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TGV: Sónia e o marido começaram a construir casa há 15 dias e agora podem ser expropriados

A população de uma freguesia de Espinho foi surpreendida no fim de semana passado com a notícia de que várias casas teriam de ser expropriadas para a construção da linha TGV.

Bruno Castro Ferreira

Após meses de dúvidas, por causa do traçado da nova linha de alta velocidade ferroviária Porto-Lisboa, há 2 semanas Sónia Gomes e o marido começaram, finalmente, a concretizar o sonho de construir casa própria, em Guedim, Espinho. Não contavam com o que lhes aconteceu no último fim de semana. "Parecia ser um dossiê fechado e 15 dias após o início da obra aparecem uns técnicos com uns topógrafos a dizer que íamos ser expropriados", conta à SIC Sónia Gomes.
A proprietária conta que tem licença de construção da Câmara Municipal de Espinho e lembra que, numa sessão de esclarecimentos, lhe foi dada confirmação de que aquela zona do terreno não seria afetada.
Também o presidente da União de Freguesias de Anta e Guedim estranha o que aconteceu, de tal forma que até pensava tratar-se de "uma burla". "Num domingo à tarde, a surpreender as pessoas e a exigir documentação cadastral da casa", conta à SIC Nuno Almeida.
A empresa em causa é a Luso-Roux - firma que, no site oficial, diz desenvolver "avaliações de imóveis e equipamento para um conjunto alargado de entidades nacionais e internacionais com uma equipa pluridisciplinar com um conjunto de competências e experiência acumulada que lhe permite avaliar todo o tipo de ativos imobiliários". A SIC questionou a empresa sobre o procedimento reportado pelos proprietários - abordados a um domingo à hora de almoço - mas não obteve resposta.
Os proprietários estranham que o projeto da Alta Velocidade ferroviária tenha sido alterado sem que ninguém tenha conhecimento.
"Comparando o traçado anterior com aquele que, à partida, estão a fazer agora, porque é algo que está em execução, há uma propriedade que sai beneficiada: a Quinta da Gata, que foi propriedade da Solverde."
Inicialmente o primeiro traçado ia pelo meio da quinta. Deitava-a mesmo abaixo. Agora passa pelo fundo da quinta", acrescenta o vizinho, Pedro Miguel, que tem uma casa com apenas 3 anos que, segundo o projeto inicialmente aprovado, também estava a salvo da demolição.
"Sim, escapava, a linha [de caminho-de-ferro] passava aqui à frente, mas agora vai pelo meio da casa", explica.
À SIC, o Grupo Violas diz que "a propriedade (Quinta da Gata) não é detida direta nem indiretamente pelo Grupo Violas, pela Solverde, ou qualquer dos seus accionistas". Ao que a SIC apurou, é antes propriedade de um sobrinho do dono do grupo Violas - empresa tão falada nos ultimos dias por causa da avença paga à sociedade fundada por Luís Montenegro.
"Desconhecemos em absoluto", comentou o Ministro das Infraestruturas, Miguel Pinto Luz, em entrevista da SIC Notícias, negando qualquer intervenção no caso. "Reputamos de grave aquilo que a notícia diz... Quando sai, sai associada a um grupo que tem estado nas notícias permanentemente - e todos os portugueses sabem porquê-, e associando isso à decisão que o Ministério ou a Infraestruturas de Portugal tinham tido. Quero deixar claro aos portugueses que não", disse Pinto Luz.
Momentos antes, num comunicado enviado às redações, o Minsitério dizia que "é falso" que o traçado "tenha sofrido alterações".
"O concurso para esta fase da Linha de Alta Velocidade foi publicado a 15 de janeiro de 2024 pelo anterior Governo, tendo então a tutela da área das Infraestruturas o Primeiro-Ministro António Costa", dizia o Ministério.
“No concurso, lançado aquando do Governo liderado pelo Primeiro-Ministro António Costa, define-se uma faixa de variação de traçado de 400 metros dentro da qual o concessionário do concurso poderá, em sede de projeto de execução, otimizar o traçado final.”
Contactada pela SIC, a Infraestruturas de Portugal - responsável pela Alta Velocidade ferroviária - confirma o que diz o Governo. A IP esclarece que o "Título Único Ambiental (TUA) e Declaração de Impacte Ambiental (DIA) favorável condicionada" do troço Porto (Campanhã) - Oiã se aplicam a uma "solução de traçado cujo eixo se encontra centrado num corredor de 400 m de largura dentro do qual a mesma é válida".
Ou seja, é o concessionário quem decide "o traçado final da linha de alta velocidade" dentro desse raio de 400 metros. Uma vez escolhido o traçado final, a concessionária só pode avançar com parecer positivo da Agência Portuguesa do Ambiente. "O processo de expropriação só decorre após esta fase", esclarece a IP.
Já o concessionário LUSOLAV (consórcio constituído pela Mota-Engil / Teixeira Duarte / Alves Ribeiro / Casais / Conduril e Gabriel Couto) esclareceu à SIC que "o traçado se encontra em fase de desenvolvimento de projeto, e dessa forma não definitivo" e que é "prematuro e extemporâneo falar de expropriações".
Para o grupo de empresas "não existe à data qualquer afetação de terrenos e habitações fora do corredor ambientalmente aprovado" - ou seja, as alterações ao traçado estão dentro do raio de 400 metros.
"O projeto, que está em desenvolvimento e que obriga à presença de técnicos no terreno, procura otimizar a construção e exploração da via, tendo para tal sido iniciados os primeiros levantamentos de cadastro no terreno que integrará o futuro projeto de execução e que constituirá a base para as expropriações que, com alguma probabilidade, se desenvolverão no final do ano de 2025, início de 2026. A informação do cadastro, que inclui a identificação das parcelas e dos seus proprietários não está terminada, prevendo-se que a solução final de projeto seja apresentada a consulta publica no final de Agosto – início de Setembro deste ano"
O caso precisa ainda de ser esclarecido já que um dos imóveis afetados está, neste momento, em construção - o que não seria permitido se estivesse dentro do corredor ferroviário aprovado condicionalmente pela Agência Portuguesa do Ambiente. As medidas preventivas aprovadas em Conselho de Minsistros em 2023 indicam claramente que "todas as operações urbanísticas (...) estão sujeitas a parecer prévio e vinculativo da Infraestruturas de Portugal, S. A.".
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