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Legislativas na Moldávia sob pressão russa e olhar atento da UE

As eleições legislativas na Moldávia têm implicações significativas para a segurança e a estabilidade da Europa.

Vadim Ghirda

SIC Notícias

Lusa

As eleições legislativas este domingo na Moldávia podem parecer um acontecimento menor para o resto da Europa, mas as suas implicações para a segurança e a estabilidade do continente podem ser profundas.

O país, candidato a aderir à União Europeia (UE), está sob vigilância de todos os grandes líderes europeus e protagoniza um recorde de observadores internacionais das suas legislativas.

A pequena ex-república soviética é um dos principais alvos das tentativas de reconquista de influência da Rússia, com Moscovo a ser acusado de gastar vários milhões para ganhar o voto dos eleitores e conseguir colocar no poder um partido pró-russo.

Mas porque é que estas eleições são tão importantes para o resto da Europa?

Apoio vital à Ucrânia

A Moldávia desempenha um papel fundamental de apoio à Ucrânia. Embora esteja entre os países mais pobres da Europa, a Moldávia recebeu mais de 1,5 milhões de refugiados ucranianos, sobretudo no início da guerra lançada pela Rússia em 2022, e acolhe agora mais de 100 mil.

Zelenky recebe Maia Sandu na Cimeira Ucrânia-Sudeste Europeu em Odessa, Ucrânia, quarta-feira, 11 de junho de 2025

Além disso, o país ajuda a transportar cereais de e para a Ucrânia através dos seus portos no Danúbio, oferecendo uma rota alternativa e aliviando a pressão sobre as rotas ucranianas do Mar Negro, frequentemente bloqueadas pela Rússia.

Se a Moldávia se virar para Moscovo, a estrutura de apoio da Ucrânia ficará muito enfraquecida, minando a resiliência do leste da UE. Isto aumentaria o risco de ataques militares nas fronteiras europeias, com a Roménia, a Polónia e os países bálticos a ficarem particularmente ameaçados.

O que têm feito os países europeus?

O Presidente francês, Emmanuel Macron, juntamente com o chanceler alemão, Friedrich Merz, e o primeiro-ministro polaco, Donald Tusk, foram, no final de agosto, à Moldávia para reforçar a unidade e o compromisso para com o país.

O Presidente russo, Vladimir Putin, já tinha sugerido que planeava ocupar toda a Ucrânia, aproximando as suas forças cada vez mais do resto da Europa. Um Governo moldavo pró-Rússia pode oferecer uma base oriental para os ataques - ou até mesmo abrir uma nova frente. A Rússia já tem cerca de 1.500 soldados estacionados na Transnístria, uma região separatista pró-russa da Moldávia na fronteira com a Ucrânia, que exigiu a independência em 2006, após uma votação que não foi reconhecida pelo Governo nem pela comunidade internacional.

Isto aumenta os riscos para a maioria dos Estados vizinhos, muitos dos quais pertencem à NATO. Os membros da NATO (a aliança militar que une europeus e EUA) têm deveres de defesa mútuos, ao abrigo do artigo 5.º, o que significa que devem ajudar um membro no caso de este ser atacado.

Qual é a situação atual da Moldávia?

O Partido da Ação e Solidariedade (PAS), da Presidente pró-UE, Maia Sandu, ocupa atualmente 63 lugares dos 101 assentos do parlamento.

Presidente da Moldávia, Maia Sandu
Leon Neal

Desde que o partido assumiu o poder, em 2021, aproximou-se da UE, pedindo a adesão em 2021, após a invasão em larga escala da Ucrânia, tendo a Moldávia recebido o estatuto de candidata em junho de 2022. Em junho de 2024, as negociações de adesão foram formalmente abertas e, em julho de 2025, realizou-se a primeira cimeira UE-Moldova.

A população ainda apoia a adesão à UE, mas o PAS tem perdido apoiantes, segundo as sondagens. Esta queda, de 52,8% nas eleições legislativas de julho de 2021, para 25,8% em agosto de 2025, resulta sobretudo da insatisfação interna com o partido, mas também da situação económica do país e da perceção de alta corrupção.

Que cenário é esperado para o pós-eleições?

O resultado eleitoral mais provável é que o PAS seja forçado a formar uma coligação com um ou mais partidos da oposição, grupos que defendem o afastamento da Moldávia da Europa e a sua reaproximação à Rússia.

O PAS tem dominado o espaço político pró-UE, mas o recém-criado Bloco Alternativo pró-europeu deverá obter votos suficientes para ultrapassar o limite mínimo de 5% dos votos para entrar no parlamento.

Embora o PAS ainda possa obter a maioria dos votos, o Bloco Patriótico dos Comunistas, um grupo pró-Rússia liderado pelo ex-Presidente Igor Dodon, é atualmente considerado a segunda maior força política. Este grupo reúne vários partidos, incluindo o Partido dos Socialistas, o Partido dos Comunistas, o Coração da Moldávia e o Futuro da Moldávia.

Igor Dodon enfrenta acusações de corrupção durante o seu mandato presidencial e desvio de recursos estatais em larga escala. Dodon nega todas as acusações e apresentou uma queixa ao Tribunal Europeu dos Direitos Humanos.

Ex-Presidente Igor Dodon lidera o Bloco Patriótico dos Comunistas, um grupo pró-Rússia
Vadim Ghirda

O que faz a Rússia?

A Moldávia tornou-se um campo de testes para ataques cibernéticos russos e campanhas de desinformação em grande escala. A interferência política russa tornou-se muito evidente durante as eleições presidenciais e referendo à entrada na UE, em 2024, com as tentativas de manipulação e influência estrangeira a serem amplamente documentadas. Espera-se uma interferência semelhante, ou maior, da Rússia nestas eleições.

Segundo o Observatório Europeu dos Meios de Comunicação Digitais, há uma campanha de desinformação em curso na Moldávia, através de narrativas falsas partilhadas online através de inteligência artificial.

O observatório identificou mais de 100 contas na rede social TikToK que publicaram 6.000 conteúdos nos últimos dois meses, sendo que 33% desses conteúdos (cerca de 2.000) continham desinformação ou conteúdo provocador.

Nas últimas semanas, a polícia realizou dezenas de rusgas por suspeita de financiamento político ilícito e, na segunda-feira, as forças de segurança detiveram 74 pessoas, acusando-as de tentarem desestabilizar o país.

O papel da diáspora

O país, cuja população não chega a 2,5 milhões de pessoas, tem mais de um milhão de cidadãos a trabalhar no estrangeiro.

A maioria destes emigrantes está situada em países da União Europeia, nomeadamente na Itália e Alemanha, mas também em Portugal e Espanha, sendo tendencialmente favoráveis à ideia e ao partido que defende a integração na Europa.

Esta diáspora foi a responsável pela reeleição, no ano passado, da Presidente Maia Sandu, uma europeísta que, em 2020, derrotou o chefe de Estado pró-russo Igor Dondon.

Todos os anos, entre 35.000 e 40.000 pessoas abandonam o país, um êxodo que poderá reduzir a população para 1,9 milhões até 2040, de acordo com as projeções do Centro de Investigação Demográfica.

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