Guerra Rússia-Ucrânia

Compreender o conflito (XXIX): a forte resposta transatlântica

Artigo de Germano Almeida, comentador SIC.

Germano Almeida

Cinco pontos para percebermos o que está a acontecer no Leste da Europa – e o que pode mudar na vida de todos nós.

1 – EUA E UNIÃO EUROPEIA ANUNCIAM GRANDE ACORDO PARA O GNL

Os EUA e a UE anunciaram um grande acordo sobre gás natural liquefeito, em tentativa de reduzir a dependência da Europa da energia russa. O acordo fará com que os EUA forneçam à União Europeia pelo menos quinze mil milhões de metros cúbicos adicionais do combustível – conhecido como GNL – até ao final do ano. Está aberto o caminho para que, até 2030, a UE não tenha qualquer dependência energética da Rússia. Os 27 já se comprometeram a cortar o uso de gás russo em resposta à invasão russa da Ucrânia, ainda que haja algumas diferenças entre estados-membro na capacidade de responder já a esse corte com o gás russo. A Polónia quer fazer isso já; a Alemanha tentou alternativa com o Catar, antes desta solução com os EUA; países como Rep. Checa ou Bulgária têm dependência quase total do gás vindo de Moscovo. Isso significará aumentar as importações e gerar mais energia renovável. O acordo foi anunciado há pouco, durante a visita do presidente dos EUA, Joe Biden, a Bruxelas. Biden e a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, discutiram a invasão da Ucrânia pela Rússia e ofereceram novo apoio a Kiev. A Rússia é um importante fornecedor de energia da Europa. A guerra na Ucrânia fez disparar os preços da energia para níveis recordes.

2 – BIDEN EM VISITA DE ENORME SIMBOLISMO A CIDADE POLACA PRÓXIMA DA UCRÂNIA

O Presidente dos EUA visitará cidade polaca a menos de 80 quilómetros da fronteira com a Ucrânia. Será um sinal muito significativo, de enorme carga simbólica, da determinação ocidental contra uma invasão russa que se transformou cada vez mais numa guerra de desgaste. O Air Force One, avião presidencial, vai voar para a cidade de Rzeszow, no leste da Polónia — levando o presidente dos EUA a menos de 80 quilómetros do solo ucraniano. Biden receberá também um briefing sobre a terrível situação humanitária na Ucrânia, que viu mais de 3,7 milhões de pessoas deixarem o país – cerca de 2,3 milhões deles foram precisamente para a Polónia. A presença de Joe Biden em solo polaco, para mais em zona tão próxima da fronteira com a Ucrânia, revela assim compromisso total dos EUA na travagem da ameaça russa em espaço NATO e no apoio ao colossal esforço de acolhimento aos refugiados que a Polónia está e terá que fazer.

3 – CRESCEM SUSPEITAS SOBRE PROBLEMAS INTERNOS NO KREMLIN

Anatoly Chubais, o “Pai dos Oligarcas”, abandonou o cargo como representante de Putin e deixou a Rússia. Foi, até agora, a mais alta figura russa a tomar posição contra a guerra. Chubais tem força política própria, foi ministro de Boris Yeltin, teve papel relevante nas privatizações feitas na Rússia na década de 90.

Foi CEO da Rusnano, empresa estatal de capital de risco com investimentos no setor da energia e da biomedicina. Rompeu com Putin por causa da guerra e isso tem muito simbolismo, porque era representante especial de Vladimir Putin junto das organizações internacionais. Isto volta a mostrar, de algum modo, o isolamento político e diplomático do Kremlin desde a criminosa agressão iniciada na Ucrânia a 24 de fevereiro.

Entretanto, ao fim de 12 dias, terminaram as especulações sobre o paradeiro do ministro da Defesa, Sergei Shoigu, um dos ultraleais a Putin. Shoigu reapareceu ontem a conversar, por videoconferência, com o Presidente da Rússia.

4 – RECUO TERRITORIAL RUSSO ATÉ PODE SER ESTRATÉGICO MAS PROVA FALHANÇO DO PLANO DE MOSCOVO

A coluna russa para Kiev passou a estar a 55 kms da capital (já esteve a 25, recuou nos últimos dias). Os militares russos têm passado por muitos problemas logísticos no terreno. Os britânicos garantem que a Ucrânia retomou o controlo de cidades a leste de Kiev. Os bombardeamentos continuam mas a guerra parece estar num momento de impasse. A NATO estima de 7 a 15 mil baixas de militares russos: num mês os russos perderam mais homens na Ucrânia do que os americanos na soma de 20 anos no Afeganistão e 19 anos no Iraque! Putin a perder conselheiros, a ver generais a morrer no terreno.

As forças ucranianas estão a atacar alvos importantes e a afastar o exército russo do centro de Kiev. Estas ações podem vir a condicionar a capacidade das tropas russas em lançar ofensivas militares. Os Estados Unidos estimam que as forças russas estão a registar uma taxa de insucesso de 60% nos mísseis que lançam contra a Ucrânia. Esta elevada taxa pode ajudar a explicar o porquê de a Rússia ainda não ter atingido os “objetivos básicos” da invasão à Ucrânia, como a neutralização da força aérea ucraniana. Nesta taxa de insucesso, podem estar incluídos lançamentos falhados ou mísseis que não explodiram.

De acordo o Pentágono, a Rússia já lançou mais de 1.100 mísseis de todos os tipos desde que a guerra começou. Quantos mais dias passarem sem haver conquistas russas na Ucrânia, mais cresce a ideia de ser improvável que a Rússia se aventure a invadir mais países vizinhos.

5 – O HORROR EM MARIUPOL

De acordo com a autarquia de Mariupol morreram cerca de 300 pessoas no ataque ao teatro da cidade portuária, no passado dia 16. Os números carecem de confirmação e são disputados pelos russos, que garantem não ter havido mortais naquele que foi um dos momentos mais dramáticos desde 24 de fevereiro.

A autarquia de Mariupol diz que há moradores a morrer à fome e pede ajuda urgente. As autoridades ucranianas denunciaram que centenas de milhares de civis estão a ser levados à força para a Rússia.

Cerca de 20 mil pessoas fogem de Boryspil, que fica perto do aeroporto internacional de Kiev, diz o autarca, Volodymyr Borysenko.

O presidente da câmara pediu à população para abandonar a cidade, uma vez que a presença de civis em Boryspil dificultava a ação do exército ucraniano para repelir as tropas russas.

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