O frente a frente, que encerrou o ciclo de 28 nas televisões, arrancou com o ruidoso protesto dos polícias em pano de fundo. Se Pedro Nuno Santos (PS) criticou, Luís Montenegro (AD) optou por uma resposta mais ‘politicamente correta’. A discussão, transmitida em simultâneo pela SIC, RTP e TVI, embarcou depois rumo ao futuro (bem) próximo: o dia 10 de março e uma garantia do socialista.
“O PS, se não ganhar, não apresentará uma moção de rejeição nem viabilizará nenhuma moção de rejeição se houver vitória da AD”, anunciou Pedro Nuno Santos, sem se comprometer da mesma forma com um eventual primeiro Orçamento por, sustentou, ser um “documento não conhecido, e que deverá ter opções contrárias às que defende o PS”.
Menos concreto nas respostas, Luís Montenegro apenas repetiu que irá lutar por uma maioria estável, mas caso não seja esse o cenário, voltou a abrir a porta à Iniciativa Liberal (IL).
As contas do economista (PS) e do jurista (AD)
Os líderes do PS e do PSD divergiram sobre o impacto nas contas públicas da descida de impostos proposta pela AD, com Pedro Nuno Santos a falar num "rombo acumulado de 16,5 mil milhões de euros".
Luís Montenegro contrapôs que o custo da redução fiscal que propõe a Aliança Democrática (que junta PSD, CDS-PP e PPM) será de cinco mil milhões de euros, como está definido no cenário macroeconómico, e questionou a formação de economista de Pedro Nuno Santos, que, por sua vez, o acusou de impreparação para o cargo de primeiro-ministro.
Estas posições foram transmitidas no único frente a frente entre os dois antes das legislativas antecipadas de 10 de março, transmitido em simultâneo por RTP, SIC e TVI, e que decorreu no cineteatro Capitólio, em Lisboa.
"O que o PSD propõe é uma aventura fiscal que merece ser discutida, estamos a falar de um rombo acumulado nas contas de 16,5 mil milhões de euros só em impostos", acusou Pedro Nuno Santos. "Não é verdade: são 3,5 mil milhões de euros em IRS, 1,5 mil milhões em IRC e mais 500 milhões de euros para isentar os prémios de produtividade", contrapôs Montenegro.
O líder socialista considerou que esse total de 5 mil milhões de euros será "em velocidade de cruzeiro", insistindo que a "perda acumulada em quatro anos será de 16,5 mil milhões de euros".
"Devia ter feito as contas, impõe-se a um candidato a primeiro-ministro fazer as contas", criticou Pedro Nuno Santos, acrescentando que depois forneceria as contas ao seu adversário político.
"É economista não é? O efeito da descida do IRS é imputado ao ano em que se verifica", respondeu Montenegro, com o líder do PS a argumentar que "se repete", e o presidente do PSD a negar tal efeito, considerando que Pedro Nuno Santos teria aqui cometido "um deslize maior".
E Passos? “Portanto, virá Sócrates da Ericeira”
A propósito do tema do ensino profissional em Portugal e do facto de cerca de 25% dos alunos não estarem a frequentar escolas públicas, o líder socialista lançou Pedro Passos Coelho para o debate, criticando a atuação do Governo PSD/CDS-PP entre 2011 e 2015: “Não há de ser por acaso que não traz Pedro Passos Coelho à campanha, nem o convidou para a convenção da AD”.
Na resposta, Montenegro disse ser “importante” ter ao lado de cada um dos candidatos os ex-líderes, o socialista concordou, mas o presidente do PSD quis ir mais longe e atacou com… Sócrates: “Portanto, o engenheiro [José] Sócrates virá naturalmente da Ericeira também”. Pedro Nuno Santos não se ficou e lembrou que “já não é militante do PS”.
“Tem vergonha? Tem vergonha?”, insistiu Montenegro, com Pedro Nuno Santos a ripostar: “Não tenho vergonha da história do PS. Quem não convidou Pedro Passos Coelho para a convenção da AD foi o Luís Montenegro, isso foi público”
Mas a questão não se ficou por aqui. “E convidou o engenheiro Sócrates para o seu Congresso?”, questionou Montenegro, com o socialista a esclarecer que “todos os líderes do PS são convidados. O engenheiro José Sócrates já não é militante do PS”. E o social-democrata rematou:
“Não sabia que Pedro Nuno Santos estava com saudades de Pedro Passos Coelho, mas acho bem, acho bem, porque ele representa uma forma governativa muito diferente daquele que é protagonizada pelo doutor Pedro Nuno Santos”.
Educação, Saúde e pensões, os temas quentes
Na questão da educação, o secretário-geral do PS, tal como o presidente do PSD, reiterou a sua posição de recuperar a totalidade do tempo de serviço congelado aos professores. E sobre o problema da falta de docentes procurou responsabilizar o executivo de Pedro Passos Coelho, depois de Luís Montenegro ter elogiado esse período governativo.
Usando a ironia, comentou: "De 2011 a 2015 foi extraordinário, 28 mil professores foram embora, 28 mil professores".
Luís Montenegro contrapôs que no início dos anos escolares, nessa altura, não havia como agora "100 mil alunos sem professor pelo menos a uma disciplina".
"Sabe que hoje, no dia em que estamos a debater, há mais de 30 mil alunos que não têm professor a uma disciplina", apontou, antes de dizer que o seu objetivo é recrutar 35 mil novos e avançar com um plano de recuperarão de aprendizagens e provas de aferição.
De acordo com o presidente do PSD, "25% dos alunos do ensino secundário estão a frequentar escolas privadas", uma estimativa que levou o líder socialista a acusá-lo de fazer "discurso panfletário".
"Parece que [Luís Montenegro] estudava muito, mas não deu para estudar tudo. O que temos nessa cifra de 25% é [10 a 11%] o ensino profissional, que obviamente não tem uma rede pública com dimensão ", argumentou.
No tema das pensões, houve constantes interrupções, com Pedro Nuno Santos a queixar-se de que não conseguia completar as suas intervenções.
Luís Montenegro procurou responsabilizar o Governo de Sócrates pelo congelamento das pensões e de ter assinado o memorando da troika que cortou as pensões. Acusou o atual executivo de António Costa de ter cortado mil milhões de euros no final de 2022, mas, admitiu que repôs a parte do aumento que estava em falta (em termos de cumprimento da fórmula legal de atualização) em abril de 2023.
"Não há nenhum pensionista que tenha perdido pensão, nenhum, um único, um cêntimo Custa-me que insista na mentira", acusou o secretário-geral do PS -- palavras que motivaram um protesto de Luís Montenegro.
O presidente do PSD considerou verdade que, entre 2011 e 2015, "foi pedido um esforço adicional aos pensionistas, em particular àqueles que tinham mais altos rendimentos, o que criou uma ideia de que se tomou essa medida por opção".
"Garanto que todos os anos vai haver uma atualização das pensões de acordo com o critério legal. Nunca farei aquilo que fez o doutor António Costa e o doutor Pedro Nuno Santos", declarou.
Pedro Nuno Santos rejeitou as acusações do líder social-democrata sobre cortes nas pensões durante os executivos de António Costa e reagiu: "Não há nenhum pensionista em casa que se consiga rever nas suas palavras".
"Os pensionistas sabem que durante os últimos anos as pensões subiram, que a lei de atualização das pensões foi sempre respeitada e que houve além disso seis aumentos extraordinários das pensões ao longo destes últimos oito anos. Os pensionistas sabem que quando nós lhes dizemos que vamos aumentar as pensões nós estamos apenas a dizer que vamos fazer aquilo que sempre fizemos. Não pode dizer o mesmo, Luís Montenegro", contra-atacou.
Sobre saúde, o secretário-geral do PS admitiu problemas, mas tentou colar o presidente do PSD a uma tentativa de desnatar o SNS para reforçar o setor privado. Pelo contrário, o presidente do PSD apontou que foi nos governos do PS que foram inaugurados mais 32 hospitais do privado "e zero" do setor público.
Para ilustrar a situação do SNS, que Pedro Nuno Santos reconheceu estar sob pressão, Luís Montenegro referiu que "3,3 milhões de portugueses têm seguro de saúde" e que cerca de um milhão estão no subsistema da ADSE.
"Por preconceito ideológico, o PS quer diabolizar o setor privado", afirmou, numa parte do debate em que defendeu os resultados das parcerias público privadas (PPP). "Não tenho dogmas, mas recuso a solução da AD que é fazer definhar o SNS", ripostou Pedro Nuno Santos.
O que dizer num minuto?
Na parte final do debate, em que cada um teve um minuto, Luís Montenegro (AD) jogou a cartada Alexandra Reis, já Pedro Nuno Santos (PS) apostou no "orgulho" no que foi feito, não esquecendo o lema da campanha.
Contas feitas, o socialista falou cerca de 38 minutos neste debate, menos cerca de um minuto e meio do que o social-democrata, num frente a frente com uma duração de uma hora e 20 minutos.