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O que está em jogo nas históricas eleições na Turquia?

As eleições Presidenciais e legislativas vão decidir não só quem lidera o país, mas também como será governado, qual a direção que a economia tomará e como será moldada a sua política externa. Pela primeira vez em 20 anos, a permanência de Erdogan no poder está ameaçada.

Emrah Gurel

Catarina Solano de Almeida

No domingo 14 de maio, o Presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, enfrenta o mais difícil desafio político: manter-se no cargo que ocupa há 20 anos com mão de ferro face a uma oposição que se tornou mais forte, sobretudo quando o seu mais importante rival Kemal Kiliçdaroglu se juntou numa coligação com mais cinco forças partidárias.

As eleições Presidenciais e legislativas vão decidir não só quem lidera o país, mas também como será governado, qual a direção que a economia tomará e como será moldada a sua política externa.

Enquanto o líder com maior longevidade no poder desde o fim do Império Otomano (1922) defende uma religiosidade devota e baixas taxas de juro a nível interno, garante a influência turca na região e afasta-se da NATO e do Ocidente, o calmo e pacífico opositor lança a promessa de uma viragem democrática e do regresso a uma relação "pacífica" com o país e com o resto do mundo.

A Turquia de Erdogan

O mais poderoso líder desde que Mustafa Kemal Atatürk fundou a moderna república turca há um século, Erdogan e seu Partido AKP, de base islâmica, afastaram a Turquia do projeto secular de Ataturk.

Erdogan também centralizou o poder em torno de uma presidência executiva que define a política económica, de segurança, doméstica e internacional da Turquia.

Os críticos de Erdogan dizem que o seu Governo amordaçou a dissidência, limitou direitos e colocou o sistema judicial sob o seu controlo, acusações negadas pelos seus próximos que dizem que protegeu os cidadãos de ameaças à segurança interna, incluindo uma tentativa de golpe de Estado em 2016.

Economistas dizem que os apelos de Erdogan para baixas taxas de juros fizeram a inflação disparar para 85%, a maior alta em 24 anos, em 2022, e a lira caiu para um décimo de seu valor em relação ao dólar na última década.

O ranking anual dos Repórteres Sem Fronteiras (RSF) da liberdade de imprensa, publicado no início de maio, coloca a Turquia em 165º lugar (entre 180 países), uma queda de 16 posições num ano.

A Turquia e o resto do mundo

Com Erdogan, a Turquia aumentou o poder militar no Médio Oriente e além, lançando quatro incursões na Síria, travando uma ofensiva contra militantes curdos dentro do Iraque e enviando apoio militar à Líbia e ao Azerbaijão.

A Turquia teve também uma série de confrontos diplomáticos com as potências regionais Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes Unidos e Israel, bem como um impasse com a Grécia e Chipre sobre as fronteiras marítimas do Mediterrâneo oriental. Há cerca de dois anos, Erdogan mudou de rumo e procurou uma reaproximação com alguns dos seus rivais.

A compra de defesas aéreas russas desencadeou sanções da indústria de armas dos EUA contra Ancara, enquanto a sua proximidade com o Presidente russo, Vladimir Putin, levou os críticos a questionar o compromisso da Turquia com a aliança de defesa ocidental da NATO.

As objeções de Ancara aos pedidos de adesão à NATO da Suécia e da Finlândia também aumentaram as tensões com o ocidente. Entretanto a Finlândia já é membro da Aliança Atlântica mas quanto à Suécia, a Turquia insiste para Estocolmo “pôr fim ao apoio” a “organizações terroristas”.

No entanto, a Turquia foi um importante intermediário nas negociações com a Rússia para chegar a um acordo sobre as exportações de cereais da Ucrânia, e Erdogan não deixa passar em claro os seus esforços para acabar com a guerra na Ucrânia.

O que promete a oposição?


Os dois principais partidos da oposição, o laico CHP e o nacionalista de centro-direita IYI, aliaram-se a quatro partidos mais pequenos numa coligação que promete reverter muitas das políticas com a assinatura de Erdogan.

Comprometem-se a restaurar a independência do banco central e reverter as políticas económicas pouco ortodoxas de Erdogan. Afirmam que vão eliminar a presidência executiva e restaurar o anterior sistema parlamentar e que vão repatriar refugiados sírios.

A nível externo, querem melhorar as relações com os aliados ocidentais, incluindo os Estados Unidos, e devolver a Turquia ao programa de caças F-35, do qual foi bloqueada após a compra das defesas antimísseis russas.

Analistas acreditam que as políticas prometidas pela oposição podem estimular o investimento estrangeiro.

Erdogan apoiou os esforços falhados para derrubar o Presidente sírio, Bashar al-Assad. Deu asilo a pelo menos 3,6 milhões de refugiados sírios que se tornaram cada vez menos bem-vindos numa altura de crise económica da Turquia.

A oposição ecoou os planos de Erdogan de devolver alguns refugiados à Síria, mas nenhum dos dois lados definiu como tal poderá acontecer em segurança.

Eleições renhidas


As sondagens colocam Kiliçdaroglu à frente de Erdogan, cuja popularidade foi manchada pelo aumento do custo de vida causada pela inflação galopante.

Após o sismo de 6 de fevereiro, as sondagens referiam que Erdogan conseguiu ainda assim manter grande parte do apoio, apesar das acusações de que o Governo demorou a responder e foi negligente nos regulamentos de construção.

A frente unida da oposição aumentou as suas hipóteses, segundo os analistas, que avançam com a hipótese de um empate à primeira volta.

Mas Erdogan ainda está de pé, e a corrida presidencial pode acabar numa segunda volta entre Erdogan e Kiliçdaroglu.

Falta saber como a oposição vai angariar o apoio entre os eleitores curdos, que representam 15% do eleitorado. O pró-curdo Partido Democrático do Povo (HDP) não faz parte da aliança da oposição, mas opõe-se ferozmente a Erdogan que tem feito forte repressão aos seus membros nos últimos anos.

Com agências

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