Cerca de 21 milhões de crianças não receberam as vacinas previstas em 2023, mais 2,7 milhões do que antes da pandemia de Covid-19, um retrocesso nos objetivos globais de imunização que estão longe das metas para 2030.
O alerta consta de um relatório da Organização Mundial de Saúde (OMS) e do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) divulgado esta segunda-feira com dados sobre a cobertura mundial da vacinação e que indica que ainda não foram alcançados os níveis globais de 2019, o ano antes do início da pandemia de Covid-19.
"Dos dados de 2023 que os países e regiões submeteram, o que sabemos é que a cobertura de imunização global ainda não recuperou totalmente da histórica queda que vimos durante a pandemia e, de facto, em 2023 o incremento da cobertura estagnou, comparando com 2022", salientou Katherine O'Brien, diretora do departamento de imunização da OMS, em conferência de imprensa.
Segundo os dados das duas agências, o número de `doses-zero´ - crianças que não receberam uma única dose de vacina durante o programa de imunização de rotina -- aumentou de 13,9 milhões em 2022 para 14,5 milhões em 2023, muito acima das 12,8 milhões em 2019.
Além destas, outros 6,5 milhões de crianças não receberam a segunda e terceira doses da vacina contra a difteria, tétano e tosse convulsa (DTP).
Conflitos afetam vacinação
No conjunto, entre as "dose-zero" e a sub-imunização, são 21 milhões de crianças em 2023 que estão nessa situação, mais 2,7 milhões do que antes da pandemia, quando eram 18,3 milhões, alertaram a OMS e a Unicef.
Mais de metade dessas crianças - 55% - vivem em países com condições vulneráveis ou em conflito, apesar de representarem apenas 28% do global de nascimentos, como Nigéria, Etiópia, Paquistão, Iémen e Afeganistão, entre outros, salientou Ephrem Lemango, chefe da área da imunização da Unicef.
Katherine O'Brien realçou que as crianças que vivem nestes ambientes debatem-se também com falta de segurança, de nutrição adequada e de cuidados de saúde, elevando a probabilidade de virem a morrer de uma doença prevenível pela vacinação, se forem infetados.
A especialista da OMS alertou ainda que as crianças que ficam subimunizadas estão, na prática, a perder vacinas contra várias doenças como o sarampo, a meningite e febre amarela.
Angola entre os países com menos cobertura vacinal
Angola é o único país lusófono no grupo de países que vacinou menos crianças (411 mil) contra a difteria, tétano e tosse convulsa.
O país lusófono integra ainda a lista de 10 países que apresentam as taxas de cobertura mais baixas, registando apenas 69%.
No que diz respeito ao sarampo, Angola volta a destacar-se pela negativa, ao ser um dos 10 países que, no conjunto, em 2023 representaram 55% das crianças sem vacina contra o sarampo e um dos que regista a taxa mais baixa de cobertura daquela doença (50%).
180 milhões de crianças vacinadas
Por outro lado, o relatório agora divulgado indica que, em 2023, 84% das crianças a nível global -- 180 milhões -- receberam as três doses da vacina contra a difteria, tétano e tosse convulsa (DFT), que é considerada um indicador do programa de imunização.
Essa percentagem não melhorou em comparação com 2022 e ainda está aquém do objetivo de 90% previsto na Agenda da Imunização 2030.
Na conferência de imprensa, Katherine O'Brien salientou que os dados agora conhecidos também apresentam aspetos positivos, como a diminuição das "dose-zero" em África.
Além disso, a administração da terceira dose da vacina DTP aumentou nas Américas e em África e nos países de baixo rendimento, onde os sistemas de saúde sofreram mais com a pandemia, verificou-se uma evolução ligeira dos níveis de imunização.
A especialista destacou ainda o aumento da cobertura global em 2023 da vacina HPV, contra o vírus papiloma humano, ano em que 27% das raparigas receberam a primeira dose, mais 7% do que 2022, através da sua introdução em países populosos como Bangladesh, Indonésia e Nigéria, apoiada pela aliança GAVI.