Após vários atrasos, o governo do Bangladesh assumiu o compromisso de começar esta quinta-feira (dia 15 de novembro) a repatriação gradual de refugiados rohingyas para Myanmar, a partir de uma lista aprovada com as autoridades de Naypyidaw (capital de Myanmar).
No total, Dacca e Naypyidaw acordaram uma primeira repatriação, de forma gradual, de 2.260 dos 723.000 refugiados que vivem atualmente em acampamentos no Bangladesh.
O ritmo previsto seria de 150 pessoas por dia.Este processo de repatriamento é teoricamente voluntário, mas algumas pessoas têm fugido dos campos de refugiados erguidos em território bangladeshiano, de forma a tentar evitar o regresso a Myanmar, afirmaram líderes comunitários rohingyas em declarações à agência noticiosa francesa France Presse (AFP).
Na segunda-feira, o Alto Comissariado da ONU para os Refugiados (ACNUR) já tinha alertado que as condições necessárias para o início deste repatriamento não estavam reunidas.
O pedido para suspender o processo feito hoje diretamente ao governo de Daca partiu do Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos, que relatou que vários refugiados rohingyas ameaçaram cometer suicídio caso sejam repatriados para Myanmar.
O Alto Comissariado para os Direitos Humanos mencionou mesmo o caso de dois idosos rohingyas do sexo masculino, que vivem em Cox Bazar (distrito do Bangladesh que faz fronteira com a antiga Birmânia), que já tentaram o suicídio.
"Expulsar à força ou repatriar à força refugiados e requerentes de asilo para os seus países de origem constitui uma violação flagrante do princípio jurídico fundamental de não repulsão, que proíbe a repatriação para onde existir uma ameaça de perseguição ou um risco sério para a vida, integridade física ou liberdade dos indivíduos", afirmou a alta comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, a ex-Presidente chilena Michelle Bachelet, citada num comunicado.
Atualmente, o Bangladesh acolhe mais de 700 mil pessoas desta minoria muçulmana.Estes refugiados são oriundos do Estado de Rakhine e fugiram depois de terem sido vítimas de uma campanha de repressão por parte do exército birmanês.
O êxodo dos rohingyas teve início em meados de agosto de 2017, quando foi lançada uma operação militar do exército birmanês contra o movimento rebelde Exército de Salvação do Estado Rohingya devido a ataques da rebelião a postos militares e policiais.
O Estado de Myanmar, de maioria budista, não reconhece esta minoria e impõe múltiplas restrições aos rohingyas, nomeadamente a liberdade de movimentos.
Desde que a nacionalidade birmanesa lhes foi retirada em 1982, os rohingyas têm sido submetidos a muitas restrições: não podem viajar ou casar sem autorização, não têm acesso ao mercado de trabalho, nem aos serviços públicos (escolas e hospitais).
A campanha de repressão do exército birmanês contra esta minoria já foi classificada pela ONU como uma limpeza étnica e como uma das crises humanitárias mais graves do início do século XXI.
No comunicado divulgado hoje, o Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos indicou que continua a receber relatos de "contínuas violações dos direitos dos rohingya que ainda permanecem no norte de Rakhine", denunciando assassínios, desaparecimentos e detenções arbitrárias, bem como restrições generalizadas ao direito de liberdade de movimentos e ao acesso de serviços de saúde e de educação.
Perante tal cenário, Michelle Bachelet pediu às autoridades de Myanmar para criarem condições propícias para o regresso dos refugiados rohingya, nomeadamente para abordarem as "causas profundas" que são testemunhadas em Rakhine, "em particular a discriminação e a perseguição sistemática" de que são alvo os elementos daquela minoria religiosa.