Economia

Vaga de preços negativos na eletricidade na Europa leva operadores de mercado a flexibilizar regras

Alguns países europeus confrontaram-se nas últimas semanas com preços negativos no mercado grossista de eletricidade. Para garantir a segurança do sistema elétrico os operadores do mercado decidiram mexer no limite de preço negativo que permite às empresas rever as suas ofertas.

Eletricidade
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Miguel Prado

A Europa tem registado nas últimas semanas uma sucessão de preços negativos em vários mercados grossistas de eletricidade, devido à combinação de temperaturas amenas, um consumo energético moderado e uma abundante produção de eletricidade renovável. E essa onda de preços negativos levou os operadores do mercado a anunciar, esta segunda-feira, uma alteração de regras, que se traduz numa flexibilização dos limites que permitem aos produtores e comercializadores de eletricidade rever as suas ofertas.

Os mercados grossistas de eletricidade na Europa, incluindo o mercado ibérico (Mibel), operam com a contratação da energia para o dia seguinte (o que na Península Ibérica é feito através da plataforma Omie), complementada com um mercado intradiário que permite aos agentes (os produtores de eletricidade, que vendem a sua energia, e os comercializadores e traders, que a adquirem) acertar os volumes previamente fechados, de forma a corrigir alguns desvios entre oferta e procura.

Mas além dessa contratação os mercados de eletricidade na Europa contam também com um mecanismo de correção para a contratação do dia seguinte, mecanismo esse que é ativado sempre que um determinado limite de preço é atingido: se tal acontecer, os agentes do mercado podem retificar as suas ofertas.

Ora, esta segunda-feira a associação europeia de operadores de mercado da eletricidade (denominada NEMO, e que inclui, em representação de Portugal e Espanha, a plataforma Omie) anunciou uma alteração do limite inferior desse mecanismo, de -150 para -500 euros por megawatt hora (MWh). Isso significa que se até agora o segundo leilão podia ser ativado quando houvesse preços negativos de -150 euros por MWh, a partir de agora (mais precisamente a partir de 15 de junho) só haverá a ativação do leilão de correção a partir dos -500 euros por MWh.

O comité NEMO esclarece, em comunicado, que esta alteração se deve, especificamente, a “circunstâncias de mercado” nos Países Baixos, e o objetivo desta flexibilização é “manter a segurança das operações, evitando a ativação dos leilões nos países mais afetados [por preços negativos] numa base regular, que poderia comprometer os recursos operacionais e pôr em perigo o mercado de casamento de ofertas”.

Não é a primeira vez que há alterações nos preços-limite estabelecidos para a ativação dos referidos leilões de correção. Em dezembro do ano passado os operadores do mercado também acordaram aumentar de 1500 para 2400 euros por MWh o limite superior de ativação do mecanismo, o que ocorreu num período em que a Europa ainda enfrentava preços grossistas de eletricidade especialmente elevados.

Agora sucede o inverso, com boa parte do continente europeu a beneficiar de preços grossistas relativamente baixos, e em muitas horas negativos, devido a uma abundância de produção renovável.

Embora o Mibel possa também operar com preços negativos, no mercado de contratação para o dia seguinte eles não têm ocorrido. No entanto, ainda recentemente, em maio, houve vários dias com algumas horas de preço zero. A 14 de maio tanto Portugal como Espanha chegaram a registar horas de preço zero, em que os produtores não receberam pela energia colocada no mercado.

Os preços negativos tendem a ocorrer quando há muito mais oferta do que consumo e os produtores preferem, por um período de tempo limitado, pagar para continuar a injetar a eletricidade na rede, e não terem de desligar as suas centrais e voltar a ligá-las depois.

Os preços do mercado grossista de eletricidade são apenas uma parte dos elementos que contribuem para a fatura paga pelo consumidor final, na qual entram também os encargos com as redes (ou seja, o transporte e distribuição da energia até ao ponto de consumo), outros custos de política energética e os impostos.

Em Portugal os clientes mais expostos ao mercado grossista são os industriais, mas também as famílias com tarifários indexados estão particularmente expostas, já que o que pagam mensalmente na conta de eletricidade depende de forma direta do preço médio do MWh no mercado grossista ao longo do período de faturação.

Muitos comercializadores continuam a privilegiar a contratação de eletricidade por via de contratos futuros, assegurando um preço para uma determinada maturidade (um trimestre ou um ano, por exemplo), o que lhes permite oferecer à sua carteira de clientes um tarifário fixo por esse período. Contudo, mesmo com a contratação no mercado de futuros (que em Portugal e Espanha é operado pela plataforma Omip), esses comercializadores têm, habitualmente, de corrigir os desvios (entre o que contrataram em futuros e o consumo real da sua carteira de clientes) no mercado diário operado pelo Omie.

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