Cultura

Algumas memórias de Judy Garland

Opinião de João Lopes.

João Lopes

Judy Garland nasceu há 100 anos — de “O Feiticeiro de Oz” a “Assim Nasce uma Estrela”, a sua história testemunha a idade de ouro de Hollywood.

Os sapatinhos vermelhos que Judy Garland usa em “O Feiticeiro de Oz” integram hoje a colecção de preciosidades expostas no coração de Hollywood, no Museu da Academia. Dirigido por Victor Fleming, esse filme de 1939, além de ser um símbolo universal da sua carreira, ilustra também uma conjuntura especialmente vigorosa dos grandes estúdios da costa Oeste dos EUA — consolidava-se o cinema sonoro e triunfava o esplendor do Technicolor.

Em qualquer caso, essa imagem juvenil de Garland — que se prolonga até ao maravilhoso “Meet Me in St. Louis/Não Há como a Nossa Casa” (1944), de Vincente Minnelli — está longe de ser suficiente para dar conta da riqueza de uma carreira tão invulgar quanto breve. Comemora-se agora o centésimo aniversário do seu nascimento (a 10 de junho de 2022), tendo falecido com apenas 47 anos (a 22 de junho de 1969), devido a uma overdose de barbitúricos.

Talvez se possa considerar que “The Clock/A Hora da Saudade” (1945), melodrama em que contracena com Robert Walker, de novo sob a direcção de Minnelli, define a idade adulta do seu trabalho. Aliás, importa não esquecer que foi com Minnelli, com quem foi casada, que Garland teve alguns dos momentos marcantes do seu trabalho, incluindo “O Pirata dos Meus Sonhos” (1948), com Gene Kelly, uma preciosidade muito esquecida do género musical (sem esquecer também que do casamento com Minnelli nasceu… Liza Minnelli).

Seja como for, é a versão de 1954 de “Assim Nasce uma Estrela”, de George Cukor, que espelha de forma especialmente intensa os seus sofisticados recursos dramáticos: mesmo não sendo uma narrativa auto-biográfica, isso não impediu que a trajectória da personagem interpretada por Garland fosse vistas como um eco paradoxal das convulsões da sua existência privada [trailer].

“O Julgamento de Nuremberga” (1961), de Stanley Kramer, sobre os crimes de guerra dos nazis, e “Uma Criança à Espera” (1963), de John Cassavetes, centrado numa instituição especializada em crianças com problemas de comunicação, são outros dois títulos emblemáticos do talento da actriz. Ver ou rever os seus filmes leva-nos a redescobrir a energia criativa de um tempo em que a produção de Hollywood ainda não estava dominada pelas lógicas financeiras e o marketing dos super-heróis.

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