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França processada por recusar repatriar filhos de jihadista retidos na Síria

Um processo judicial inédito.

O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem recebeu esta segunda-feira uma queixa contra o governo francês por se recusar a repatriar os filhos de uma extremista islâmica de origem francesa que continuam retidos na Síria.

Segundo a agência France-Presse, o processo judicial é inédito e volta a levantar a controvérsia sobre o destino das crianças, sendo que neste caso particular os advogados reclamam à França, país de origem da mãe, ajuda social, médica e psicológica, além do repatriamento.

O processo deu entrada hoje no Tribunal Europeu dos Direitos Humanos por iniciativa dos avós de um rapaz de 3 anos e de uma rapariga de 4 anos que vivem com a mãe em "condições sanitárias dramáticas" e "desumanas" no campo de Al-Hol, Curdistão sírio.

"Ao recusar o repatriamento desta mãe e dos dois filhos doentes e feridos e num estado de fraqueza extrema (...), a França está a expô-los de forma consciente e deliberada a situações desumanas e degradantes, violando o artigo 03 da Convenção Europeia dos Direitos Humanos", acusam Marie Dose, Henri Leclerc, Catherine Bauer-Violas e Denis Garreu. Estando as crianças colocadas perante "um risco extremo", os avós das duas crianças pedem que o tribunal considere o caso como "prioritário".

Os advogados de defesa recorrem pela primeira vez a uma outra disposição da Convenção Europeia dos Direitos Humanos ao considerar que "a França viola o paragrafo 02 do artigo 03 do Protocolo número 04 que indica que ninguém pode ser privado de regressar ao território de origem".

Para os advogados, esta disposição consagra "a existência de um direito absoluto da mãe e dos dois filhos de regressarem ao próprio país", neste caso a França.

A mulher e os dois filhos foram feridos na batalha de Baghouz, último reduto do grupo Estado Islâmico na Síria, no passado dia 23 de março, durante um ataque das forças da coligação árabe e curda. Desde março que se encontram no campo de Al-Hol, onde segundo as Nações Unidas estão mais de 73 mil pessoas, entre as quais 12 mil estrangeiros.

Os estrangeiros são maioritariamente familiares dos combatentes do Daesh.

"As epidemias de cólera, tuberculose e de disenteria propagam-se no campo" indicam os advogados das duas crianças sublinhando que a situação sanitária em Al-Hol tem sido denunciada por várias organizações não-governamentais internacionais. As duas crianças "estão expostas à doença, estão subnutridas e sofrem de disenteria. A mãe deles sofre de febre tifoide", disseram os advogados de defesa. A mulher é alvo de um mandado de captura emitido por um juiz francês no quatro da legislação antiterrorista.

De acordo com a defesa, caso se venha a efetuar o repatriamento, a mulher "deseja assumir as responsabilidades penais em França". O Estado francês tem "decidido caso a caso".

No dia 15 de março repatriou cinco órfãos que se encontravam na Síria e no dia 27 de março recebeu uma rapariga de três anos cuja mãe foi condenada a prisão perpétua no Iraque. Documentos que foram revelados pelo jornal Libération indicam que as autoridades francesas estabeleceram um plano que prevê o repatriamento global de todos os 'jihadistas' e familiares, mas que até ao momento não foi posto em prática, ao contrário do que fizeram a Rússia ou o Kosovo que repatriaram as crianças e as mães originárias dos respetivos países.

No domingo, após a revelação publicada no Libération, o ministro do Interior francês confirmou que o repatriamento foi estudado como "hipótese", acrescentando que a França não encara o repatriamento coletivo dos jihadistas e familiares.

Lusa

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