O Relatório Anual de Segurança Interna (RASI) referente a 2023 foi entregue esta terça-feira pelo Governo na Assembleia da República. Dos crimes violentos, passando pelos extremismos políticos e pelo aumento da violência entre grupos rivais de jovens, fazemos-lhe um resumo do documento que tem mais de 340 páginas.
Quais foram os crimes violentos que mais subiram?
Extorsão, resistência e coação sobre funcionário, roubo por esticão, rapto, sequestro e roubo na via pública foram os crimes violentos e graves que mais subiram em 2023.
A criminalidade violenta e grave aumentou 5,6%, registando-se 14.022 crimes, mais 741 casos do que em 2022, o valor mais alto desde 2019.
A criminalidade geral aumentou 8,2%.
Segundo o documento, as subidas mais relevantes no capítulo da criminalidade grave e violenta são a extorsão, que apresenta uma subida de 25,8%, para o rapto sequestro e tomada de reféns (+22%), para a resistência e coação sobre funcionário (+13,2%), roubo por esticão (+7,7%) e roubo na via pública (+0,8%).
As maiores descidas verificaram-se no roubo em residência (-15,3%), violação (-4,8%), outros roubos (-4%) e homicídio voluntário consumado (-7,2%).
No âmbito da criminalidade geral, a violência doméstica é o crime que continua a apresentar maiores índices de queixas, apesar de ter registado uma ligeira descida de 0,1% no ano passado.
E onde aumentou mais a criminalidade?
Segundo o RASI, apenas o distrito de Coimbra apresenta uma ligeira diminuição da criminalidade geral, registando-se os maiores aumentos em Faro (+13,5%), Setúbal (+12,9%), Beja (+12,3%) e Leiria (+12,1%).
Olhos postos nos extremismos políticos
Portugal registou em 2023 um agravamento da ameaça ligada aos extremismos políticos, sobretudo de extrema-direita, com a retoma da atividade de organizações neonazis e identitárias.
Após um período de estagnação, as organizações tradicionais e os militantes dos setores neonazi e identitário "retomaram a sua atividade, promovendo ações de rua e outras iniciativas com propósitos propagandísticos".
Este crescimento da extrema-direita, nomeadamente entre as gerações mais jovens, deveu-se, em grande parte, ao "esforço desenvolvido na esfera virtual", que constituiu o "principal veículo de disseminação de propaganda e motor de radicalização", refere o documento.
Já quanto à extrema-esquerda, o documento indica que também o movimento anarquista e autónomo retomou a atividade de rua em 2023, após um período de estagnação, associando-se a manifestações de massa em torno de causas transversais à sociedade portuguesa, como o direito à habitação ou a melhoria das condições de vida.
No entanto, estes movimentos imprimiram um "cunho ideológico anticapitalista", recorrendo a atos de vandalismo e a provocações às forças de segurança que visavam "mobilizar os demais participantes para uma luta contra o sistema".
À semelhança do que se verificou a nível internacional, foi no movimento ambientalista de matriz anticapitalista que se observou uma maior radicalização.
Investigação a imigração ilegal aumentou
Os inquéritos relacionados com crimes de tráfico de pessoas e auxílio à imigração ilegal aumentaram exponencialmente no ano passado, acréscimos em termos percentuais superiores a 150% e de quase 300%, respetivamente.
O relatório nota que o aumento significativo das duas investigações também se relaciona com a reestruturação do Sistema de Segurança Interna e a extinção do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), resultando na transferência de competências para a Polícia Judiciária.
Dos casos de presumível tráfico de pessoas, 84% relacionam-se com exploração laboral, em setores como a silvicultura e a pesca marítima costeira, mas principalmente na agricultura e futebol.
Os distritos com mais casos de presumível exploração foram Braga (futebol), Beja (agricultura) e Bragança (agricultura e silvicultura).
Grande Lisboa: aumenta a violência entre grupos rivais de jovens
O relatório alerta também para o aumento da violência associada a grupos juvenis e jovens motivada por rivalidades entre grupos oriundos de diferentes zonas ou bairros da área metropolitana de Lisboa.
Esta criminalidade aumentou 14,6% em 2023, registando um total de 6.756 ocorrências, o valor mais elevado desde 2014.
"Esses conflitos costumam ser referidos em músicas e videoclips de subculturas musicais que apresentam referências hiperlocais e hiperpessoais (especificamente a uma área geográfica, ocorrência em particular, indivíduo ou data específica)", lê-se no documento, que destaca "o papel desempenhado pelo digital, nomeadamente as redes sociais, que se apresentam como extensão do grupo e do próprio bairro".
É nos concelhos de Loures e da Amadora que existe maior número de ocorrências e destaca os locais de crimes junto a centros comerciais e estações intermodais.
Também a delinquência juvenil, que compreende crimes praticados por jovens entre os 12 e os 16 anos, registou um aumento de 8,7%, num total de 1.833, número mais alto desde 2017.
O relatório indica ainda que há um grande número de ocorrências violentas e graves na margem sul do Tejo, principalmente a zona do Barreiro, onde existem ofensas à integridade física, sequestro e rapto de indivíduos associados ao tráfico de droga.
Crimes de ódio a crescer (mas de forma atenuada)
Os crimes de ódio aumentaram em Portugal em 2019 e 2020, coincidindo com a pandemia, e nos anos seguintes o aumento manteve-se, mas de forma mais atenuada.
O RASI considera que até outubro do ano passado o nível da ameaça terrorista pendente sobre Portugal continuou a ser moderado. No entanto, com o ataque levado a cabo pelo grupo palestiniano Hamas em outubro e a resposta de Israel, regista-se uma "maior complexidade da ameaça terrorista de matriz islamita na Europa".
A ameaça dos fenómenos de radicalização, extremismos (violentos) e terrorismo "mantém-se a um nível semelhante ao dos anos anteriores na maioria dos Estados membros da União Europeia", adianta.
Inquéritos a criminalidade económico-financeira aumentaram
Os inquéritos a criminalidade económico-financeira, corrupção e criminalidade conexa aumentaram 28,8% em 2023, sendo o maior número de investigações abertas relativas ao crime de branqueamento de capitais.
Nas tipologias de crime destaca-se a "prevaricação de titular de cargo político", onde se verificou um acréscimo de 138%, seguido da "corrupção ativa no setor privado" (60%), "participação económica em negócio" (58%), "peculato de uso" (58%), "branqueamento" (47%) e "abuso de poder" (46%)
Com LUSA