A Rússia suspendeu a sua participação no acordo de exportação de cereais pelo Mar Negro, informou o Kremlin esta segunda-feira, data limite para a renovação do acordo. O anúncio foi feito poucas horas depois de um ataque contra a ponte que liga a Crimeia à Rússia.
"O acordo do Mar Negro termina de facto hoje", disse o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, aos jornalistas acrescentando que "assim que a parte relativa à Rússia for satisfeita, a Rússia regressará imediatamente ao acordo".
O acordo de exportação de cereais expira hoje à meia-noite, 21h00 GMT, 22h00 de Lisboa.
Kremlin garante que decisão não tem a ver com ataque à ponte da Crimeia
Dmitry Peskov garantiu ainda que não há ligação entre a decisão da Rússia de suspender a sua participação no acordo com o ataque à ponte da Crimeia, que esta segunda-feira fez dois mortos e um ferido.
Peskov disse aos repórteres que a posição do Presidente Vladimir Putin sobre o acordo já era conhecida antes do ataque.
A agência estatal russa RIA.cita a porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros russo. Segundo Maria Zakharova, a Rússia comunicou esta manhã a decisão à Turquia, à Ucrânia e à ONU e retomará o acordo quando as suas condições forem cumpridas
Sucessivas renovações do acordo
O acordo, mediado pelas Nações Unidas e pela Turquia em julho passado, permitia que os cereais ucranianos bloqueados pelo conflito Rússia-Ucrânia fossem exportados em segurança através do Mar Negro.
Um acordo separado facilitou a movimentação de alimentos e fertilizantes russos, após as sanções dos países ocidentais. A Rússia e a Ucrânia são grandes fornecedores globais de trigo, cevada, óleo de girassol e outros produtos alimentares.
Há meses que a Rússia dizia as condições para a sua prorrogação não estavam a ser cumpridas e o chefe da diplomacia, Sergei Lavrov, tinha afirmado que o acordo "está morto".
Analistas e dados de exportação mostram que a Rússia tem exportado quantidades recordes de trigo e que os seus fertilizantes também estão a ser exportados.
O acordo de exportação de cereais pelo Mar Negro foi renovado por 60 dias em maio, apesar da resistência de Moscovo. A quantidade de alimentos embarcados e o número de navios que partiam da Ucrânia tem caído nos últimos meses. A Rússia está a ser acusada de limitar a utilização de navios adicionais para a exportação de cereais.
Aumento dos preços e insegurança alimentar
Embora os analistas não esperem mais do que um aumento temporário nos preços dos produtos alimentares, porque países como Rússia e Brasil aumentaram as suas exportações de trigo e milho, a insegurança alimentar está a crescer.
A guerra na Ucrânia elevou os preços dos produtos alimentares a recordes no ano passado e contribuiu para uma crise alimentar global também ligada a outros conflitos, aos efeitos prolongados da pandemia da covid-19, secas e outros fatores climáticos.
Os altos custos dos cereais necessários para alimentos básicos em lugares como Egito, Líbano e Nigéria exacerbaram os desafios económicos e ajudaram a empurrar milhões de pessoas para a pobreza ou insegurança alimentar. As pessoas nos países em desenvolvimento estão a gastar mais dinheiro para se conseguirem alimentar.
As nações mais pobres que dependem de alimentos importados com preços em dólares também estão a gastar mais à medida que as suas moedas enfraquecem e são forçadas também a importar mais devido a questões climáticas. Países como Somália, Quénia, Marrocos e Tunísia estão a lutar contra a seca.
Preço do trigo dos EUA já aumentou
Os contratos futuros do trigo de Chicago subiram acentuadamente logo que se soube da decisão da Rússia.
O contrato de trigo mais ativo da Bolsa de Comércio de Chicago subiu 3,4%, para 6,84 dólares o bushel (36,48 litros) às 9h10 GMT, depois de subir mais de 4%, segundo a agência Reuters.