Num despacho de cinco páginas, com a data desta terça-feira, o presidente do Parlamento indica que pediu à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias que "emita parecer sobre a conformidade constitucional e regimental" da resolução do Chega e justifica esta decisão "pelas dúvidas suscitadas pelos serviços da Assembleia mas também em razão das dúvidas muito fundas e muito complexas" suscitadas "no plano ético-político, não por este projeto de resolução em concreto, mas pelo precedente que ele pode criar".
Augusto Santos Silva aponta que a nota elaborada pelos serviços do parlamento refere "não ser adequada a forma do projeto em relação ao seu teor, porquanto a forma de resolução se encontra sujeita, nos termos constitucionais, a um princípio da competência (da Assembleia da República), o que não parece ocorrer nesta situação".
No parecer são também identificas "as várias possibilidades que o Regimento da Assembleia da República prevê para sindicar as decisões do presidente".
No despacho, divulgado aos jornalistas pelo Chega, a segunda figura do Estado defende que "a regra número um do funcionamento da Assembleia é a total liberdade de expressão" e que "nos termos regimentais, só a degradação gerada pela injúria ou a ofensa pode justificar a intervenção do presidente junto de quem esteja no uso da palavra".
Contudo, salienta que nenhuma decisão do presidente do parlamento "com efeitos na organização e dinâmica dos trabalhos parlamentares não é sindicável e irrecorrível; pelo contrário, de todas cabe recurso para o plenário, soberano na decisão".
"É tendo em atenção este quadro regimental que se deve ponderar seriamente a legitimidade e as consequências de aceitar doravante que se discuta e vote projetos de resolução visando institucionalizar uma qualquer 'censura' a um qualquer 'comportamento'", alerta, questionado se "devemos mesmo trilhar esse caminho".
"É mesmo este o parlamento que queremos -- que, para além das críticas, dos protestos e contraprotestos, dos pedidos de esclarecimento e das respostas, das defesas da honra e das satisfações, isto é, da normal dialética parlamentar democrática, passamos a admitir exercícios de apreciação e condenação cuja terminologia evoca práticas históricas ou coevas próprias de ditaduras, contras as quais as democracias liberais sempre se levantaram?", salienta, questionando também se a Assembleia da República deve abrir a porta à instituição de "uma forma suplementar de 'condenação', de duvidosa conformidade constitucional e regimental.
Da ordem de trabalhos da reunião da primeira comissão, na quarta-feira, consta já a designação de relator para a elaboração do parecer sobre a "adequação constitucional e regimental" do projeto de resolução do Chega.
No domingo, o Chega anunciou a entrega no Parlamento de um projeto de resolução em que se pretende condenar o comportamento do presidente da Assembleia da República, por ausência de imparcialidade e de isenção no exercício do seu cargo.
Dias depois, na quinta-feira, último plenário antes da pausa nos trabalhos para férias, os deputados do grupo parlamentar do Chega abandonaram o Hemiciclo em protesto contra a condução dos trabalhos por Augusto Santos Silva, depois de este ter comentado uma intervenção do líder do partido sobre estrangeiros em Portugal.
E, no dia seguinte, o Chega pediu uma audição urgente ao Presidente da República que, recorde-se, vai concretizar-se na próxima sexta-feira (dia 29).