O que leva gente de bem, geralmente inteligente e educada (mas nem sempre) a assumir, anos após ano, época após época, que há uma espécie de cabala montada contra o seu clube, apenas para levar o rival ao sucesso?
Existem várias razões que poderão justificar essas convicções, mas não estou tecnicamente habilitado para as dissecar. Questões de foro psicológico, emocional, social? Sim, se calhar. Isso ou o receio de que factos comprovadamente maus do passado possam repetir-se no presente.
Se tivesse que elencar alguns fatores para determinar essas causas, não fugiria muito destes:
• Parcialidade
Quando as pessoas estão demasiado próximas da sua equipa, quando são adeptos de verdade - daqueles que sofrem intensamente com as derrotas e vibram desmesuradamente com as vitórias - há uma tendência inconsciente para acharem que o árbitro está a ser injusto quando decide contra.
Não é a cabeça que manda, é o coração e essa proximidade, essa paixão exacerbada, impede-os de olhar para cada decisão de forma neutra e imparcial. As pessoas só veem o que conseguem ver e o que conseguem ver é quase sempre a perspetiva que lhes dá mais jeito.
• Emoção
O desporto, com o futebol à cabeça, é uma atividade emocionante. Excessivamente emocionante. Há pessoas que tendem a ficar profundamente frustradas quando o resultado não é o que esperavam.
Quando as decisões não vão no sentido que queriam. É muito fácil permitir que as emoções afetem o discernimento e influenciem a forma como percecionam o trabalho dos outros, em especial dos árbitros. A maior prova disso é a incapacidade de reconhecerem (genuinamente) que são beneficiadas na mesma medida que são prejudicadas.
• Falta de conhecimento técnico
A maioria das pessoas (onde infelizmente se incluem alguns jornalistas, comentadores, jogadores, treinadores, dirigentes e adeptos) não domina totalmente as leis de jogo. Aliás, grande parte delas só sabe o essencial.
A falta de conhecimento técnico é muitas vezes o motivo pela qual discutem situações cuja resposta certa raramente conhecem. E é por causa disso que nem sempre compreendem e respeitam o papel dos árbitros.
O desconhecimento das regras é meio caminho andado para a projeção exacerbada do ruído e para o aumento da confusão, porque baseados na falsa presunção de que os árbitros erram sempre de propósito.
• Conspiração
Em alguns casos, há quem realmente se convença que há uma conspiração dos árbitros - provavelmente juntaram-se todos no início da época, num local secreto e remoto, para desenhar estratégia perversa - no sentido de beneficiar uma equipa em detrimento de outra.
Essa crença pode tomar proporções dantescas, originando insultos, ameaças, intrusão de privacidade e até agressões.
Quando alguém pensa que os outros querem prejudicá-los deliberadamente, são capazes de tudo para evitar que isso aconteça. Pode parecer exagero, mas não é. Em alguns casos, é literalmente assim. Infelizmente.
A verdade é que os árbitros erram porque a sua missão é difícil e porque nem todos são bons no que fazem. Tal como acontece com jogadores, treinadores e restantes atividades, há quem tenha mais capacidade e quem tenha menos. Há quem seja bom e quem não seja.
A ideia de que o erro é ostensivo é ofensiva para quem tem carreira feita, com anos de sacrifício pessoal e familiar ao serviço do seu trabalho.
A única coisa que os árbitros querem é fazer bem o seu trabalho, sem que ninguém os incomode após o apito final. O que desejam é sentir orgulho e esperar que aqueles que o rodeiam sintam-no também. O pior castigo de um árbitro é o "day after" de um jogo mau, porque ele será sempre a maior das vítimas.
A perversão criminosa de entrar em campo para deliberadamente fazer mal a uns ou a outros é tão horrível que não faz sentido nos dias que correm. Todos os árbitros corruptos já teriam sido "apanhados" e todos os desonestos também.