Há notícias sobre os números astronómicos de alguns filmes dos EUA que são algo distraídas ou, pelo menos, francamente incompletas. Não se trata, entenda-se, de uma questão de “verdade” ou “mentira” — acontece que tais números não podem ser separados do contexto global do cinema, da sua produção e difusão.
Assim, alguma imprensa especializada americana (incluindo Variety e The Hollywood Reporter, com acesso privilegiado ao interior da indústria) têm chamado a atenção para o relativo falhanço comercial de dois títulos deste verão: “Indiana Jones e o Marcador do Destino” e “Missão Impossível - Ajuste de Contas, Parte I” (ou, simplificando, “MI7”).
Para um observador menos exigente, tal avaliação poderá até parecer absurda. Afinal de contas, o quinto e final capítulo das aventuras de Indiana Jones já vai nos 375 milhões de dólares de receitas globais (dos quais 173 no mercado norte-americano, EUA e Canadá). E que dizer de “MI7”, com os seus 541 milhões (164 no mercado americano)? Pois bem, são números gigantescos… mas fracos se tivermos em conta os custos de fabricação e promoção desses mesmos filmes. A saber: estamos perante produções cujo orçamento ascendeu, para cada uma delas, a 300 milhões; a esse valor importa acrescentar, no mínimo, mais 100 milhões de despesas de publicidade. Sem esquecer, claro, que os exibidores ficam com uma fatia significativa das receitas.
Na prática, isto significa que, mesmo com 600 milhões de receitas, as entidades produtoras “MI7” não conseguirão mais do que, à tangente, recuperar o dinheiro investido… Daí um curioso imbróglio que estes dados envolvem: mesmo uma estrela planetária como Tom Cruise (talvez mesmo ainda o mais popular actor da actualidade) não é garantia suficiente para a boa rentabilização de um filme de uma série de tanto sucesso como “Missão Impossível”.
“MI7” é uma magnífica proeza espectacular — não é isso que está em causa (convém lembrar que, de um ponto de vista cinéfilo, um filme não é “bom” nem “mau” por causa dos números das bilheteiras). O certo é que, num contexto de inesperado triunfo de dois títulos que não dependem da popularidade dos seus actores nem da renovação das aventuras de super-heróis — estou a pensar, obviamente, em “Barbie” e “Oppenheimer” — a performance comercial de “MI7” surge numa encruzilhada que possui algo de sintomático e revelador, suscitando uma interrogação muito particular: será que o clássico “star system” já não funciona?
A pergunta é tanto mais interessante quanto o desenlace desta mais recente aventura — “Missão Impossível - Ajuste de Contas, Parte II” — tem já lugar marcado na agenda do verão cinematográfico de 2024: estreará no dia 28 de junho [video]. Resta saber também se a ideia de promover em simultâneo dois filmes tão diferentes como “”Oppenheimer” e “Barbie” foi apenas um curioso incidente comercial ou se vai transformar numa nova estratégia de marketing?