Olhares pelo Mundo

Ingredientes essenciais para a vida na Terra descobertos no asteroide Bennu

Dois estudos recentes confirmam a presença de minerais e aminoácidos essenciais, reforçando a ideia de que os ingredientes fundamentais para existência de vida podem ter vindo do espaço.

Catarina Solano de Almeida

Ana Isabel Pinto

Mais de um ano depois de chegarem à Terra, as amostras do asteroide Bennu começam a desvendar mistérios sobre a origem da vida. Dois estudos recentes confirmam a presença de minerais e aminoácidos essenciais, reforçando a ideia de que os ingredientes fundamentais da vida podem ter vindo do espaço.

A missão Osiris-Rex, lançada pela NASA em 2016, chegou a Bennu em outubro de 2020, a 300 milhões de quilómetros da Terra. Recolheu cerca de 120 gramas de poeira e fragmentos de rocha, material conhecido como rególito, que foi transportado para a Terra numa cápsula hermeticamente selada.

Ao fim de uma jornada de sete anos, a primeira e maior amostra de asteroide recolhida no espaço chegou à Terra em setembro de 2023, aterrando no deserto do Utah.

Pouco depois da chegada, uma análise preliminar confirmou a presença de“cristais de água e carbono, dois dos elementos que estão na origem da vida”, anunciou na altura o administrador da NASA Bill Nelson.

Mas agora, estudos mais detalhados revelam ainda mais surpresas.

1.º estudo: materiais orgânicos extraterrestres

Um estudo publicado na Nature Astronomy, liderado pelos cientistas Daniel Glavin e Jason Dworkin, revelou que as amostras de Bennu contêm uma mistura diversificada de compostos orgânicos. Os cientistas identificaram todas as cinco bases que compõem o ADN e o ARN, bem como 14 dos 20 aminoácidos essenciais para a vida na Terra.

Mais surpreendente ainda foi a descoberta de aminoácidos raros ou inexistentes no nosso planeta, juntamente com milhares de compostos à base de azoto. Para os cientistas, isto valida a hipótese de que a química orgânica fundamental pode ter tido origem no espaço e ter sido transportada para a Terra por meteoritos e asteroides.

Esta teoria não exclui a possibilidade de a vida ter surgido nos oceanos primitivos da Terra, mas sugere que o espaço teve um papel na sua formação.

2.º estudo: a origem de Bennu e o papel da água

O segundo estudo, publicado na Nature, que reuniu vários laboratórios internacionais, focou-se na origem de Bennu e nos minerais encontrados nas amostras.

Os investigadores acreditam que Bennu se formou há menos de 65 milhões de anos, a partir dos restos de um asteroide muito maior, cuja história remonta aos primórdios do sistema solar, há 4,5 mil milhões de anos.

As análises mostram que as amostras contêm sais minerais - compostos inorgânicos também essenciais à vida - nunca antes observados em meteoritos ou asteroides estudados na Terra. Estes compostos terão surgido da evaporação de água salgada existente no asteroide progenitor de Bennu.

“Sabemos agora que os ingredientes primordiais para a vida se combinaram de formas interessantes e complexas dentro do progenitor de Bennu”, disse Tim McCoy, curador da coleção mineral do Museu Nacional de História Natural dos EUA e primeiro autor do estudo, citado pela sua instituição.

Num artigo que acompanha o trabalho publicado na Nature, o professor Yasuhito Sekine, do Instituto de Ciência de Tóquio, sublinha que esta água poderá ter facilitado reações químicas capazes de gerar moléculas biológicas,essenciais para o aparecimento da vida.

O processo seria semelhante ao que acontece em lagos salgados secos na Terra onde se formam crostas de sal - salmouras -, como o Lago Searles, na Califórnia, cujos minerais são idênticos aos identificados em Bennu.

Salmouras e possíveis habitats para a vida no sistema solar

A descoberta de salmouras em Bennu reforça a ideia de que ambientes semelhantes podem existir noutros locais do Sistema Solar. Sabe-se que luas como Encélado (de Saturno) e o planeta anão Ceres possuem reservatórios salgados.

Estes são agora considerados locais prioritários para futuras missões espaciais, pois podem ter condições favoráveis à vida, segundo os autores do estudo.

Os cientistas destacam que a preservação das amostras de Bennu em atmosfera de azoto foi essencial para manter a integridade dos compostos voláteis. Isto permite análises mais precisas e pode abrir caminho para novas descobertas sobre a origem da vida, tanto na Terra como noutros mundos.

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