Cultura

Rappers da Cova da Moura lançam CD com "música de intervenção"

Um ano depois de inaugurarem um estúdio, vários rappers da Cova da Moura (Amadora) lançam agora um álbum de "música de intervenção", uma banda sonora da vida real repleta de indignação, mas também de esperança no futuro.

Um ano depois de inaugurarem um estúdio, vários rappers da Cova da Moura (Amadora) lançam agora um álbum de " música de intervenção ", uma banda sonora da vida real repleta de indignação, mas também de esperança no futuro.



Vítor ou Dom Vá, como é conhecido naquela comunidade de origem maioritariamente cabo-verdiana, pouco tinha experimentado a maioridade quando foi preso.



Ao longo de quatro anos e três meses a " ver o sol aos quadradinhos ", o seu gosto pelo rap fê-lo redescobrir o talento para a música e tornou-se num escape.



" O que mais me fez e faz aguentar e não ficar maluco foi agarrar numa folha e desabafar o que sentia, mesmo agora que estou cá fora é só escrever ", contou à Lusa o MC (mestre de cerimónias), com quase 23 anos e a sentir as dificuldades de integração de um ex-recluso.



Ao sofrimento por que passou na cadeia aliou-se a vontade de alertar outros jovens para " não irem pelo caminho errado " e daí resultou o tema "Mundo Prisional", a primeira faixa do álbum "Kova M - Realidade Nua e Crua", uma compilação em que cerca de uma dezena de artistas da zona cantam rap e hip-hop em português e crioulo.



O disco, que resulta de um processo de formação promovido pela Associação Cultural Moinho da Juventude, foi totalmente gravado num estúdio do bairro, inaugurado há pouco mais de um ano, e pode ser adquirido junto da instituição.



Esta é a primeira vez que Vítor surge numa capa, mas o orgulho não o desvia de um objetivo: " É muito mais do que uma questão de fama, quero transmitir uma mensagem positiva ao maior grupo de pessoas possível ".



" Queremos chegar a todas as comunidades, mesmo a quem só sabe português. Para primeiro trabalho, os jovens sentiram-se mais à vontade com o crioulo, até para as rimas, mas vamos começar com formação de escrita em português ", conta o irmão Heidir Correia, de 27 anos, também músico e animador no Moinho.



Segundo o jovem, que está agora a compor uma música sobre os problemas vividos no Haiti e a trabalhar na formação musical de adolescentes entre 14 e 18 anos, as reações de fora da Cova da Moura têm sido muito positivas.



Certo de que há um grande potencial a nível de hip-hop que " Portugal não está a agarrar muito bem ", Heidir lamenta que os géneros musicais nascidos nas ruas sejam ainda conotados com delinquência e violência.



" É o contrário, queremos criar uma causa responsável com as nossas rimas. Este CD serve para mostrar a quem tinha a certeza e a quem tinha dúvidas de que os jovens são capazes de trabalhar, de fazer acontecer ", defende Celso Lopes ou Kromo di Ghetto, de 27 anos.



Músico autodidata há 13 anos, Kromo encontrou no ano passado o conforto da espiritualidade, introduzindo nas suas letras várias referências ao "homem de Nazaré".



Celso não poupa palavras e ritmo quando relata a discriminação, o sofrimento e as dificuldades sentidos por quem vive num bairro pobre, mas, tal como os colegas, não perde a fé e a esperança em dias melhores, sobretudo por acreditar que os jovens são os principais responsáveis por fazer o seu talento sobressair.



Este texto foi escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico



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