Economia

Limite de 60% do PIB para a dívida pode sufocar o crescimento, diz o diretor do Mecanismo Europeu de Estabilidade

Klaus Regling, o responsável pelo Mecanismo Europeu de Estabilidade, defende esta segunda-feira em entrevista a um jornal alemão um limite mais elevado para a dívida e alguma flexibilização para o teto do défice em 3% do PIB

“Se a Comissão Europeia continuar a exigir que alguns governos tenham como meta [para a dívida pública] os 60% [do PIB], isso não é apenas politicamente difícil, mas também pode sufocar o crescimento”, afirma esta segunda-feira Klaus Reging, o diretor do Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE). O alemão gere o Fundo Europeu de Estabilização Financeira, ao qual Portugal ainda deve 25,33 mil milhões de euros do resgate feito em 2011. Em entrevista ao jornal alemão Suddeutsche Zeitung, Regling acrescenta: “Exigir algo doloroso que é economicamente desnecessário não terá sucesso. Se o novo alvo deve ser exatamente 90 ou 100 ou 105% [do PIB] não pode ser determinado cientificamente. Isso é uma decisão política”.

A entrada do ‘patrão’ do MEE no debate sobre a alteração das regras do défice e da dívida impostas pelo Pacto de Estabilidade e Crescimento, que estão suspensas desde 2020 até final deste ano, é um facto político importante. Nomeadamente para economias como Portugal, que, em virtude do choque da pandemia, passou de um excedente orçamental de 0,1% em 2019 para um défice de 4,3% do PIB em 2021 e cujo nível de dívida pública, depois de ter descido para 116,6% do PIB antes da pandemia, registava 127,5% no final de 2021.  No Programa de Estabilidade para 2021-2025, apresentado pelo anterior Governo em abril passado, previa-se que o défice ficasse já abaixo de 3% em 2023 (quando reentram em aplicação as regras), mas não se antevia que a dívida conseguisse cair para 100% do PIB até 2025.

Ainda no domingo, o ministro das Finanças do governo de coligação alemã, o liberal  Christian Lindner, sublinhava claramente em entrevista ao canal alemão NTV que “é tarefa dos governos garantir que a dívida pública seja sustentável no longo prazo. O retorno a regras orçamentais como o nosso travão à dívida na Lei Básica [alemã] é de grande importância para isso. Apesar dos grandes desafios, quero conseguir isso no próximo ano”.

Pacto de Estabilidade deve ser reformado

Regling, por seu lado, justifica a sua posição: “O Pacto de Estabilidade deve ser reformado. Aumentar o limite da dívida em euros faria sentido do ponto de vista económico. O ambiente económico mudou. As taxas de juros permanentemente mais baixas mudam muitas coisas. Por causa das baixas taxas de juros, os níveis de endividamento podem ser maiores do que se pensava na época das negociações de Maastricht, há 30 anos”.

Na entrevista, Regling admite, também, alguma flexibilização do limite máximo de 3% do PIB para o défice orçamental, ainda que afirme, por precaução, que deve ser mantido. “O limite máximo de 3% deve continuar a ser aplicado em princípio. Em casos individuais, no entanto, os governos devem ser autorizados a ultrapassá-lo se a Comissão Europeia chegar à conclusão de que há realmente uma lacuna de investimento, e que fechar essa lacuna impulsionaria o crescimento, sem colocar em risco a sustentabilidade da dívida”. No entanto, adverte que os próprios investimentos ‘verdes’ “também, aumentam o nível de endividamento e, por isso, temos de ter cuidado com isso”.

Klaus Regling defende ainda que, para a sustentabilidade da própria zona euro face a choques económicos, é preciso “um fundo de estabilidade permanente para evitar crises generalizadas”.  Em vez de entregues à volatilidade dos mercados financeiros, “os governos em recessão obteriam empréstimos baratos [desse fundo] com rapidez e facilidade”. E dá um exemplo: “Poderia ser estipulado que os estados podem acorrer a ele se sua taxa de desemprego subir significativamente acima da média de longo prazo ou se o crescimento cair em uma certa percentagem. Isso tornaria a área do euro ainda mais robusta”. A gestão desse fundo deveria caber ao MEE, que Regling dirige.

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