O julgamento da morte da cantora Sara Carreira arrancou esta semana com três pessoas acusadas de homicídio por negligência. A família diz que está desiludida com o que tem ouvido em tribunal. Fala em mentiras e questiona as alegadas faltas de memória de alguns arguidos.
Há quase três anos que a família Carreira procura respostas que certamente esperava encontrar no decorrer do julgamento.
Paulo Sá e Cunha, advogado, explica, em entrevista à SIC, que normalmente os condutores que sofrem acidentes graves têm “uma grande dificuldade de se recordar com precisão daquilo que aconteceu”, no entanto ressalva que “a falta de memória nos processos criminais muitas vezes é conveniente para as pessoas não responderem a perguntas difíceis”.
Pelo menos, dois dos quatro arguidos alegam não se recordarem de tudo o que aconteceu com exatidão. O psicólogo clínico e forense Mauro Paulino explica à SIC que esta falta de memória "já devera ter existido na altura" e acrescenta que esta pode ser apenas “uma estratégia jurídica”.
Pai e mãe de Sara Carreira não faltaram ainda a uma sessão e as descrições ouvidas e as imagens mostradas em tribunal
fazem com que tenham de reviver tudo, algo que para Mauro Paulino é “difícil” de enfrentar.
A justiça tem a difícil tarefa de perceber ao pormenor todos os passos do acidente. As circunstâncias em que aconteceu e, sobretudo, se houve violação de deveres por parte dos condutores.
Dos quatro condutores envolvidos no acidente mortal, três estão acusados de homicídio por negligência: Paulo Neves, Cristina Branco e Ivo Lucas. Há dois que têm a agravante de ser na forma grosseira.
Como tudo aconteceu
No final da tarde de 5 de dezembro de 2020 já era noite e havia períodos de chuva fraca. O arguido Paulo Neves estava na A1 em direção a Lisboa e tinha excesso de álcool no sangue, seguindo a cerca de 30 quilómetros por hora.
Na mesma via surgiu Cristina Branco a mais de 110. Não se terá apercebido do carro de Paulo Neves e embateu violentamente. O carro só parou na via do meio, virado para o sentido contrário. Conta que a única preocupação foi sair com a filha menor e resguardar-se.
Nos 10 minutos seguintes, quase uma dezena de carros passaram pelo local do acidente até que o de Sara Carreira, que tinha Ivo Lucas ao volante, não conseguiu evitar e colidiu com o carro da fadista. Iria a cerca de 130 quilómetros por hora, capotou e só parou 96 metros à frente.
Minutos depois, Tiago Pacheco, alegadamente a uma velocidade superior a 120 quilómetros por hora, bateu no carro de Sara Carreira e só parou passados 100 metros.
"Dificilmente a palavra do condutor se vai sobrepor ao que dizem os peritos”
Além das alegadas faltas de memória, têm surgido no julgamento discordâncias entre o que diz o Ministério Público e os condutores sobre as velocidades dos carros.
“Se há um relatório pericial que diz que a velocidade era X ou Y, muito dificilmente a palavra do condutor se vai sobrepor ao que dizem os peritos”, refere Paulo Sá e Cunha.
Sara com 21 anos estava no início de carreira, tinha acabado de editar o primeiro disco. Rodeada por uma família de artistas e com o namorado Ivo Lucas, igualmente figura pública, sabia bem o que era estar na esfera mediática.
O advogado Paulo Sá e Cunha diz que quanto mais mediatizado um caso é, “maior é o risco de quem está a decidir ser pressionado pela opinião pública”.
Desiludidos com o que têm ouvido, a família terá de esperar agora quase um mês para regressar ao tribunal. A audição de testemunhas foi interrompida porque faltam os relatórios sociais dos arguidos. Retomam as sessões a 24 de novembro.