Nas zonas do interior e rurais é mais difícil atrair profissionais em número suficiente e com o perfil adequado, a que acrescem baixas densidades populacionais. É por haver menos profissionais e poucos utentes que se explica a maior dificuldade em manter a qualidade dos cuidados. Em Portugal, esta discussão tem sido mais visível no caso das maternidades e urgências obstétricas, mas a questão põe-se em todas as valências de cuidados.
Embora este problema não seja recente e atravesse a generalidade dos países, a influência da geografia na pior saúde da população e em piores indicadores de acesso, integração e segurança dos cuidados parece não suscitar o devido interesse. Por isso, importa reavivar a pergunta: a qualidade dos cuidados de saúde piora em espaços rurais face a espaços urbanos?
Não sendo possível dar uma resposta-padrão, é olhando para as doenças crónicas que se consegue ensaiar a melhor resposta. Das doenças crónicas, a demência é dos melhores exemplos, porque requer um acompanhamento clínico entre várias especialidades e entre cuidados primários, hospitalares e continuados. Também porque as consultas, episódios de urgências e internamentos são superiores face a outras doenças.
Os resultados de um estudo internacional recente mostram que existem mesmo importantes diferenças entre espaços rurais e urbanos no que à saúde das pessoas com demência diz respeito.
A mortalidade é mais alta em espaço rural. Mais desfechos fatídicos são explicáveis porque o acesso a consultas médicas é menor e porque há mais hospitalizações. Logo, a evidência aponta para o pior acompanhamento clínico e mais casos de descompensação da doença. O pior acompanhamento clínico e menor integração de cuidados traduzem-se ainda na menor utilização de cuidados continuados e no maior consumo de antipsicóticos.
Os vários países incluídos no estudo, entre os quais EUA, Canada, Escócia, Irlanda, China, Austrália, Suécia, México, Índia, Alemanha e Itália, não são comparáveis ao nível da riqueza, dimensão, modelo de governação e características dos sistemas de saúde. Significa que o facto daqueles resultados terem sido encontrados em realidades tão diferentes permite a dedução lógica de que algo semelhante aconteça noutros países.
Será o caso de Portugal. Que se saiba, não existem análises semelhantes para a população portuguesa. Contudo, a influência da geografia nos resultados de saúde tem sido bem estudada no país.
Por isso, mesmo que faltem dados concretos sobre a demência, os decisores políticos e as autoridades de saúde não precisam de mais evidência para encarar a geografia como um importante determinante de saúde pública.
O que salta à vista deste estudo da demência é que a pior qualidade de cuidados no interior tem muito a ver com a falta de profissionais, mas que além disso deve haver maior disponibilidade e melhor articulação entre cuidados primários, hospitalares e continuados.
É certo que o Ministério da Saúde e a Direção Executiva do SNS elegeram estas duas áreas como prioritárias. É aí que se insere a atração de médicos para o interior e o alargamento das unidades locais de saúde.
Olhar para cada uma destas medidas requer uma profundidade a ser explorada noutros textos. Para já fica a nota positiva de que a atenção política elegeu como prioridade a procura de esbater as iniquidades geográficas que definem cidadãos de 1ª e de 2ª.