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Jacuzzis, bares de strip e estúdio de música: a insólita realidade das prisões nas Filipinas

Rusgas a prisões revelaram várias regalias. Descobriu-se que um recluso tinha um estúdio de música.

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SIC Notícias

Quando a maior prisão das Filipinas foi inspecionada pela última vez, houve descobertas impressionantes. Milhares de artigos de contrafação foram identificados na prisão New Bilibid, incluindo armas, álcool, drogas e jogos de apostas. Foram, também, encontrados cavalos, aves de caça e cobras dentro do estabelecimento prisional.

A inspeção foi realizada depois de um jornalista ter sido assassinado a pedido do "chefe da prisão", Gerald Bantang. O recluso negou qualquer envolvimento e o caso ainda não foi levado a tribunal, mas, devido à gravidade das acusações, a forma como as prisões são geridas no país começou a ser questionada.

Nas Filipinas, as prisões são conhecidas pela corrupção, de acordo com o The Guardian. Em fevereiro, quatro japoneses foram presos por alegadamente serem responsáveis por vários esquemas e roubos no Japão a partir do interior de um centro de detenção de imigração filipina.

Recluso lançou um álbum que vendeu 15.000 cópias

Rusgas a prisões revelaram várias regalias, por exemplo foram encontradas moradias e jacuzzis de luxo, televisões, bares de strip, brinquedos sexuais e drogas à disposição de alguns reclusos. Descobriu-se que um recluso tinha um estúdio de música dentro da sua "vila" na prisão de New Bilibid, onde gravou algumas canções e até chegou a lançar um álbum que vendeu 15.000 cópias.

A New Bilibid é uma das maiores prisões do mundo, tem cerca de 29.000 reclusos, apesar de só ter capacidade para 6.000, referiu Raymund Narag, professor de criminologia da Universidade do Sul de Illinois, nos EUA.

"É aí que todos os problemas das prisões filipinas nascem. Uma cela boa para, digamos, 10 pessoas, haverá 100 reclusos e apenas um guarda prisional".

Reclusos assumem vários papéis

Para evitar desordens, os guardas prisionais e os reclusos desenvolvem as suas próprias estruturas para gerir a vida quotidiana. Existe uma hierarquia de reclusos em toda a prisão, com os reclusos a assumirem vários papéis. As funções básicas - mesmo a segurança das chaves - são delegadas aos reclusos.

"São eles que contam os reclusos, são eles que mantêm a limpeza da cela", diz Narag, que passou mais de seis anos na prisão antes de um tribunal descobrir que tinha sido acusado injustamente. Desde então, tornou-se um perito em criminologia e estabelecimentos prisionais.

De acordo com o professor, os reclusos também podem receber recursos do exterior, como medicamentos, comida ou roupa e dinheiro (cerca de 38 euros, por visitante) o que significa que existem esquemas de negócio em todo o estabelecimento prisional.

Para a maioria dos prisioneiros as condições são miseráveis. Em 2019, um médico do hospital da New Bilibid disse que cerca de 5.200 reclusos morrem anualmente devido à superlotação, doença e violência.

“É aqui que há maus-tratos, acontece tortura, por vezes até [contra] crianças pela polícia”

As condições nas celas, onde as pessoas ficam depois de serem detidas, são preocupantes, segundo o investigador da Human Rights Watch, Carlos Conde "é aqui que há maus-tratos, acontece tortura, por vezes até [contra] crianças, pela polícia. Existem poucas instalações que cumprem as normas internacionais", acrescentou.

O secretário de Justiça filipino, Jesus Crispin Remulla, reconheceu que o setor prisional do país enfrenta muitos desafios e prometeu mudanças, nomeadamente na redução das cauções para reclusos mais pobres, assim como o aumento do período de acusação por parte dos procuradores.

Desde julho de 2022, quando Bongbong Marcos se tornou Presidente das Filipinas, mais de 4.000 presos foram libertados, alguns por boa conduta, para aliviar a pressão sobre o sistema prisional.

O Governo filipino, segundo Raymund Narag, tem de procurar alternativas à prisão e deve construir prisões regionais mais pequenas, com reclusos organizados de acordo com o nível de infração e não com a filiação em bandos, como acontece agora - um acordo que incentiva os autores de delitos menores a misturarem-se com criminosos mais perigosos.

"A raiz estrutural do problema nunca [foi resolvida]"

O professor concluí que as mudanças devem abordar as dinâmicas e hierarquias dentro dos estabelecimentos prisionais. Anteriormente os esforços concentraram-se, apenas, em mudanças na liderança das prisões: "a raiz estrutural do problema nunca [foi resolvida]".

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