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Eleições em 2024: quase metade da população mundial vai a votos este ano

A Finlândia é o país que hoje vai a votos entre os 76 onde este ano decorrem eleições. Escrutínios vividos num cenário de duas guerras de grande impacto internacional, do risco de recessões económicas, de uma preocupante subida da extrema-direita em vários Estados, da desinformação e manipulação.

Catarina Solano de Almeida

Quase metade da população mundial – cerca de 49%, segundo os cálculos da AFP – vai a votos em 2024. Um ato de democracia que, paradoxalmente, enfrenta diversas ameaças: o crescimento da extrema-direita, a desinformação, a manipulação ligada à inteligência artificial, um declínio geral dos direitos cívicos, guerras, recessão económica.

Riscos mais ou menos significativos dependendo do país a que acresce um contexto internacional conturbado, com a guerra Rússia-Ucrânia, o confronto entre o Hamas e Israel, o alastramento deste conflito na região, mas também de risco de recessões económicas e de uma crescente tensão migratória.

Ato de democracia por excelência, as eleições deste ano de 2024 serão vividas sob o espetro de um declínio geral dos direitos cívicos. Segundo o último relatório de 2023 do Instituto para a Democracia e Assistência Eleitoral, sedeado em Estocolmo, a democracia enfrenta sérias ameaçadas em todo o mundo que passam pela integridade dos processos eleitorais, a independência do poder judicial, a segurança, a liberdade de expressão e de reunião.

Das eleições agendadas em 76 países, em que cerca de 30 nomearão o seu Presidente, enquanto em 20 estão previstas eleições legislativas, já decorreram as de Taiwan - o candidato pró-independência William Lai Ching-te venceu -, seguem-se agora as da Finlândia.

Entre as mais importantes contam-se as seguintes:

Estados Unidos: um provável déjà vu

No dia 5 de novembro, dezenas de milhões de norte-americanos vão às urnas para designar os “delegados”, aqueles que vão escolher o candidato do partido à Casa Branca.

A 60.ª eleição presidencial dos EUA poderá ser um déjà vu, já que se espera um novo confronto entre o Presidente democrata cessante, Joe Biden, de 81 anos, e o seu antecessor republicano, Donald Trump, atualmente com 77 anos.

Trump deu um passo gigantesco em direção à indicação republicana, com uma vitória esmagadora nas primárias de Iowa em 15 de janeiro.

Esta previsível luta de veteranos - ainda falta saber, nas primárias, se serão estes dois a representar os partidos Democrata e Republicano - acontecerá depois das polémicas sobre informações falsas em torno das eleições presidenciais de 2020. Trump nunca admitiu a sua derrota e muitos norte-americanos acreditam que o voto lhes foi “roubado”.

Rússia: oposição amordaçada

As Presidenciais russas estão marcadas para março, mas o resultado é já previsível. O atual Presidente russo, Vladimir Putin, anunciou a 8 de dezembro a sua recandidatura, a quinta vez que se candidata.

Putin, que tem 71 anos, dirige a Rússia há quase 24 anos. Em 2020 alterou a Constituição para poder recandidatar-se, o que, teoricamente, o autoriza a permanecer no poder até 2036, ultrapassando Joseph Estaline em termos de longevidade no Kremlin.

Estas serão as primeiras eleições a nível federal desde que a Rússia iniciou a guerra na Ucrânia, em fevereiro de 2022, mas, apesar de os partidos terem apresentado pelo menos mais oito candidatos, ninguém espera que algum seja um adversário de facto de Putin.

Nos últimos anos, o Kremlin adotou uma política de repressão da oposição e da sociedade civil russas: os principais opositores políticos estão exilados ou presos, como Alexei Navalny, o inimigo número um do Kremlin, recentemente transferido para uma colónia remota Penitenciária do Ártico; outros morreram, alguns em circunstâncias suspeitas.

Ucrânia: eleições previstas não deverão realizar-se

A Ucrânia é precisamente um dos países onde, segundo o calendário eleitoral, deveria ser eleito um novo chefe de Estado em 2024, mas é pouco provável que sejam marcadas eleições.

O mandato do Presidente Volodymyr Zelensky termina a 31 de março, mas enquanto estiver em vigor a lei marcial, devido à guerra com a Rússia, os eleitores não serão chamados às urnas.

Índia: quase mil milhões de eleitores

Cerca de 945 milhões de indianos serão chamados às urnas entre abril e maio para as eleições gerais deste país que em 2023 se tornou o mais populoso do mundo em 2023, ultrapassando a China.

O BJP, o partido do primeiro-ministro Narendra Modi, no poder desde 2014, é tido como vencedor, com larga margem nas sondagens, já que o seu nacionalismo atrai a maioria hindu da população.

Esta eleição vai acontecer num contexto de regressão dos direitos políticos e das liberdades civis, segundo a organização não-governamental (ONG) Freedom House.

Liderado por Rahul Gandhi, o Partido do Congresso, outrora força dominante mas agora muito enfraquecida, tentou formar uma grande coligação com diferentes partidos da oposição regional para desafiar Modi.

UE: votação para o Parlamento Europeu e em sete países

Mais de 400 milhões de eleitores de 27 países europeus serão chamados a escolher os 720 eurodeputados que compõem o Parlamento Europeu no entre 6 e 9 de junho, numa gigantesca votação transnacional que irá avaliar o impacto da subida da extrema-direita em vários Estados e será marcada pela questão das migrações.

A eleição vai determinar o rumo da política comunitária, que poderá passar a enfrentar um novo aumento das forças eurocépticas, à semelhança do surpreendente triunfo do partido islamofóbico de extrema-direita PVV nas eleições legislativas dos Países Baixos.

Uma sondagem realizada para a Euractiv mostra que os partidos da direita conseguem criar uma maioria de bloco no Parlamento Europeu.

A votação será também marcada pelo aumento da inflação nos anos mais recentes, que atingiu fortemente a carteira dos europeus.

Sete países europeus terão eleições internas:

- Portugal:

As legislativas vão decorrer a 10 de março e foram antecipadas na sequência da demissão do primeiro-ministro, o socialista António Costa, que considerou não ter condições de continuar a ocupar o cargo após ter conhecimento de que era alvo de uma investigação.

As sondagens mostram uma luta renhida entre PS e PSD (agora aliado ao CDS-PP e ao PPM), mas uma das principais questões do escrutínio será a possível subida da extrema-direita representada pelo Chega.

- Áustria:

As eleições austríacas, que deverão decorrer no outono, estão a causar preocupações em Bruxelas, já que o partido da extrema-direita, o Partido da Liberdade da Áustria (FPÖ), tem vindo a ganhar cada vez mais intenções de voto.

Segundo as últimas sondagens, o partido é atualmente o mais popular, chegando a 30% das intenções de voto. Em 2020, o FPÖ tinha 11%.

- Bélgica:

Realiza as europeias e as federais no mesmo dia, a 9 de junho, e as previsões são difíceis de fazer, já que o país é conhecido pela sua política fraturada e pelos complexos acordos de partilha do poder.

A Bélgica assume a presidência rotativa da União Europeia no primeiro semestre de 2024.

- Finlândia:

O próximo Presidente é eleito a 28 de janeiro, o atual Sauli Niinisto deixa o cargo após dois mandatos de seis anos.

Os principais candidatos são Alexander Stubb, do Partido da Coligação Nacional, no Governo, e Pekka Haavisto do Partido Verde. Concorrem ainda o ex-primeiro-ministro e ministro das Finanças Stubb, o ex-ministro dos Negócios Estrangeiros Haavisto Jussi e Halla-aho, antigo líder do partido nacionalista finlandês e atualmente presidente do parlamento

Uma segunda volta será realizada em 11 de fevereiro se nenhum candidato obtiver mais de 50% dos votos no domingo.

Esta eleição decorre 11 meses depois da primeira-ministra, Sanna Marin, do Partido Social Democrata, ter sido derrotada pelo centro-direita.

Apesar de o partido Coligação Nacional ter conseguido vencer, a margem em relação ao segundo mais votado - o Partido dos Finlandeses, de extrema-direita - foi muito pequena.

- Reino Unido:

O primeiro-ministro britânico, Rishi Sunak, anunciou, na semana passada, que haverá eleições em 2024, mas ainda sem data marcada. Embora se estime que aconteçam entre setembro e novembro, poderão ser antecipadas para o primeiro semestre.

As eleições decorrem depois de um 2023 marcado pelas maiores greves dos últimos 12 anos e com uma controversa lei sobre imigração a provocar debates acalorados.

- Eslováquia:

As presidenciais decorrem em abril, depois de, em outubro, o país ter escolhido o Partido populista Smer-SD para formar novo Governo, liderado por Robert Fico, um defensor da Rússia na guerra contra a Ucrânia.

- Lituânia:

Também tem presidenciais marcadas para 12 de maio, nas quais o atual Presidente, Gitanas Nauseda, é o principal favorito. Nauseda é o chefe de Estado do país desde 2019 e goza de grande popularidade e tem sido um forte apoiante da Ucrânia

A Lituânia declarou independência da União Soviética há mais de 30 anos.

Indonésia: novo Presidente e novo Parlamento

A Indonésia irá realizar eleições gerais em 14 de fevereiro, devendo ser a maior eleição de sempre num único dia, com mais de 200 milhões de eleitores a serem chamados a votar para o parlamento e para a chefia de Estado.

O centro-esquerda PDI-P deverá vencer as eleições legislativas e presidenciais, de acordo com as últimas sondagens.

México: a estreia das mulheres na Presidência

Em junho, uma mulher vai tornar-se pela primeira vez na história do México Presidente da República.

Duas mulheres são favoritas a suceder a Andrés Manuel López Obrador: a ex-presidente da câmara da Cidade do México, Claudia Sheinbaum, do partido do Governo, o Movimento social-democrata de Regeneração Nacional (Morena), que terá de enfrentar a senadora Xochitl Galvez, representante de uma coligação que reúne três partidos de oposição.

Irão: 18 meses após a morte de Mahsa Amini

As eleições legislativas realizam-se a 1 de março, 18 meses após a morte da jovem curda Mahsa Amini.

A morte desta mulher de 22 anos enquanto estava sob custódia policial, depois de ter sido detida por alegadamente estar a usar indevidamente o véu islâmico, desencadeou meses de enormes manifestações contra líderes políticos e religiosos.

O movimento, duramente reprimido com centenas de mortes e milhares de prisões, já foi chamado de 'revolução das mulheres', popularizando-se em todo o mundo e conquistando a solidariedade internacional, nomeadamente através de alguns dos principais prémios do mundo, como o Nobel da Paz ou o Prémio Sakharov.

As eleições anteriores de 2020 foram marcadas pela desqualificação de candidatos reformistas e moderados, praticamente reduzindo a eleição a uma competição entre conservadores e ultraconservadores.

Dez eleições presidenciais em África

Em África estão previstas 19 eleições em 2024, 10 Presidenciais e 9 legislativas: África do Sul, Argélia, Botswana, Burkina Faso, Chade, Comores, Gana, Guiné, Guiné-Bissau, Ilha Maurícia, Mali, Mauritânia, Moçambique, Namíbia, Ruanda, Senegal e Somália.

- Senegal:

Palco de oito golpes de Estado em três anos, as eleições no Senegal, marcadas para 25 de Fevereiro, desenrolam-se sob tensão.

O Presidente Macky Sall, no poder desde 2012, nomeou o seu primeiro-ministro Amadou Ba como candidato do seu partido, uma escolha contestada internamente.

O Conselho Constitucional publicou uma lista provisória de 21 candidatos em meados de janeiro. Do lado da oposição, Ousmane Sonko, terceiro colocado nas eleições presidenciais de 2019, está ausente, como seria de esperar.

Preso desde julho de 2023 por “apelar à insurreição”, este opositor é a figura central num impasse que dura há mais de dois anos com o Estado, que deu origem a vários episódios de violência.

Oito eleições na América Central e Latina

A América Central e Latina terão oito eleições: Venezuela, El Salvador, Nicarágua, Haiti, Guatemala, Panamá, República Dominicana e Uruguai.

Venezuela:

Na Venezuela, mergulhada numa grave crise política e económica que empurrou mais de sete milhões de pessoas para o exílio, o socialista Nicolás Maduro, sucessor de Hugo Chávez (1999-2013), é candidato a um terceiro mandato no segundo semestre de 2024, embora ainda não o tenha confirmado.

A sua reeleição em 2018, considerada quase unanimemente fraudulenta, não foi reconhecida por muitos países, incluindo os Estados Unidos.

Grande parte da oposição, há muito dividida, uniu-se em torno da liberal Maria Corina Machado, apesar da sua inelegibilidade.

Os Estados Unidos, que em Outubro aliviaram durante seis meses o embargo petrolífero à Venezuela, detentora das maiores reservas de ouro negro do mundo, apelam ao levantamento da inelegibilidade dos opositores, incluindo o de Maria Corina Machado.

Taiwan

Taiwan começou o ano com eleições presidenciais a 13 de janeiro, numa altura de crescente tensão entre Taipei e Pequim, que reivindica soberania sobre a ilha.

O candidato pró-independência William Lai Ching-te, considerado pela China como um “sério perigo” venceu as eleições presidenciais com 40,2% dos votos,

Com agências

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