Em 2018, o ex-padre Anastácio Alves foi alvo de queixas por crimes de abuso sexual de menores. Nessa altura, desapareceu do Funchal, onde era pároco. Passados cinco anos, tentou entregar-se à Procuradoria-Geral da República (PGR) de Lisboa, mas, segundo o Observador, o antigo pároco não chegou a ser recebido pela Justiça.
Chegou à PGR de Lisboa, esta quinta-feira, com o objetivo de ser constituído arguido e notificado da acusação. Depois de várias tentativas, a resposta que recebeu foi que tinha de se dirigir ao tribunal do Funchal.
Em declarações ao Observador, Anastácio Alves confessou ter abusado de menores. Garante agora que quer colaborar com a Justiça: “Estou cá, pode parecer banal mas é sincero, primeiro que tudo para colaborar com a Justiça, para assumir as minhas responsabilidades, e também para ajudar a auxiliar as vítimas.”
Ao chegar à PGR, na rua da Escola Politécnica, o padre Anastácio Alves e a equipa de advogados foram reencaminhados para o Gabinete de Documentação e Direito Comparado, uma vez que, no âmbito do processo, foi acionado o pedido de cooperação internacional. Na altura da acusação, em 2022, a PGR informou, através de comunicado, que tinha sido pedida cooperação internacional a França para localizar o padre, entretanto desaparecido da Madeira.
Ao chegar a esse departamento, foi dito ao pároco que “o pedido de cooperação judiciária era para ser cumprido em França” e, por isso, aquele gabinete “não tinha competências” para tratar do caso, explica ao Observador o advogado Miguel Santos Pereira. A PGR ainda não deu explicações sobre este caso.
Os advogados de Anastácio Alves chegaram a pedir para falar com a Procuradora-Geral da República, Lucília Gago, mas também não tiveram sucesso. Cerca de uma hora depois de terem chegado à PGR, uma funcionária informou-os que, uma vez “analisada a questão”, o pároco teria de se deslocar à Madeira para se entregar, pois é lá o tribunal competente pelo processo.
Depois deste impasse, os advogados deixaram críticas à Justiça: “Fica difícil para um advogado e para o seu constituinte colaborar com a Justiça quando a Justiça não quer colaborar.” A equipa de advogados avança ao Observador que irá entregar um requerimento no Ministério Público do Funchal para que a notificação da acusação possa ser realizada em Lisboa.
Anastácio Alves foi formalmente acusado em 2022, à revelia, por cinco crimes de abuso sexual. Até este momento, o padre não foi constituído arguido no processo e continua em liberdade. Em 2021, o Vaticano aceitou o requerimento para que Anastácio Alves deixasse de ser padre.
Esta segunda-feira, a comissão independente para o Estudo dos Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica divulgou as conclusões dos trabalhos realizados ao longo de 2022. Foram recolhidos centenas de testemunhos de vítimas. Segundo o relatório, que foi entregue à Conferência Episcopal Portuguesa, terá havido “no mínimo” 4.415 vítimas de abusos sexuais na igreja.
Bispo do Funchal saúda decisão de Anastácio Alves de se entregar à Justiça
O bispo do Funchal, D. Nuno Brás, mostrou-se solidarizo com as vítimas do ex-padre Anastácio Alves. Diz que tem que haver tolerância zero, em relação aos abusos sexuais. O antigo pároco do Funchal quis entregar-se na Procuradoria-Geral da República (PGR), mas a intenção não foi atendida.
“O Anastácio Alves – porque de facto já deixou o exercício do sacerdócio – decidiu entregar-se. Só posso saudar a colaboração com a justiça que ele agora manifesta”, disse D. Nuno Brás, em declarações à SIC Notícias.
O bispo sublinhou ainda que a colaboração com a Justiça, sublinhando que estão “sempre dispostos a colaborar”, tal como aconteceu com “a comissão independente”.
“Só posso saudar este ato dele que contribui para o esclarecimento dos factos. Quero acrescentar também que por outro lado não posso deixar de manifestar toda a solidariedade com as eventuais vítimas que ele possa ter abusado.”