O secretário-geral da ONU, António Guterres, explicou esta sexta-feira que invocou o artigo 99.º da Carta das Nações Unidas, só usado três vezes na história da organização, devido ao "ponto de rutura" em Gaza, denunciando o elevado risco de "colapso total do sistema de apoio humanitário".
Numa reunião do Conselho de Segurança convocada na sequência do apelo inédito feito por António Guterres, o líder das Nações Unidas exortou o órgão da ONU cujas decisões são vinculativas a não poupar esforços para pressionar "por um cessar-fogo humanitário imediato, pela proteção dos civis e pela entrega urgente de ajuda vital".
"Existe claramente, na minha opinião, um sério risco de agravamento das ameaças existentes à manutenção da paz e da segurança internacionais", reforçou, denunciando ainda que "não existe uma proteção eficaz dos civis".
"Receio que as consequências possam ser devastadoras para a segurança de toda a região", frisou Guterres.
Situação em Gaza é “insustentável”
O líder da ONU sublinhou que, embora o lançamento indiscriminado de foguetes pelo Hamas contra Israel e a utilização de civis como escudos humanos constituam uma violação das leis da guerra, tal conduta "não absolve Israel das suas próprias violações".
"A brutalidade perpetrada pelo Hamas nunca poderá justificar a punição coletiva do povo palestiniano", defendeu.
O responsável diz ainda que a situação em Gaza é insustentável e que já não há condições para prestar ajuda humanitária de forma eficaz porque nenhum lugar é seguro.
"As condições para a prestação eficaz da ajuda humanitária já não existem", disse.
Pela primeira vez desde que assumiu a liderança das Nações Unidas, em 2017, António Guterres invocou na quarta-feira o artigo 99.º da Carta das Nações Unidas, o instrumento diplomático mais poderoso à disposição de um secretário-geral da ONU.
Criticado pelo Governo de Israel
O ex-primeiro-ministro português, que tem sido duramente criticado pelo Governo israelita por ter invocado o artigo 99, fez uma longa descrição do cenário crítico que os civis palestinianos e os trabalhadores humanitários enfrentam no terreno, e previu que resulte num colapso total da ordem pública e num aumento da pressão para deslocações em massa para o Egito.
O risco de colapso do sistema humanitário, explicou, está fundamentalmente ligado à total falta de segurança e proteção do pessoal da ONU em Gaza, e à natureza e intensidade das operações militares, que limitam gravemente o acesso às pessoas em necessidade.
"A ameaça à segurança do pessoal das Nações Unidas em Gaza não tem precedentes. Mais de 130 dos meus colegas já foram mortos, muitos deles com as suas famílias. Esta é a maior perda de vidas na história da nossa Organização. Alguns dos nossos funcionários levam os filhos para o trabalho para que saibam que viverão ou morrerão juntos", contou.
"Tudo o que acabei de descrever representa uma situação sem precedentes que levou à minha decisão sem precedentes de invocar o Artigo 99, instando os membros do Conselho de Segurança a pressionar para evitar uma catástrofe humanitária e apelando à declaração de um cessar-fogo humanitário", reforçou.
A comunidade internacional deve fazer todo o possível para acabar com esta provação, instou ainda.