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Como o Irão beneficia da crise entre o Qatar e os vizinhos

Vista a partir de Teerão, a crise sem precedentes entre o Qatar e os seus vizinhos do Golfo Pérsico apresenta vantagens. Mas há o risco de vir a piorar mais uma situação já instável na região, alertam os analistas políticos.

Teerão
Morteza Nikoubazl / Reuters

Catarina Solano de Almeida

"Os sauditas não sabem conduzir a política estrangeira. Eles têm confrontos com a maioria dos seus vizinhos", constata Foad Izadi, professor de relações internacionais na Universidade de Teerão. Esta crise "dá ao Governo iraniano uma ocasião para demonstrar que é um importante ator na região", afirma à agência France Press.

Mais ainda, dá a Teerão a oportunidade de "estreitar as relações com o Qatar que, a partir de agora, necessita do Irão para [fazer] as ligações aéreas e para o fornecimento de bens alimentares", garante.

Depois da decisão tomada a 5 de junho por Riade e seis dos seus países aliados de cortar as relações diplomáticas, encerrar as fronteiras terrestres, marítimas e aéreas com o Qatar, Teerão não demorou muito a oferecer acesso ao seu espaço aéreo e a propôr a importação de comida.

Para justificar este corte de relações, a Arábia Saudita acusa o pequeno emirado rico em petróleo e gás de apoiar o terrorismo, financiando grupos grupos terroristas, nomeadamente o Daesh, a Al-Qaeda e a Irmandade Muçulmana.

Mas há analistas políticos que acreditam que o verdadeiro alvo é o Irão.

"Os sauditas querem criar uma frente unida contra o Irão e, para isso, precisam de eliminar toda a oposição" dentro do Conselho de Cooperação do Golfo - que reúne Arábia Saudita, Bahrein, Qatar, Emirados Árabes Unidos, Kuwait e Omã - é a opinião de Farhad Rezaei, investigador do Centro de Estudos Iranianos em Ancara, Turquia.

Obsessão com o Irão

Nem todos os países do Golfo partilham a obsessão da Arábia Saudita com o Irão e o Qatar é punido por isso, diz o especialista.

"Alguns dentro da coligação do Golfo não partilham essa obsessão mas nenhum deles tem a capacidade que o Qatar tem de resistir à pressão saudita", explica Farhad Rezaei, referindo as reservas de gás do Qatar e as ligações militares com os EUA.

Esta crise entre o Qatar e os vizinhos acontece cerca de duas semanas depois da visita do Presidente dos EUA a Riade, onde lançou o apelo para que todos os países isolem o Irão.

O Qatar, mas também outros países muçulmanos sunitas como Omã, Kuwait ou Malásia, têm dúvidas quanto a este apelo bem como sobre a campanha incessante da Arábia Saudita contra o seu grande rival xiita iraniano.

"Não acredito que Teerão esteja contente" com estas divisões entre os seus rivais sunitas, sublinha Adnan Tabatabai, diretor do centro alemão Carpo para as relações com o Médio Oriente. "No fim de contas, isso traz mais instabilidade à região e isso não interessa a ninguém".

Parceria económica entre Irão e Qatar

Apesar das profundas divergências políticas (e diferenças religiosas), Irão e Qatar já mostraram que é possível construir uma parceria económica. Os dois países partilham um imenso campo de gás natural nas águas do Golfo, assegurando ambos a gestão e a segurança.

Os sauditas, encorajados por uma administração norte-americana ferozmente anti-iraniana, estão agora mais determinados em impedir que Teerão se torne numa maior potência regional.

No entanto, o Qatar não segue esta linha de pensamento. Doha vê Teerão "como parte da solução para as crises regionais e sabe que um conflito armado ameaçará os seus laços económicos", salienta Farhad Rezaei, investigador do Centro de Estudos Iranianos em Ancara, Turquia.

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