O segundo dia da Jornada Mundial da Juventude (JMJ) ficou marcado pela chegada do Papa Francisco a Portugal. Em Lisboa à hora prevista, o chefe de Estado do Vaticano foi recebido no aeroporto pelo Presidente da República, com quem se reuniu no Palácio de Belém.
Em Belém, após uma cerimónia de boas-vindas com centenas de pessoas nos jardins em frente e com direito a guarda de honra e uma salva de 21 tiros, o Papa fez uma visita de cortesia ao Presidente português, afirmando depois esperar que Lisboa seja uma inspiração para "enfrentar em conjunto as grandes questões" que se colocam à Europa e ao mundo.
Sem direito a discurso, no período da manhã, no interior do Palácio de Belém o Papa Francisco assinou o livro de honra, onde escreveu uma dedicatória.
"Peregrino de esperança em Portugal, rezo e faço votos para que este país de coração jovem continue a fazer-se ao largo rumo a horizontes de fraternidade; Lisboa, cidade do encontro , inspire modos de enfrentar em conjunto as grandes questões da Europa e do mundo", lê-se no livro.
Seguiu-se um momento privado, uma reunião com Marcelo Rebelo de Sousa.
Num encontro com a sociedade civil e o corpo diplomático, no Centro Cultural de Belém (CCB), Francisco aproveitou para falar da necessidade de uma Europa construtora de pontes e pacificadora no Leste da Europa, Mediterrâneo, África e Médio Oriente.
O Papa dirigiu-se aos principais figuras de Estado presentes: Marcelo, Santos Silva e António Costa
“Estou feliz de estar em Lisboa, a cidade do encontro que abraça várias culturas e que nestes dias se torna mais universal, de certa forma torna-se a capital do mundo, do futuro, porque os jovens são o futuro. Estou a pensar em bairros como a Mouraria, onde no mesmo bairro vivem pessoas de mais de 50 países e as raízes multiculturais que se abriram ao mundo e navegaram por novos mares e horizontes”.
"Foram navegando e não muito longe daqui e no Cabo da Roca está a frase de um grande poeta "aqui onde a terra se acaba e o mar começa". Durante séculos acreditava-se que era ali o fim do mundo, e de certa forma é verdade, é o fim do mundo porque este país confina com o oceano que limita os continentes. Lisboa traz-nos o abraço o perfume e eu gosto muito de me associar aos que gostam de cantar Portugal. O mar é muito mais do que um elemento paisagístico, é uma chamada na alma dos portugueses, que é o sonoro mais fundo. Perante o oceano, os portugueses refletem sobre os passos da alma e do que sucede no mundo, também eu, gostaria de partilhar algumas preocupações".
“Segundo a mitologia, o oceano é filho de Urano e leva-nos ao infinito, mas é filho da Terra ao mesmo tempo, que abraça e nos convida à ternura, o oceano liga terras, continentes, povos e países, Lisboa é a cidade do oceano e lembra-nos a oportunidade de estar em conjunto como zona de contacto e não de fronteiras”.
O Papa disse acreditar que “Lisboa pode sugerir um caminho de paz”.
Depois, falou sobre a União Europeia e o que é necessário para seguir o caminho da paz e persistir em conjunto aos problemas.
“Estou muito satisfeito que a JMJ que estão no antigo continente que sejam de facto um impulso de cultura universal, isto é um impulso que o faça tornar mais jovem, porque é da velha Europa que o mundo tem necessidade, tem necessidade de orientador de paz na áfrica, médio oriente”.
Francisco relembrou que se está no meio de uma "tempestade" e que o espírito de diálogo da Europa tem de imperar para chegar à paz, tendo de se pôr um fim à guerra da Ucrânia.
O Papa partilhou outra preocupação: o investimento no armamento. Para Francisco, precisa de se investir mais no futuro dos filhos e menos nas armas, sendo que não são uma prioridade.
Da mesma forma, Francisco agradeceu o grande empenho de Portugal para organizar evento "tão difícil de gerir". Garante que vale a pena, pois "ao pé dos jovens, ninguém envelhece".
“A JMJ são uma ocasião para construir em conjunto e para sublinhar o desejo de criar a novidade e navegarmos juntos para o futuro. Navegar é necessário, o que é preciso é criar, ocupemo-nos para pensar em três oficinas da esperança das quais precisamos todos de trabalhar para um povo de futuro e fraternidade”.
O Papa desviou o discurso, também, para as alterações climáticas: o aquecimento do oceano. Para além disso, falou das dificuldades de tantos jovens como a falta de oportunidades para formar família, para ter uma habitação.
"A Humanidade é chamada a investir na família", reforça. A força dos jovens, para o Papa, conduz o que o mundo precisa. Francisco avisa que é preciso ir às aldeias no interior para ir ao encontro de pessoas mais idosas que estão sós e estar presente nas Igrejas locais, "que tanta falta fazem".
Recolhido na Nunciatura Apostólica, onde à chegada do Centro Cultural de Belém se aproximou dos populares e foi saudando os peregrinos que ali se encontravam, Francisco recebeu ali depois, em audiência, o presidente da Assembleia da República e o primeiro-ministro, Santos Silva e António Costa, respetivamente.
Papa Francisco: "Devemos sempre acolher e escutar as vítimas"
O último ponto do primeiro dia do Papa em Portugal foi a celebração das Vésperas, que presidiu no Mosteiro dos Jerónimos, e que juntou bispos, sacerdotes, diáconos, consagrados e consagradas, seminaristas a agentes pastorais.
Foi aí, que o Papa Francisco evocou os escândalos e o sofrimento das vítimas dos abusos sexuais na Igreja Católica naquela que foi a primeira homilia no âmbito da Jornada.
"Às vezes, o nosso mau testemunho e os escândalos desfiguram o rosto da Igreja e chama-nos a uma humilde e constante purificação, partindo do grito do sofrimento das vítimas que de devem acolher e escutar", disse Francisco.
A homilia durou pouco mais de 30 minutos e focou-se no apelo à inquietação, no despertar da esperança e em reflexões internas.
"Não devemos escapar deste tempo por termos medo e para nos refugiarmos em formas e estilos do passado", afirmou, exortando os membros da Igreja a lançarem as redes como os discípulos.
"Há sempre mil justificações para não lançar as redes, sobretudo, a resignação amarga. E é isso que corrói a alma", declarou.
"Não tenham medo, lancem as redes, não convertam a Igreja numa alfândega"
Foi com estas palavras que o Papa Francisco terminou a homilia da oração de vésperas, esta quarta-feira, no Mosteiro dos Jerónimos. Na homilia, citou o Livro do Desassossego de Fernando Pessoa e o padre António Vieira.
Francisco pediu para que a Igreja recupere a alegria, que viva a "boa inquietação", dando lugar a uma segunda chamada de Jesus.
"Para lançar novamente as redes ao mar, é preciso sair da margem das desilusões e afastar a tristeza que tantas vezes nos assalta", referiu. É preciso "recuperar a alegria, mas é uma alegria madura a que vem da experiência do fracasso. Não é fácil alegrarmo-nos com essa emoção adulta, mas é necessário o fazermos para passarmos do derrotismo à fé", continuou.
Papa Francisco reuniu-se com vítimas de abusos sexuais
O Chefe de Estado do Vaticano reuniu-se, ainda, com 13 vítimas de abusos sexuais da Igreja Católica, recebeu-as na Nunciatura Apostólica.
Em comunicado, a Santa Sé informou que “na tarde de hoje, após o final dos encontros institucionais e com a Igreja, o Papa Francisco recebeu na Nunciatura um grupo de 13 pessoas, vítimas de abusos por parte dos membros do clero, acompanhados por alguns representantes de instituições da Igreja portuguesa, responsáveis pela proteção dos menores”.
Segundo o mesmo documento, “o encontro decorreu num clima de intensa escuta e durou mais de uma hora, concluindo-se pouco depois das 20:15”.