Geração 70

O filho do respeitado comunista “Zé Moedas” que queria “ver o mundo”

Podia ter sido médico mas desmaiava quando via sangue. É engenheiro. Podia ter sido comunista como o pai mas, aos 10 anos, descobriu os discursos de Sá Carneiro. Seguiu um caminho diferente. Hoje, Carlos Moedas é presidente da Câmara de Lisboa pelo PSD. Sobre o futuro, diz: “veremos…”

José Fernandes

Bernardo Ferrão

Mariana Óca Ferreira

Carlos Moedas nasceu em Beja, em 1970. O pai, histórico comunista da terra, era jornalista e foi um dos fundadores do jornal regional “Diário do Alentejo”, a mãe foi costureira.

A família era pobre, vivia num ambiente com “zero privilégios”. Nunca sentiu vergonha ou inveja, mas não esconde: “sempre quis lutar para ter as mesmas condições que os outros”.

“Quando não pagavam ao meu pai porque o jornal não tinha dinheiro, usávamos as notas que a minha mãe guardava num envelope. Às vezes não chegava até ao final do mês”.

A descoberta de Francisco Sá Carneiro

Aos 10 anos descobriu Francisco Sá Carneiro, através das folhas do Diário do Alentejo, e percebeu que não se identificava com os ideais comunistas.

"Os discursos de Sá Carneiro davam-me esperança [num futuro]”.

Formou-se em engenharia mas podia ter sido médico não fosse o acidente de viação a que assistiu perto da sua casa. “Desmaiei logo quando vi sangue”, conta Carlos Moedas.

Na altura ir estudar para Lisboa era caro mas o filho mais novo do respeitado comunista Zé Moedas queria “ver o mundo”.

Depois da licenciatura foi viver para Paris, onde encontrou o primeiro trabalho através de um anúncio publicado no jornal Expresso escrito em francês: “procuramos jovem engenheiro”. Moedas agarrou a oportunidade, para um jovem de 23 anos era um salário “como nunca tinha tido na vida”.

Carlos Moedas é casado e tem três filhos. Também foi em Paris que conheceu a mulher. Céline Abecassis é filha de pai marroquino e mãe tunisina. “A minha família é uma misturada”, afirma enquanto recorda o primeiro encontro com os sogros.

A Europa, a troika e Lisboa

Durante a conversa, intimista, o presidente da Câmara de Lisboa desde 2021 fala ainda da passagem pela Europa como Comissário Europeu, dos momentos “complicados” da Troika e do estado da política marcada pela “incapacidade de combater o populismo”.

O autarca descreve uma Lisboa cheia de “luz”, mas não esquece a Lisboa “sombria” e “pobre”.

“As cidades desenvolveram-se mas existe uma barreira. Quem vive no bairro não consegue frequentar uma universidade da própria cidade”.

Carlos Moedas divide o país em dois momentos: antes dos anos 2000 e depois de 2000. “Antes, na era do cavaquismo, havia esperança. Depois o país estagnou, estamos parados”.

Já foi chamado “ministro da Troika”, mas descreve-se como um presidente da “rua” e um político “livre”.

“Não devo nada a ninguém na política”.

Sobre esses anos, lembra que “o nível de liberdade de um país intervencionado é quase zero” e defende “que deveria haver mais liberdade.”

E o futuro…?

Não se alonga sobre voos mais altos no PSD e no país, aliás, garante que a sua “única ambição é governar a autarquia de Lisboa” mas não confirma se fará mais um mandato. “Veremos…”. “Não vale a pena fazer grandes projectos sobre o futuro”, acrescenta.

E Luís Montenegro? “Está a fazer um trabalho importantíssimo”, responde.


“Geração 70“ é uma conversa solta com os protagonistas de hoje que nasceram na década de 70. A geração que está aos comandos do país ou a caminho. Aqui falamos de expectativas e frustrações. De sonhos concretizados e dos que se perderam.

Um retrato na primeira pessoa sobre a indelével passagem do tempo, uma viagem dos anos 70 até aos nossos dias conduzida por Bernardo Ferrão.


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