A recente investida militar de Israel no sul da Síria levanta questões sobre os seus objetivos e o impacto na estabilidade da região. Para Daniel Pinéu há uma distinção clara entre os objetivos declarados e os reais de Israel.
"O objetivo declarado é estabelecer uma zona de tampão para proteger a já existente zona dos Montes Golã, criada em 1974, e impedir uma potencial entrada de islamistas nessa área”. Contudo, o comentador sublinha que não há provas concretas de intenções ou movimentos islamistas na região: "Nenhum gesto nem nenhuma intenção nesse sentido".
Daniel Pinéu considera que o verdadeiro objetivo é de natureza estratégica: “interessou ao regime Israelita, sobretudo na sua guerra contra o Hezbollah e na sua guerra contra o Irão, ter um regime de Assad razoavelmente fraco, fraco o suficiente para não ameaçar Israel militarmente, (...) mas agora esse status quo foi mudado".
“Estamos perante uma guerra preventiva, com ataques a paióis de armas e à defesa antiaérea, que nunca tinham sido usados contra Israel nas últimas quatro décadas”.
Um cenário complexo para a transição política
A transição para um futuro governo na Síria enfrenta dois grandes perigos, de acordo com Daniel Pinéu.
“O primeiro é a falta de acordo internacional que permita a formação de um governo inclusivo, com participação democrática da sociedade civil. O segundo é a fragmentação entre os grupos rebeldes”.
Entre os principais grupos, destaca-se o Tahrir al-Sham,"que teve uma experiência governativa mista, de alguma tolerância religiosa e étnica na sua região de Idlib, mas também bastante autoritário, tecnocrático e com pouca participação democrática da sociedade civil".
No entanto, a expansão desse modelo poderá levar a tensões internas. “Muitos grupos que fazem parte dessa coligação rebelde têm prioridades distintas, sejam elas territoriais, económicas ou outras alianças”.
Estado Islâmico e Al-Qaeda
Sobre o receio dos Estados Unidos de uma possível entrada do Estado Islâmico no governo sírio, Pinéu afirmou que “se o líderal-Jolani, o líder do Tahrir al-Sham, estiver a ser sincero nas suas intenções de ter um sistema democrático governativo que represente e que salvaguarde os direitos de todas as minorias na Síria, religiosas e étnicas, e ao mesmo tempo, de deixar para trás o seu passado de Aliança com a Al-Qaeda e com o Estado Islâmico (...) é possível que, por uma questão de interesse pessoal e político do seu grupo, vá lidar de forma bastante dura com o Estado Islâmico e colabore com os Estados Unidos em relação a isso".
“Enquanto houver grupos armados no território e não houver monopólio estatal da violência, potências como Israel, Turquia e Estados Unidos continuarão a operar na região, dificultando qualquer transição política”.