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Governo: António Costa não aceita pedido de demissão de Galamba

O primeiro-ministro anunciou aos portugueses, ao início da noite desta terça-feira, que não aceitou o pedido de demissão de João Galamba do cargo de ministro das Infraestruturas. “Trata-se de um gesto nobre” mas que "não posso aceitar”, revelou Costa, apesar de o Presidente Marcelo discordar.

Ana Lemos

Minutos depois de João Galamba anunciar que apresentou a sua demissão ao primeiro-ministro, António Costa fez uma declaração ao país na qual anunciou que “não aceita” o pedido.

A partir de São Bento, o chefe do Governo explicou aos portugueses que apesar de estarmos perante um “incidente de natureza excecional mas que fere a natureza do Governo”, e do “gesto nobre” do ministro João Galamba, que lhe dirigiu “uma carta apresentando o seu pedido de demissão”, não o pode aceitar.

António Costa destacou, porém, que tem “consciência de que a demissão do ministro das Infraestruturas é insistentemente reclamada pela unanimidade dos comentadores e pela generalidade dos agentes políticos".

“Ser membro de um governo é um cargo de elevada responsabilidade e experiência de trabalho que tenho com João Galamba, enquanto secretário de Estado e nos últimos meses como ministro, não me permitem aceitar a sua demissão”, declarou Costa.

Para sustentar a sua decisão, o primeiro-ministro disse que a João Galamba “não lhe é imputável pessoalmente qualquer falha”.

O incidente, que classificou de “lamentável” e “a todos os títulos deplorável” que aconteceu na semana passada no Ministério das Infraestruturas, “é imputável única e exclusivamente a quem tendo sido demitido, agiu violentamente sobre outras pessoas, procurou roubar um equipamento do Estado com documentação classificada, e, naturalmente tendo este facto ocorrido na esfera do Governo”.

Neste sentido, prosseguiu, “cumpre-me a mim, enquanto primeiro-ministro, apresentar as devidas desculpas aos cidadãos”.

“Nem sempre é fácil tomar decisões, seria mais fácil seguir a opinião unânime dos comentadores, aceitar este pedido de demissão, ouvir a generalidade dos agentes políticos, mas entre a facilidade e a minha consciência dou primazia à minha consciência”, concluiu, sublinhando que "esta decisão [de não demitir Galamba] é minha, responsabiliza-me integralmente”

Já em resposta às perguntas dos jornalistas, António Costa revelou que o Presidente da República “discorda” desta sua decisão. Isso mesmo, Marcelo fez constar numa curta nota, partilhada no site da Presidência da República, após a comunicação de António Costa.

“O Presidente da República, que não pode exonerar um membro do Governo sem ser por proposta do Primeiro-Ministro, discorda da posição deste quanto à leitura política dos factos e quanto à percepção deles resultante por parte dos Portugueses, no que respeita ao prestígio das instituições que os regem”, lê-se na nota.


Questionado sobre se teme que, em resposta, o Presidente da República dissolva o Parlamento e convoque eleições legislativas antecipadas, Costa recusou fazer “especulações".

"A estabilidade é um valor maior da atividade institucional. Creio que os portugueses foram muito claros na vontade que manifestaram pela estabilidade”, disse, numa alusão às ultimas eleições legislativas.

Ainda assim, reconheceu que o poder de dissolução da Assembleia da República, nos termos da Constituição, “é exclusivo do senhor Presidente da República – e o Governo cá está para respeitar qualquer decisão que seja do senhor Presidente da República”.

“Da mesma forma” que, rematou Costa, “a competência de propor a nomeação ou exoneração de membros do Governo cabe ao primeiro-ministro”.

Os motivos de Galamba para pedir para sair

Depois de longas horas de impasse entre São Bento e Belém, João Galamba fez chegar, ao início da noite desta terça-feira, um comunicado às redações no qual informa que comunicou o seu “pedido de demissão ao senhor primeiro-ministro”, mas justificando que o faz “no atual quadro de perceção criado na opinião pública”.

Sai do Governo, refere, “em prol da necessária tranquilidade institucional, valores pelos quais sempre pautei o meu comportamento e ação pública enquanto membro do Governo”.

“Numa altura em que o ruído se sobrepõe aos factos, à verdade e à essência da governação, é fulcral reafirmar que esta Área Governativa, que me orgulho de ter liderado, nunca procurou ocultar qualquer facto ou documento”, reitera, vincando “em momento algum ter agido em desconformidade com a lei ou contra o interesse público”.

Mais, refere, “foi, detalhada e publicamente, reconhecido pelo Senhor Primeiro-Ministro”.

Quanto aos factos que apresentou no sábado, em conferência de imprensa, não só os reitera como reafirma que entrou “à Comissão Parlamentar de Inquérito à TAP toda a documentação de que dispunha”.

“Considero que a preservação da dignidade e a imagem das instituições é um bem essencial que importa salvaguardar, tal como a minha dignidade, a da minha família e a das pessoas que comigo trabalharam no Gabinete e que foram nestes últimos dias gravemente afetadas” sublinha João Galamba.

A terminar, ministro demissionário deixa uma palavra de agradecimento ao primeiro-ministro, pela “honra de me ter permitido participar no seu Governo”, mas também ao seu até agora secretário de Estado e ao seu gabinete por “todo o trabalho e dedicação que colocaram ao serviço do interesse público”.

“Por fim, apresento as minhas desculpas à minha Chefe do Gabinete e às minhas assessoras de imprensa que mesmo sob agressão tudo fizeram para proteger os interesses do Estado e que viram, nestes últimos dias e de modo insustentável num Estado de Direito, a sua dignidade afetada”, conclui João Galamba.

O recurso aos Serviços de Informação e Segurança (SIS) depois de Frederico Pinheiro, ex-adjunto do ministro, ter levado um computador do Ministério não caiu bem em Belém, avançou o semanário Expresso. O Presidente da República, que recusou comentar publicamente o caso, conversou por telefone, logo no sábado (dia 29), com António Costa a quem manifestou reservas sobre o que se passou no Ministério das Infraestruturas.

Para Marcelo, esta situação pôs em causa a credibilidade do Estado e, por isso, esperava que João Galamba fosse afastado do cargo. Saliente-se que, numa primeira reação, o próprio primeiro-ministro reconheceu que “o que se passou é inadmissível”, mas o ministro fez o que tinha de fazer: “[João Galamba fez] bem” em “dar o alerta pelo roubo do computador com informação classificada”.

Já esta terça-feira, o Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP) informou que, na sequência das notícias vindas a público no passado dia 18 relativas ao envolvimento do Sistema de Informações e Segurança (SIS) na recuperação de um computador portátil do Estado, pediu “de imediato e por sua própria iniciativa” informações sobre a intervenção do SIS neste caso.

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