Opinião

Como Portugal se comparou em 2022 (parte I): resposta à Covid-19

Opinião de Tiago Correia, comentador SIC e professor de Saúde Internacional.

PATRICIA DE MELO MOREIRA

Tiago Correia

A questão não é se, mas quando surgirá a próxima emergência de saúde pública. Por isso, passada a fase mais crítica da gestão da Covid-19, o tempo tanto é de não ter medo como de não esquecer. Há que avaliar o que correu bem, mal e porquê para garantir a melhor defesa da população, das instituições de saúde, da economia e dos profissionais que trabalham na linha da frente.

Sabia-se – e a pandemia isso mostrou – que a resposta às emergências prepara-se nos momentos de acalmia. Se alterações no financiamento, na organização e na gestão dos cuidados de saúde não forem implementadas, então é legítimo cobrar essa inação dos decisores. É visível um caminho que está a ser feito em Portugal – sendo a Direção Executiva do Serviço Nacional de Saúde (SNS) o melhor exemplo – mas nada está consolidado. Tampouco consegue-se perceber até que ponto mudanças serão sentidas no dia-a-dia dos serviços de saúde.

Toda a informação não é demais para perceber as áreas em que Portugal esteve melhor e pior no combate à Covid-19. Espera-se que esse exercício esteja a ser feito nos vários organismos do Ministério da Saúde.

Foi lançado o relatório Health at Glance de 2022 assinado pela OCDE, porventura o instrumento de comparação internacional em saúde mais conceituado e abrangente. As muitas limitações metodológicas devem trazer prudência para a interpretação literal dos resultados, ainda assim é possível identificar tendências que ajudam no exercício de avaliar os pontos fortes e fracos da resposta portuguesa à pandemia.

Uma situação disruptiva como a Covid-19 não se coaduna com leituras de 8 ou 80. À exceção dos EUA, Brasil, Inglaterra (numa primeira fase) e China (na fase atual), as respostas dos países tiveram altos e baixos, mas dentro dos limites democráticos e do que a ciência conseguia responder.

Por isso, quem disser que Portugal esteve mal na gestão da pandemia olha para a parte que mais lhe interessa, tanto quanto quem disser que Portugal esteve bem.

Comparando com os demais países, os melhores e piores aspetos da resposta portuguesa à Covid-19 referidos neste relatório são:

Aspetos positivos

· Campanhas direcionadas aos jovens sobre a importância da vacinação e do cumprimento de medidas de prevenção (ex: utilização da máscara), independentemente do enorme atraso com que se percebeu esta necessidade.

· Implementação e/ou reforço de apoio psicossocial nas escolas e para a população através de linhas telefónicas.

· Programas de alimentação das crianças e famílias em situação de vulnerabilidade.

· Aumento da disponibilidade de teleconsultas.

· Partilha de competências entre profissionais de saúde. Por exemplo, a possibilidade de os farmacêuticos renovarem prescrições médicas e administrarem vacinas. Este exemplo é importante porque mostra: o quanto é possível explorar tais soluções para outras funções e envolvendo outros grupos profissionais. Trata-se duma reivindicação antiga e exposta a enorme contestação corporativa.

· Serviços dedicados à monitorização e acompanhamento de doentes com Covid de longa duração.

· Recuperação de cirurgias programadas. Se o indicador por si só é positivo, há que saber as condições para os profissionais e os efeitos daqui em diante para a motivação e capacidade dos profissionais responderem às pressões que se esperam no inverno.

· Elevados níveis de vacinação.

Aspetos negativos

· Baixo nível de atividade física das crianças e jovens e agravamento significativo do sedentarismo. Este problema deve ser interpretado como fator de risco para a saúde das crianças e jovens e como sinal da baixa literacia em saúde, cuja resolução exige o envolvimento do SNS, dos pais e da comunidade escolar.

· Disrupções no funcionamento dos serviços de saúde para assegurar a resposta à Covid-19. Os serviços mais afetados foram os de psiquiatria, oncologia e ortopedia. Embora todos os países tenham suspendido e/ou reestruturado atividades clínicas, houve variações na demora (sinal da maior ou menor preparação dos serviços de saúde) e nos efeitos para a saúde da população (sinal do perfil social, demográfico e epidemiológico da população portuguesa).

· Elevado impacto da pandemia no agravamento das doenças cardíacas.

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