminação por plástico para os seres humanos. As latas são frequentemente revestidas com plásticos que podem libertar microplásticos e substâncias químicas nocivas.