Ganhar eleições legislativas com maioria absoluta implica sempre o alinhamento de vários fatores. É óbvio que a gestão da pandemia tem que ser incluída como um dos fatores que deram a segunda maioria absoluta ao PS.
Pelo mundo fora temos assistido a diversas eleições em que é nítido o impacto da pandemia nas intenções de voto. A eleição de Biden contra Trump é um bom exemplo disso e veremos o que acontece no Brasil.
Olhando para a campanha e os debates que antecederam estas eleições, há um aspeto que não tem merecido muita atenção. Nos últimos dois anos, vezes sem conta, ouvimos dizer que a pandemia foi o acontecimento das nossas vidas. Ora, como por um passo de mágica, excluindo a troca de argumentos sobre o voto das pessoas em isolamento, a pandemia desapareceu do debate político nos últimos quinze dias. Foi como se nada do que vivemos tivesse acontecido e de repente voltámos aos problemas bem conhecidos da falta de médicos, PPP’s, listas de espera e bravatas ideológicas.
A razão por que a oposição passou ao lado da pandemia é difícil de explicar. Afinal, as vozes críticas fizeram-se ouvir em bom som como se em muitos momentos tivessem a ser tomadas as piores decisões possíveis. Ou as críticas não eram fundamentadas ou a oposição rendeu-se aos sinais que fomos tendo de aprovação dos portugueses ao Governo no seu conjunto, mas também ao primeiro-ministro e à ministra da Saúde.
Não é claro qual dos motivos mais pesou na avaliação positiva dos portugueses à gestão da pandemia pelo Governo: se a ideia de que foi feito tudo o que era possível dadas as circunstâncias ou se as boas decisões eclipsaram as más decisões.
O que é certo é que António Costa entra num grupo restrito de líderes mundiais, entre os quais Angela Merkel e Jacinda Ardern, cuja ação política sai reforçada perante o evento mais disruptivo que vivemos em muitas décadas. Se equacionarmos a circunstância interna do primeiro-ministro carregar seis anos de governação, este feito ganha mais relevância.
A responsabilidade de António Costa na avaliação positiva que os portugueses fazem da pandemia não tem forma de ser ignorada. Primeiro, manteve em funções os governantes da área da saúde, mesmo apesar de momentos muito difíceis na gestão da pandemia. Segundo, colocou muitas dessas pessoas como cabeças-de-lista ou em lugares elegíveis em diversos círculos eleitorais. Foi clara a opção de António Costa por misturar nestas eleições a votação para o parlamento e a ação do seu executivo. Marta Temido e António Lacerda Sales exemplificam isto na perfeição.
Marta Temido voltou a ser cabeça-de-lista por Coimbra, tendo conseguido um resultado superior a 45% dos votos e tendo aumentado o número de deputados eleitos face às eleições de 2019. Isto, quando há poucos meses o PS perdeu Coimbra nas eleições autárquicas (claro que são eleições que não se comparam diretamente). A história recordará Marta Temido como a ministra da saúde que resistiu à pandemia e nem todos os ministros da saúde se podem gabar de terem ficado para a história. António Lacerda Sales, secretário de estado adjunto e da saúde, foi cabeça-de-lista por Leiria, onde o PS também aumentou a votação e obteve mais mandatos.
Não é claro o que o Partido Socialista maioritário e António Costa farão em matéria de saúde. Os sinais virão nos próximos dias.